Isabelle Garo, Esquerda.net, Contratemps, 6 de Dezembro, 2020
“Acaso possuirá segredos para transformar a vida? Não, não faz mais que procurá-los, respondia a mim mesmo.” Arthur Rimbaud, Une saison en Enfer.
A proliferação de um conceito
A pandemia da Covid-19 que começou em 2019 constitui um acontecimento total porque incorpora, a uma escala mundial inédita, o entrelaçamento de todas as crises em curso e a ausência da qualquer saída previsível para o embalo catastrófico ao qual estamos a assistir. Suscitando a análise, o prognóstico, convidando a pensar as ruturas numa época que as tinha banido do seu horizonte, a situação tem, entre outros efeitos colaterais, provocado a proliferação impressionante da temática da biopolítica que se tinha desenvolvido no terreno da Filosofia crítica contemporâneo ao longo das últimas décadas.
As causas deste sucesso são múltiplas: devido ao seu teor tanto académico quanto sugestivo, à sua extensão indefinida e às suas conotações futuristas, ao seu perfume crítico e, claro, a uma ascendência foucauldiana tornada critério de verdadeira radicalidade, o termo parece o mais adequado senão para analisar as causas da situação, pelo menos para enunciar a amplitude dos seus desafios.
De facto, o termo “biopolítica” visa alcançar por si só numerosas tendências ascendentes que têm a ver com a vida, em ligação direta ou não com a questão epidemiológica: a multiplicação das zoonoses, os efeitos de grande escala do agro-negócio, as transformações da medicina e a associada renovação da bioética e do direito, o progresso da genética e da genómica, o papel da indústria farmacêutica, o patentear do vivo e a sua mercantilização, a ascensão das biotecnologias, o crescimento das temáticas pós-humanistas, a viragem ideológica das neurociências, a potência das correntes reacionárias pró-vida e do sobrevivencialismo, etc., tudo isto sob o fundo da urgência ecológica e de uma crise económica maior. Contudo, longe de ser um conceito estabelecido no quadro de uma análise precisa, o termo amálgama da “biopolítica” sugere sem definir todas as combinatórias visíveis da política e da vida, noções elas próprias profundamente polissémicas: a vida ou as ciências da vida como política, a política como vida, a vida como objeto da política, etc.
O paradoxo atinge o seu auge se juntarmos a isto que as noções de biopolítica e de biopoder, elaboradas por Foucault em meados dos anos 1970[1] permaneceram em construção: remodelando sem cessar estas categorias antes das abandonar, ele conferir-lhes-á o estatuto de pistas e de esboços de uma teoria da sociedade e do Estado que procurava ser, antes de mais, uma alternativa à crítica da economia política marxista e às suas consequências políticas. Dispensando as questões de organização da produção e do conflito de classes, abandonando as perspetivas de igualdade e da revolução, Foucault abordava a realidade política a partir um ângulo que combinava procedimentos de subjetivação e dispositivos de governamentalidade que trabalhavam tanto os corpos como as populações.
Se o termo “biopolítica” sobreviveu a este projeto, ao ponto de parecer erradamente resumi-lo e prolongá-lo, a sua retoma contemporânea implicou uma revisão radical. Alguns filósofos reajustaram a temática biopolítica, propondo abordagens rivais e incompatíveis, enriquecendo assim o vocabulário da biopolítica com alguns neologismo suplementares: “imunopolítica”, “tanatopolítica”, “bioeconomia”, “biocapitalismo”, etc. As noções de “biopoder” e “biopolítica” restauradas e fortalecidas para se tornarem conceitos, até mesmo doutrinas, tornaram-se assim o eixo de abordagens filosóficas que tendem a fazer da vida e da sua gestão o alfa e o ómega da política da sua história: é nomeadamente o caso de Giorgio Agamben e de Roberto Esposito.
Deixando de valer como meio de confronto com o marxismo e como hipótese de investigação, a biopolítica contemporânea enuncia-se no registo afirmativo do desvelamento. Em busca de fundamento metafísico e não de perspetiva política, reimplanta-se no terreno filosófico clássico que o pensamento crítico dos anos 1970 tinha abandonado.
Apesar da explosão da galáxia pós-foucauldiana a partir do seu coração biopolítico, o ponto comum destas diversas conceções consiste em afirmar que a rutura histórica já aconteceu, que se trata de a descrever e sem dúvida de a temer, mas que não existe nenhuma perspetiva de saída da armadilha de um capitalismo mais do que nunca apto a colonizar integralmente o corpo e os seres vivos.
Ao mesmo tempo, longe das considerações filosóficas cada vez mais distanciadas das ciências sociais e da história real, é também no terreno da análise económica e sociológica que continua a desenvolver-se um estudo do intrincamento crescente entre o capitalismo e as ciências da vida e que utiliza os termos “biocapitalismo” e “bioeconomia” ou ainda desenvolve a questão do trabalho vivo como o lugar central da residência à lógica capitalista.
Estas abordagens, não se preocupando com a questão dos fundamentos, esforçam-se por ser ao mesmo tempo descritivas e prospetivas, propondo uma análise por vezes crítica do neoliberalismo.
Nestas condições, mais do que propor uma enésima versão da tese biopolítica ou de nos dedicarmos a desqualificá-la, é mais oportuno considerá-la como uma das componentes do momento presente. Como compreender que esta temática, datada de mais de cinquenta anos, surja mais do que nunca como uma abordagem inovadora, validada pela pandemia ao ponto de elevar o presente à categoria de “momento foucauldiano”[2], consistindo o acontecimento antes de mais numa estranha coincidência por fim estabelecida entre “as palavras e as coisas”, entre o conceito dos anos 1970 e a sequência histórica atual?
Com vista a responder a esta questão, a primeira parte deste artigo é consagrada ao exame de certas versões principais da noção de biopolítica na esteira das análises propostas por Michel Foucault, recolocando esta história no contexto do assalto das políticas neoliberais e do enfraquecimento do movimento operário, das quais quais foram eco e por vezes fermento. A segunda parte propõe-se ligar esta crítica a uma abordagem marxista da reprodução social, visando redefinir uma noção de vida em ligação com uma política centrada na reconstrução coletiva de uma alternativa sólida ao atual capitalismo da catástrofe [3]. Mais do que uma biopolítica descritiva ou anunciadora do pior, trata-se de pensar uma vitalidade social concreta, atravessada de possíveis, engrenando-se com a vida no sentido amplo em que o capitalismo empreendeu uma mercantilização integral.
O biopoder segundo Michel Foucault, uma hipótese estratégica
Se o conceito de biopoder surge pela primeira vez na pluma de Foucault no primeiro tomo da História da Sexualidade, A Vontade de Saber, ele encontra-se desenvolvido nos cursos pronunciados no Collège de France, primeiro em 1975-1976 (É preciso defender a sociedade), em seguida em 1977-1978 (Segurança, território, população) e em 1978-1979 (O Nascimento da biopolítica). Mas esta reflexão enraíza-se nos trabalhos anteriores, nomeadamente nas Palavras e as Coisas, publicado em 1966, que relaciona a ascensão da economia política com a das ciências da vida.
Este projeto de investigação, continuamente remodelado, construía-se em ligação com a grande mutação da paisagem política, ideológica e cultural francesa que se inicia em meados dos anos 1970 e que Foucault soube captar com uma acuidade sem par. As oficinas que são os cursos no Collège de France, bancos de ensaios para as hipóteses conceptuais mais audazes, dão a ver os ajustamentos sucessivos da reflexão foucauldiana e a manutenção do seu curso geral.
Numa carta de 1972, citada por Daniel Defert, Foucault anuncia que vai fazer a análise “da guerra mais desprezada: nem Hobbes, nem Clausewitz, nem luta de classes, a guerra civil” [4]. O primeiro modelo, o da guerra, tomado de empréstimo de Nietzsche, será desenvolvido no curso de 1976 antes de ser abandonado. Mas esta hipótese é ocasião para testar a definição de uma conflitualidade alternativa à luta de classes. Sobretudo, pretende englobar, fazendo da afirmação do conflito social um simples prolongamento do modelo recalcado e persistente que a fundaria, o da luta das raças. A tese é provocadora e tanto mais paradoxal quanto, ao mesmo tempo, a questão colonial se encontra quase silenciada.
Elaborado progressivamente no decurso dos anos seguintes, o conceito de “biopoder” dá por sua vez corpo provisoriamente a esta agenda de investigação. Apresenta-se como nova hipótese, reorganizando uma constelação de noções adjacentes, elas próprias remodeladas sem cessar, com vista a distinguir e cruzar diversas modalidades de poder. “Normas”, “governamentalidade”, “segurança”, “controlo”, “disciplinas”[5], etc. quadrilham este espaço teórico proliferando a partir do seu eixo central: repensar a política a uma distância dupla da soberania e do conflito social.
Alerta e móvel, reativa ao seu contexto e dedicada a construir uma compreensão global e inédita da história adequada à emergência de uma segunda esquerda, a reflexão foucauldiana permanece estruturada em redor de uma confrontação permanente com o marxismo. Quando o maio de 68 se afasta e a perspetiva comunista aprofunda a sua crise de longa duração, mas também no contexto do reforço do Programa Comum de União da esquerda, e face à hipótese repressiva partilhada pelo freudismo e pelo esquerdismo, Foucault orienta-se para uma história feita a partir de baixo profundamente ambivalente. Esta história, bem mais filosófica do que historiadora, presta atenção às normas e à forma como os indivíduos são ao mesmo tempo os seus retransmissores, os seus produtos e os pontos focais de uma resistência contínua que suscita e modifica as próprias formas de um poder doravante radicalmente deslocalizado e dessubstancializado.
Sublinhando a produtividade e a capilaridade do poder que estaria além da mera dimensão repressiva e vertical, a conceção foucauldiana do biopoder une-se a uma conceção do Estado e dos Aparelhos Ideológicos do Estado proposta no mesmo momento por Louis Althusser. O poder assim redefinido é indissociável de um saber que o inerva e suporta, nos antípodas da oposição tradicional entre oposição e verdade, entre ideologia e ciência. Mas a biopolítica, longe de ser a última palavra da análise foucauldiana é a ponta de lança de um projeto mais ambicioso: produzir uma outra crítica da economia política associada a uma nova conceção da subjetivação, passando pelo exame minucioso dos dispositivos punitivos, carcerais, médicos que se elaboram no curso da história.
No seu curso de 1976, Foucault desenvolve a hipótese do biopoder associando-a a uma teoria da governamentalidade que esvazia as relações sociais de produção, prestando uma atenção superior ao que seria o concreto por excelência: o corpo. Transitando segundo ele da prerrogativa de “fazer morrer e deixar viver” para a preocupação de “fazer viver e deixar morrer”, o poder metamorfoseia-se. Afirmando a tendência à ligação cada vez mais direta com os corpos de um poder tornado difuso, a teoria foucauldiana transforma desta forma o seu próprio desvio do Estado em facto histórico objetivo, que ratifica esta virulenta rejeição filosófica das mediações e das representações que partilha com a jovem Filosofia francesa não marxista deste período.
Esta tese de um biopoder que se estabelece na vida individual e social dissolve toda a conflitualidade social numa miríade de confrontos pontuais, movimento browniano perpétuo e sem resolução, “o poder nunca está inteiramente de um lado”, “ a cada instante, joga-se em pequenas partes singulares com as suas inversões locais, derrotas e vitórias regionais, vinganças provisórias”[6].
Se Foucault credita por vezes Marx por uma análise inédita das disciplinas [7], é para virá-lo melhor contra o resto das suas conceções, esforçando-se por cobrir todas as pistas e empreender um confronto tão minucioso que toma, por vezes, a aparência de uma reivindicação de filiação.
Última etapa, maior, desta trajetória, o estudo das teorias neoliberais no decurso do ano 1977-1978, conduz Foucault à afirmação de que o liberalismo dispõe por si só de uma autêntica “arte de governar” que, segundo ele, falta à tradição socialista. Mas o que é uma “arte de governar” se esta escapa a uma lógica da soberania doravante obsoleta? Nada mais, declara Foucault no ano seguinte que “a maneira refletida de governar da melhor forma”[8], cuja versão liberal está sempre por essência preocupada com a sua auto-limitação [9]. Com base numa análise dos saberes que rejeita o conceito marxista de ideologia, tomando literalmente os textos que aborda como discursos válidos pelo simples facto de serem dotados de eficácia, Foucault conclui que o liberalismo, ao longo da sua história e até nas suas variantes ordoliberal e libertária, “apresenta-se como uma crítica da irracionalidade própria ao excesso de governo” »[10]. É dizer pouco que tais definições eram e são agora mais do que nunca contestáveis.
Não deixa também de ser verdade que a temática do biopoder desempenhou um papel fundamentalmente estratégico num projeto foucauldiano em reconstrução permanente. No momento em que se afasta do esquerdismo para se aproximar dos rocardianos e da CFDT, ele abre a via de uma nova conceção de governamentalidade, que entra em ressonância com os esforços da segunda esquerda para inventar, face à perspetiva de uma união da esquerda vitoriosa, uma nova via social-democrata, abandonando qualquer perspetiva de rutura com o capitalismo sem aderir porém à direita tradicional.
Antes de ser a exploração da via neoliberal a ocasião de descobrir um esboço já avançado desta governamentalidade alternativa, é a hipótese do biopoder que o ajuda a redefinir o terreno, o método e os desafios do seu próprio projeto teórico e político. Desta forma, a noção de biopoder não tem como finalidade periodizar a história política em momentos distintos: Foucault sempre insistiu no facto de que os diferentes dispositivos de poder não se sucedem mas interpenetram-se e combinam-se. Por outro lado, a nova conceção da política que aqui se elabora é inseparável de uma nova conceção do saber e dos regimes de verdade, ou seja de um papel redefinido dos intelectuais, que foi uma das suas apostas maiores no contexto singular francês desta época.
Toda a dificuldade reside em compreender como é que o conceito foucauldiano de biopolítica, tão estratégico e potentemente determinado pela trajetória teórico-política do seu autor no contexto preciso em que queria intervir, pode ser reajustado, a grande distância do parênteses fordista-keynesiano e no contexto da vitória sem partilha das políticas neoliberais. Esta dominação, confrontada com a crise multiforme do capitalismo, é acompanhada de uma viragem autoritária e repressiva que parece contudo fazer em larga medida expirar de prazo esta análise da governamentalidade liberal.
Face a este enigma de uma reatualização a contratempo da noção de biopolítica, não bastará invocar a potência ideológica sem rival das instituições neoliberais e dos seu mil canais de transmissão, capaz de impor a linguagem de uma “boa governança”[11]. Porque é mais a combinação desta dominação com o vasto repúdio das políticas impostas, sob um fundo de declínio da perspetiva anticapitalista e de subida do medo de um colapso generalizado, que explica a proliferação presente de noções da biopolítica ou do biopoder diversamente remodeladas em constatações desencantadas de uma dominação integral.
No contexto de uma despolitização inquieta e de um conflito social de alta intensidade, a epidemia da Covid-19 reforça o sentimento de uma centralidade da vida biológica que apenas é igualdade pela sua precariedade crescente. Paradoxalmente, em nome da afirmação de uma ramificação direta da política na vida, o crescimento da temática do corpo revela-se um formidável instrumento de abstração, acompanhando a viragem metafísica da crítica. É preciso começar por examinar este paradoxo através das versões contemporâneas mais conhecidas e reconhecidas da biopolítica, as de Agamben e de Esposito.
Giorgio Agamben, a viragem ontológica da biopolítica
A epidemia da Covid-19 terá sido a ocasião, para Giorgio Agamben, de ver, no espaço de poucos dias, transportada às nuvens e depois condenada ao suplício a sua filosofia, inteiramente centrada na questão da vida, depois de ter arriscado publicar, no jornal italiano Il Manifesto a 26 de fevereiro de 2020, uma tribuna a denunciar as “medidas de urgência frenéticas, irracionais, e totalmente injustificadas para uma suposta epidemia”[12].
No seguimento do escândalo provocado, Agamba precisa o seu ponto de vista numa entrevista publicada a 24 de março no Le Monde: “O que a epidemia mostra claramente é que o estado de exceção, com o qual os governos nos familiarizaram há muito tempo, tornou-se a condição normal. Os homens habituaram-se de tal forma a viver num estado de crise permanente que parecem não se aperceber que a sua vida foi reduzida a uma condição meramente biológica e perdeu não apenas a sua dimensão política mas também toda a dimensão humana.”[13].
Esta afirmação inequívoca oferece, não um resumo do pensamento de Agamben, mas condensa as suas conclusões ético-políticas, abstraindo-se da aparelhagem metafísica que as sustém. A sua obra desenvolve longamente o que já se espera: colocadas sob o signo de uma só questão: “o que é agir politicamente?”[14], os diversos tomo do Homo Sacer detalham os princípios e os desafios de uma conceção do “estado de exceção que tende cada vez mais a apresentar-se como o paradigma de governo dominante na política contemporânea”[15].
Esta conceção, que se inscreve expressamente na filiação crítica da biopolítica foucauldiana, apresenta com elas pontos em comum e divergências que, para serem compreendidas, devem ser ligadas à profunda transformação do contexto social e político a partir de meados dos anos 1970. Para dizê-lo resumidamente: enquanto que Michel Foucault podia ainda tentar apresentar o projeto neoliberal como o de uma governamentalidade auto-limitativa, preocupada com o bem-estar das populações e como oportunidade de subjetivação aberta ao cuidado de si, a hegemonia mundial das políticas neoliberais e o seu cortejo de regressões obrigou desde então a rever esta definição.
A opção escolhida por Agamben neste contexto político, económico e social profundamente modificado é reabilitar a noão de soberania estatal e propor uma teorização que faz do estado de exceção a estrutura fundamental da política ocidental, na sua relação pensada como essencial com a vida: “Se a exceção é o dispositivo original graças ao qual o direito se refere à vida e a engloba em si na sua própria suspensão, uma teoria do estado de exceção é então a condição preliminar para definir a relação que liga e, ao mesmo tempo, abandona o vivo ao direito”[16].
O preço a pagar por esta simplificação da teorização biopolítica da relação entre vida e poder é a sua re-ancoragem num metafísica com pretensão universal, a grande distância do projeto foucauldiano e do seu reivindicado nominalismo.
Agamben constrói esta metafísica em torno de uma antiga distinção grega entre uma vida natural (zoè), própria a todos os seres vivos e uma “vida politicamente qualificada” (bios), um modo de vida particular, apenas próprio aos homens. Este modo de vida caracteriza-se pela “exclusão” e a “captura”, instaurando um estado de exceção em vias de tornar-se regra e que engedra a “vida nua” como aquilo que permite a articulação entre zoè e bios. Não precedendo a vida política mas resultando dela, a vida nua constitui contudo a estrutura originária da política que se revela na exceção como exclusão inclusiva. O “homo sacer” figura tutular que paira sobre toda a obra de Agamben, reenvia ao indivíduo que, no direito romano arcaico, pode ser sujeito à morte sem que se trate de um homicídio. Longe de ser uma aberração jurídica estritamente local e provisória, este estatuto revela segundo ele a própria estrutura da soberania, “a estrutura originária na qual o direito se refere à vida e a inclui através da sua própria suspensão”.[17] Consequentemente, o modelo da guerra, abandonado por Foucault, volta a ganhar pertinência apesar do seu esquematismo. Agamben não teme mobilizá-lo e dramatizar ao extremo por ocasião da crise da Covid-19: “É possível, até, que a epidemia que viemos seja a realização da guerra civil mundial que, segundo os politólogos mais atentos, tomou o lugar das guerras mundiais tradicionais. Todas as nações e todos os povos estão agora duradouramente em guerra contra si próprios porque o inimigo invisível e elusivo contra o qual eles estão em luta se encontra em nós”.[18].
Saudando “a tese de Foucault segundo o qual o “que está em causa agora é a vida”[19], Agamben afasta-se logo dela para considerar que: “a potência absoluta e perpétua, que define o poder de Estado, não se funda, em última instância, numa vontade política, mas na vida nua, que é conservada e protegida apenas na medida em que se submete ao direito de vida e de morte do soberano (ou da lei)”[20].
Esta afirmação perentória, muito longamente argumentada, não recorre a nenhum dado factual mas mobiliza, ao lado de autores antigos e medievais, referências repetidas a Martin Heidegger, Carl Schmitt, Walter Benjamin mas também a Hannah Arendt, apesar da sua incompatibilidade mútua.
Abandonando a análise foucauldiana das normas e da sua função ambivalente de sujeição ao mesmo tempo do que de subjetivação, rejeitando sem a discutir a conceção marxiana de Estado, Agamben conduz a reflexão política para o terreno de uma cisão, filosoficamente construída, entre uma soberania pensada como trans-histórica e uma vida nua, julgada também imutável. Alguns exemplos mencionados de passagem, juntamente com uma crítica espantosa de Marx, são encarregues de sustentar a tese: “À cisão marxiana entre homem e cidadão sucede assim a da cisão entre a vida nua, portadora última e opaca da soberania, e as múltiplas formas de vida abstratamente recodificadas em entidades jurídico-sociais (o eleitor, o trabalhador dependente, o jornalista, o estudante, mas também o seropositivo, o travesti, a pornstar, a pessoa idosa, o progenitor, a mulher).”[21].
Dissociada de qualquer exploração histórica das disciplinas, das tecnologias de poder e das formas de governamentalidade, que constituía o método foucauldiano, a narrativa línear que a substitui contenta-se em afirmar que “a máquina jurídico-política do Ocidente” tem por finalidade a produção da vida nua. O que é próprio desta vida nua é estar separada de toda a forma de vida e ligação a uma “antropogénes”, ou seja a um “devir humano do homem”[22]. Esta história, que fez progressiva e sistematicamente do estado de exceção a regra, revela doravante a sua essência escondida.
Por seu turno, Foucault concebia a perspetiva biopolítica como o laboratório da construção de uma alternativa ao marxismo, rivalizando com o seu projeto teórico de forma a desqualificar a sua perspetiva política, a abolição do capitalismo. Produzido noutro extremo desta sequência, uma vez derrotada a alternativa e desaparecida a esperança de um capitalismo estabilizado, e depois do programa foucauldiano ter mostrado a sua incapacidade de escapar da força de atração do neoliberalismo, a biopolítica perde toda a sua força. Resta-lhe jogar, em variações sem fim, no pathos de uma vida desarmada e ameaçada. A denúncia do Estado ocidental em geral e da sua tendência fundamental em chegar à lógica exterminadora do campo, nada menos, apenas oferece a perspetiva de um discurso que repete ad nauseam a profecia negra do seu próprio cumprimento[23].
Por detrás das suas refinamentos argumentativos, Agamben promove um anarquismo especulativo fundamentalmente binário, que opõe um poder tendencialmente exterminador e uma “potência destituinte” rebelde mas que invariavelmente a ele reconduz, exceto para finalmente conseguir “pensar (sic) um potência puramente destituinte, ou seja que não se resolve nunca num poder constituído” [24]. Retomando a lenga-lenga que diz que as revoluções caiem sempre por definição no estatismo e no autoritarismo, Agamben opõe-se a qualquer transformação do mundo económico e social. Restam a patrística e o aristotelismo medieval, que oferecem a erudição e a investigação de no novos costumes por mera consolação.
Algumas passagens levantam contudo dúvidas que se trate verdadeiramente de uma ética. Lembrando que os franciscanos nunca criticaram a propriedade, Agamben faz de São Paulo o percursor deste dessubjetivação e da “mística quotidiana” a que apela como única escapatória para a sujeição.
“Paulo “chama “usos” às condutas de vida que, ao mesmo tempo, não chocam frontalmente com o poder (…). Parece que a noção de uso, neste sentido, é muito interessante: é uma prática à qual não podemos atribuir um sujeito. Continuas a ser escravo, mas, uma vez que fazes uso, eventualmente, já não és escravo” [25].
“Eventualmente”, tudo se parece com efeito ao seu contrário, os atos indignos à mais alta moral e a santificação do presente à sua crítica radical.
O pensamento de Agamben transita então da ontologia à ontologia, ornamentando-se com alusões a um mundo real supostamente já inteiramente desvelado e reduzido à sua lógica jurídica imanente. Assim, a rejeição das contradições, outra herança das filosofias da sequência predcente, condu-lo a afirmar, sem a mínima matização e apenas de todos os dados factuais, um mundocial social cada vez mais homogéneo, sem classes, composto de indivíduos todos identicamente anestesiados, que chegaram ao estádio supremo do abrutecimento, com a exceção quase milagrosa do autor de tal diagnóstico: “se precisássemos uma vez mais de pensar o destino da humanidade em termos de classe, deveríamos dizer que não existem mais hoje em dia classes sociais, mas unicamente uma pequena-burguesia planetária, na qual as antigas classes se dissolveram”[26].
De caminho, Agamben não hesita em afirmar que esta massificação confirma as teses fascistas cumprindo-as. Se o mundo é fascista, o fantasma fascista de um mundo social sem conflito não é nada mais do que a sua teoria adequada. E se a sua “mediaficação” social já não é o prognóstico encantador dos sociólogos sociais-democratas convertidos ao liberalismo, como Alain Touraine, passar a ser apenas a prova deste vitória irresistível porque já aconteceu: “é exatamente o que o fascismo e o nazismo tinham igualmente compreendido, e ter compreendido claramente o irrevogável declínio dos velhos sujeitos sociais constitui de facto o seu inultrapassável toque de modernidade. (De um ponto de vista estritamente político, fascismo e nazismo não foram em nada ultrapassados e vivemos ainda sob o seu signo”[27].
Com Agamben, a biopolítica parece afundar-se literalmente na metáfora que a funda, designando apenas o conflito eterno entre duas entidades: o “poder”, sejam quais forem as suas formas e as suas épocas, é apenas um enxerto artificial cujas causas permanecem incompreensível. Esta conceção interdita encara uma qualquer perspetiva de democratização radical da organização social da produção, excluindo do seu campo de análise a questão da exploração e das dominações, assim como a das lutas que as combatem. Desta forma, depois de ter travestido o Estado contemporâneo em máquina de vocação exterminadora, a Agamben resta-lhe concluir que:
“a novidade da política por vir é que ele não será mais uma luta pela conquista ou o controlo do Estado mas uma luta entre o Estado e o não-Estado (a humanidade), disjunção irremediável das singulares quaisquer e da organização estatal”[28].
Do mesmo impulso, a ultrapassagem do capitalismo e a conquista do Estado são afastados, supostamente votados a uma recaída totalitária, em benefício de uma imediatez que reata sem o dizer com os ideais do romantismo reacionário e os seus cirurgiões vitalistas, de Edmund Burke a Friedrich Nietzsche e de Henri Bergson a Gustave Le Bon, para citar apenas estes nomes. A biopolítica assim compreendida reativa a velha conceção organicista da política: “a política ocidental é neste sentido “representativa” porque ela já reformulou sempre o contacto sob a forma de uma relação. Convirá então pensar a política como uma intimidade não mediatizada por nenhuma articulação ou representação: os homens, as formas-de-vida estão em contacto, mas isto é irrepresentável, uma vez que consiste precisamente na desativação e na inatividade de toda a representação. A ontologia da não-relação e do uso deve corresponder a uma política não-representativa”[29].
No éter rarificado do conceito puro mas também no contexto da crise avançada das democracias parlamentares, tais frases soam mais precisas, numa primeira abordagens, uma vez que refletem e propagam uma despolitização de tão longa duração que engendrou o esquecimento e a negação desta história, a de uma derrota política e social da esquerda.
Conclusão literária da derrocada da esquerda italiana transformada em destino, estas análises tropeçam no entanto no que as deveriam confortar: a crise da Covid-19 não sublinha tanto o excesso de Estado em geral quanto a falta de serviços públicos reforçados e coletivamente geridos e mais amplamente criando formas democráticas de organização e de planificação do conjunto das atividades humanas.
A imunopolítica de Roberto Esposito
Filósofo italiano da mesma geração, Roberto Esposito propõe uma variante desta biopolítica reajustada às condições presentes, elaborando por seu turno a noção de “imunopolítica”, em ressonância forte com a atual pandemia. Produzindo uma segunda leitura dissidente da biopolítica foucauldiana, Esposito propõe compreender o cuidado imunitário como causalidade histórica profunda: “esta exigência de isenção e de proteção – ligada originalmente ao domínio médico e jurídico, estendeu-se progressivamente a todos os setores e a todos os tipos de discursos da nossa vida, até se tornar ponto de fixação, real e simbólico, da experiência contemporânea”[30].
Procurando escapar às aporias tal como ao impasse político ao qual conduziram os trabalhos de Agamben, Esposito conserva as preocupações ontológicas, colocando-se ele também em busca de um princípio último e abstrato de compreensão: é à oposição entre imunidade e comunidade que ele confia este papel. Segundo ele, se toda a sociedade exprime “uma exigência de auto-proteção”, tese apresentada como prova não precisando de nenhuma demonstração, esta exigência tornar-se-ia atualmente “o centro à volta do qual se constrói quer a prática efetiva, quer o imaginário, de toda uma civilização”[31].
Como em Agamben, o recurso apenas à etimologia permite exumar um fundamento escondido e duradouramennte atuante: em latim, immunistas e communitas derivam de munus, lei, cargo ou dom. Immunis designa então aquele que não tem obrigação faca a outrem. À luz desta argumentação que o autor qualifica de “etimológico-paradigmática”, a conclusão impõe-se tanto melhor quando precede e guia a análise: “a democracia moderna fala uma linguagem oposta à da comunidade na medida em que ele integrou cada vez mais uma vontade imunitária”[32].
O diagnóstico político de Esposito é sombrio, distinguindo-se do de Agamben: “um mundo sem exterior – completamente imunizado – necessariamente não tem interior”[33]. O modelo imunitário da política está preso a uma metáfora que medicaliza o social para melhor denunciar de volta esta lógica, supostamente real, a título de uma dedução circular. Mas a circularidade da análise quer-se precisamente à imagem de um mundo que se auto-devora, afundando-se num jogo de espelhos sem fim entre identidade e falsa alteridade.
Assim, agarrando o caso das doenças auto-imunes, Esposito descreve o que estima ser a auto-destruição do mundo contemporâneo, clivado em “civilizações” diversas que, na realidade, formam apenas uma: o atentado do 11 se setembro de 2001 nos Estados Unidos, tornado acontecimento paradigmático, “parece nascer de duas obsessões imunitárias opostas e simétricas – a de um integrismo islâmico decidido a proteger até à morte a sua pretensa pureza (…) e a de um Ocidente desejoso de excluir todo o resto do planeta da sua partilha sobrelotada das riquezas “[34].
Norte egoísta contra Sul invejoso, transformando a pobreza sofrida em pureza fantasmada: a análise atinge o seu apogeu quando apresenta esta oposição como um arco estável que o atentado do 11 de setembro teria quebrado.
Numa proliferação típica desta viragem metafísica da filosofia política contemporânea que propaga na realidade os piores clichés, Esposito não teme afirmar que “o que explodiu com as duas torres de Manhattan, é o duplo sistema imunitário que, até agora, sustentava o mundo”.[35]. Quanto à viragem securitária e autoritária do Estado neoliberal, longe de abrir caminho à análise das suas funções políticas e sociais, apenas é apreendido através de um modelo retórico, desta vez de ordem metonímica: a exclusão seria a verdade escondida da política, que a resume totalmente. Qualquer que ela seja, o autor repete, a modernidade caracteriza-se pelo facto de que a vida se tornou imediatamente política: a biopolítica é o nome da sua fusão em curso, a grande distância aí também ainda dos dispositivos de controlo estudados por Foucault.
Em Espositio como em Agamben, a reductio ad hitlerium, para retomar a fórmula de Leo Strauss, revela-se como o procedimento central desta biopolítica pósfoucauldiana. Creditando Nietzsche por uma lucidez política sem igual no que dizia respeito à dominação crescente que “a política” exerceria sobre “a vida”, Esposito considera que “o totalitarismo do século XX – e sobretudo o nazismo – marca o ponto culminante desta “tanato-política”[36]: “como nas doenças auto-imunes, o sistema imunitário tornar-se tão forte que atinge o próprio corpo que deveria salvar e provoca a sua decomposição”[37].
Usando demais a metáfora, Esposito parece não se aperceber que legitima de passagem uma reação imunitária mais adaptada: difícil escapar ao plano de inclinação reacionário do vitalismo quando ele nunca é analisado.
Concedendo ao nazismo ter constituído “a sua própria filosofia”, no seguimento de Emmanuel Levinas[38], Esposito censura-lhe ser apenas “uma filosofia integralmente traduzida em termos biológicos”. Autoriza-se então a analisar o nazismo sob o ângulo desta transposição teórica, biologizante, substituída aos processos históricos reais, os da emergência histórica dos fascismos e do seu ressurgimento contemporâneo. Em virtude de uma análise estritamente retórica da história, que não se confronta com nenhuma outra análise, a abolição das mediações surge como um facto, tão irremediável quanto a confusão crescente entre a norma e a exceção: “contrariamente às ilusões daqueles que acreditaram poder saltar para trás para reconstruir as mediações que organizam a fase precedente, a vida e a política estão doravante ligadas por um nó impossível de desatar”[39].
Estas mediações colapsadas que são o Estado e as instituições, mas também as formas organizadas da luta de classes, são ao mesmo tempo definidas como desvio e captura da vida. Como consequência, de facto, uma tal análise adere ao ódio fascista pelos partidos, sindicatos, parlamentos, sem temer fazer da ideologia que acompanhou a sua destruição violenta uma teoria válida.
Pagando o preço desta concessão exorbitante, a política por inteiro é apresentada como condenada a recair “cada vez mais no nível biológico nu”[40], o terrorismo culminando pura e simplesmente a thanato-política nazi.
“Não é apenas a morte que faz a sua entrada massiva na vida, mas a vida que se constitui como instrumento da morte”, enquanto que, uma vez mais ao espelho, “a prevenção relativamente ao terror de massa tende a apropriar-se e a reproduzir-lhe o funcionamento”[41].
A hipótese biopolítica, transformada desta forma em chave de compreensão universal, abre-se sobre um cenário catastrófico caricatural, sub-produto da filosofia da história invertida subjacente a esta variante política da colapsologia. Conduzindo ao desalento esmagador, ela já não rima com a esperança de uma terceira vaga, que Foucault trazia, mas com a constatação da sua derrota, alargada com a afirmação do desaparecimento não apenas de todo o projeto revolucionário mas também da menor possibilidade de transformação da vida social.
Se alguma esperança ainda se mantém à tona, no meio deste naufrágio da emancipação nas águas turva da vida e de uma política que nela já foi dissolvida, é apenas a perspetiva embaçada, nunca construída enquanto tal, de uma “democracia biopolítica – capaz de se exercer não sobre os corpos mas a favor do corpo”, o autor reconhece que o que pode “querer dizer hoje” esta fórmula é “muito difícil de indicar precisamente”[42]. Na filiação direta da tradição filosófica dos anos 1970 e da sua crítica do sujeito, Giorgio Agamben recomenda também a dessubjetivação, enquanto que Esposito se reivindica pela sua parte de uma “filosofia do impessoal”, a categora da pessoa sendo segundo ele o princípio de todas as discriminações.
Contudo, numa entrevista sobre a pandemia da Covid-19[43], Esposito inflete sensivelmente a sua análise e muda subitamente o seu vocabulário. Por um lado, enuncia que “a nossa sociedade capitalista é fundamentalmente uma sociedade desigual. Em situações de crise, esta desigualdade torna-se ainda mais pronunciada mas também menos suportável”. Por outro lado, tenta concretizar a sua noção de “biopolítica afirmativa”, preconizando investimentos no sistema de saúde pública, a construção de hospitais, a gratuitidade dos medicamentos, etc. Estas indicações, que procedem de uma crítica tradicional do capitalismo à qual a noção de biopolítica não acrescenta na realidade nada, não encontra nenhum eco na sua obra.
Por falta de uma tematização política destas propostas e de um estudo preciso e documentado da sequência neoliberal em curso, as sugestões de Esposito são uma menção rápida de receitas tradicionais, atualmente também em crise, constituindo esta crise a origem e o horizonte da sua reflexão: “As instituições são necessárias. Mas, no que diz respeito às instituições, a questão é que nós não devíamos apenas pensar o Estado e os aparelhos de Estado. Uma instituição é também uma organização não governamental ou um grupo de benevolência.”
Apesar da sua relutância, o facto é que uma contradição tão manifesta coloca questões sobre todo o edifício conceptual que estas escassas linhas bastam para abalar.
Isabelle Garo é filósofa especialista no pensamento de Marx. Co-dirige a revista Contretemps, faz parte da equipa de redação da revista Europa e é responsável pela coleção Lignes Rouges nas edições Amsterdam. Texto publicado na revista Contretemps. Traduzido por Carlos Carujo para o Esquerda.net.
Notas
[1] A invenção do termo “biopolítica” data do início do século XX e é devida a Rudolf Kjellén, especialista e ciências políticas e teórico organicista do Estado concebido como “forma de vida” específica. Ver Thomas Lemke, Biopolitics – An Advanced Introduction, New York & London, New York University Press, 2011, pp. 9-10.
[2] Annie Cot, Quand Michel Foucault décrivait ‘l’étatisation du biologique’(link is external), Le Monde, 20 abril 2020.
[3] Segundo a expressão de Naomi Klein: La stratégie du choc: montée d’un capitalisme du désastre, Arles, Actes Sud, 2008.
[4] Daniel Defert, Chronologie in: Michel Foucault, Dits et Ecrits, I, Paris, Gallimard Quarto, 2001, p. 57.
[5] O termo “disciplina” nomeia os mecanismos de poder que visam o corpo individual, enquanto que o de “biopoder” designa a sua extensão, datada do fim do século XVIII, à escala das “massas humanas”. Ver Michel Foucault, Il faut défendre la société - Cours au Collège de France 1976, Paris, EHESS-Gallimard-Seuil, 1997, p. 222.
[6] Ibid., p. 218.
[7] Ver nomeadamente Michel Foucault, Les mailles du pouvoir, (conferência dada na Universidade da Bahia, 1976), Dits et Ecrits, II, Paris, Gallimard Quarto, 2001, pp. 1001 e seguintes.
[8] Michel Foucault, Naissance de la biopolitique – Cours au Collège de France 1978-1979, Paris, Gallimard-Seuil, 2004, p. 4.
[9] Ibid., p. 23.
[10] Ibid., p. 327.
[11] É interessante notar que a temática caída em desuso da “governability” ressurge em 1975 no relatório da Comissão Trilateral, pouco antes de Foucault ter elaborado a noção de “governamentalidade.
[12] Em Il Manifesto(link is external). Tradução francesa publicada por Acta(link is external).
[13] No Le Monde(link is external).
[14] Giorgio Agamben, Homo sacer II-1, Etat d’exception, Paris, Seuil, 2003, p. 168.
[15] Ibid.
[16] Ibid.
[17] Ibid., p. 169.
[18] Giorgio Agamben, La médecine comme religion(link is external), Lundi Matin, n° 242, 12 de maio de 2020.
[19] Giorgio Agamben, Homo sacer IV-2, L’usage des corps, Paris, Seuil, 2015, p. 290
[20] Ibid., p. 289.
[21] Ibid., p. 290.
[22] Ibid., p. 289.
[23] A crítica da componente jurídica desta argumentação foi desenvolvida por Christos Boukalas, No exceptions: authoritarian statism. Agamben, Poulantzas and homeland security, Critical Studies on Terrorism, 7 ; 1, 2014, p. 112-130.
[24] Giorgio Agamben, Homo sacer IV-2, éd. cit., p. 365.
[25] Une biopolitique mineure(link is external), entrevista com Giorgio Agamben, Vacarme, n°10, 2 de janeiro 2000.
[26] Giorgio Agamben, La communauté qui vient – Théorie de la singularité quelconque, Seuil, Paris, 1990, p. 64.
[27] Ibid.
[28] Ibid., p. 88.
[29] Giogio Agamben, Homo sacer IV-2, éd. Cit., p. 327.
[30] Roberto Esposito, Communauté, immunité, biopolitique – Repenser les termes de la politique, Les Prairies ordinaires, Paris, 2010, p. 132.
[31] Ibid.
[32] Ibid., p. 99.
[33] Ibid., p. 111.
[34] Ibid., p. 138.
[35] Ibid., p. 139.
[36] Ibid., p. 159.
[37] Ibid., p. 160.
[38] Emmanuel Lévinas, Quelques réflexions sur la philosophie de l’hitlérisme, Paris, Rivages, 2018.
[39] Roberto Esposito, Communauté, immunité, biopolitique, éd. Cit., p. 163.
[40] Ibid., p. 164.
[41] Ibid., p. 166.
[42] Ibid., p. 227.
[43] The Biopolitics of Immunity in Times of Covid-19(link is external); entrevista com Roberto Esposito, Antipode Online, 16 de junho de 2020.