Bruna Alves, EcoDebate, 24 de setembro de 2020
O Setembro Amarelo, voltado para atenção à saúde mental e à valorização da vida, ganhou contornos especiais, aliados à situação atual da pandemia. Além de mexer com a rotina de todos, o novo coronavírus está afetando a saúde mental de muitas pessoas e, de acordo com estudos recentes, há aumento da angústia, ansiedade e depressão, incluindo os profissionais de Saúde que estão na linha de frente da COVID-19.
Segundo a coordenadora do curso de Psicologia do Centro Universitário São Camilo, Gláucia Guerra Benute, o cenário atual tende a suscitar ou agravar o sofrimento do indivíduo e, consequentemente, aumentar o risco de depressão, ansiedade, além daquele relacionado ao comportamento suicida. “É esperado que situações como essa promovam instabilidade psíquica que pode estar relacionada a diferentes fatores, como medo, isolamento, solidão, desesperança, acesso reduzido a suporte comunitário e religioso/espiritual, dificuldade de acesso ao tratamento em saúde mental, doenças e problemas de saúde, além de perda de familiares e/ou conhecidos”.
No Brasil, 51% dos casos de suicídio acontecem dentro de casa e se encontram na faixa etária entre os 20 e 49 anos. Estima-se que apenas um em cada três casos de tentativa de suicídio chegue aos serviços de Saúde. “O suicídio é um fenômeno complexo e multifatorial que atinge todas as classes sociais. Sua etiologia envolve elementos biológicos, genéticos, sociais, psicológicos, culturais e ambientais relacionados à vida pessoal e coletiva”, informa Gláucia.
Nesse período de mudanças rápidas e adaptações constantes exigidas em situações como a atual vivenciada, alguns agentes tiveram alta, sendo eles: estressores financeiros e outros precipitadores, como o aumento do uso de álcool e outras drogas, além das questões de violência, que podem tornar crianças, adolescentes e suas famílias vulneráveis a comportamentos que coloquem em risco a saúde mental e a vida. “Embora o cenário de pandemia potencialize o sofrimento, existem medidas protetivas passíveis de serem adotadas. Nesse sentido, é importante promover estratégias que permitam contrabalançar os sentimentos negativos e o reenquadramento dos planos de vida”, completa a professora.
Os transtornos mentais mais comumente associados ao comportamento suicida são: depressão, transtorno de humor bipolar, dependência de álcool e de outras drogas psicoativas, esquizofrenia e alguns transtornos de personalidade. “Com o aumento dos sentimentos de angústia e de ansiedade, a coexistência destas condições agravam a situação de risco da pessoa tentar tirar a própria vida. Nesse momento, é importante que as pessoas fiquem atentas a qualquer sinal de alerta e aumentem os laços socioafetivos para contribuir com a diminuição de algumas doenças e até mesmo o suicídio” completa a psicóloga.
Preste atenção em alguns fatores de alerta que merecem atenção:
• Irritação ou agitação excessiva da criança ou adolescente;
• Sentimento de tristeza, baixa autoestima e impotência;
• Tentativas prévias de suicídio;
• Relatos de violência psicológica (humilhação, agressões verbais), física, sexual ou negligência;
• Problemas de saúde mental da criança, do adolescente e/ou de seus familiares, especialmente a depressão e a ansiedade;
• Uso de álcool e/ou outras drogas;
• Histórico familiar de suicídio;
• Ambiente familiar hostil;
• Falta de suporte social e sentimentos de isolamento social;
• Sofrimento e inquietações sobre a própria sexualidade;
• Interesse por conteúdos de comportamento suicida ou autolesão em redes sociais virtuais;
• Isolamento afetivo e sentimento de solidão;
• Sentimento de desamparo e desesperança;
• Autodesvalorização;
• Crise existencial.
Dicas de autocuidado para o bem-estar mental
Setembro amarelo: psicóloga dá dicas sobre autocuidado durante a quarentena – Sono, alimentação e excesso de trabalho estão entre os pontos de atenção durante a busca pelo bem-estar mental
Durante o período de distanciamento social, por conta da pandemia da Covid-19, a saúde mental tornou-se um tema ainda mais discutido, e muitos profissionais da saúde alertam que o isolamento pode acarretar uma epidemia de transtornos de depressão e ansiedade. Um estudo feito pelo Instituto de Psicologia da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) apontou que os casos de depressão praticamente dobraram desde o início da quarentena. Entre março e abril desse ano, dados coletados online indicam que o percentual de pessoas com depressão saltou de 4,2% para 8%.
A campanha do Setembro Amarelo, que tem como objetivo conscientizar a população em relação ao equilíbrio mental, que este ano apresenta um papel ainda mais relevante ao trazer informações sobre o aumento do número de transtornos. Segundo dados da Organização Mundial de Saúde (OMS), o Brasil é o país mais deprimido e ansioso da América Latina. O último relatório da organização, divulgado no fim de 2018, mostra que, nos últimos dez anos, o número de pessoas com depressão aumentou 18,4% em todo o mundo – o que corresponde a 322 milhões de indivíduos ou 4,4% da população global.
Melina Cury Haddad, coordenadora de psicologia da Care Plus, comenta que a partir do lançamento da campanha, em 2003, as informações sobre saúde mental começaram a mudar. “Fomos aprendendo e entendendo que esse assunto precisa ser falado e discutido da forma correta; a informação aliada à ciência e a educação à saúde podem ser bases fortes para se prevenir a depressão. Sim, todos nós podemos contribuir para ajudar as pessoas que estão em profundo sofrimento. Talvez uma conversa com alguém, uma oferta de ajuda, encontrar uma informação com um direcionamento para um serviço de saúde ou mesmo um serviço voluntário podem fazer com que ela encontre outro caminho. Vamos falar do tema, vamos perder o medo de conversar”, afirma.
Durante a pandemia, quem está próximo pode ajudar muito ao ouvir o que a pessoa tem a dizer. “Muitas vezes temos medo de perguntar, até porque não vamos saber lidar com aquilo ou achamos que não temos capacidade de ajudar, mas todos temos essa capacidade, não precisa se preocupar em falar a coisa certa, apenas em ouvir, dar atenção, perguntar como está, oferecer o telefone de um profissional, um copo d’água. O mais importante é abrir um espaço para esse momento, não fazer nenhum julgamento sobre o que ela está passando, não dar broncas achando que vai ser bom para ela, apenas escutar com empatia”, explica a psicóloga.
Melina destaca os principais hábitos para se manter o bem-estar mental durante este momento, confira:
– O equilíbrio vem quando conseguimos dosar a quantidade de estresse que temos com momentos de lazer e que proporcionam prazer; então é necessário fazer um balanço, por exemplo, se estou trabalhando muito e até tarde por causa do home office, então tentar deixar um momento no dia para relaxar, talvez ouvir uma música que goste, tomar um banho relaxante;
– O sono é um fator primordial pra manter a saúde emocional. Busque ter horário pra dormir e acordar, fazer um ritual para o sono antes de dormir e se desligar com antecedência de telas de celular, TV, tablets, não beber nada estimulante, isso ajuda muito a equilibrar e preparar o cérebro pra dormir, pode também fazer um exercício de respiração profunda, relaxamentos ajudam muito na indução do sono.
– Ter como base uma alimentação balanceada, com alimentos nutritivos irá auxiliar você no bem-estar. Praticar exercícios físicos regularmente, mesmo em casa, pois são responsáveis pela liberação de neuro-hormônios que auxiliam na sensação de prazer e bem-estar.
– Conversar com pessoas, mesmo que seja a distância, faz nos sentirmos conectados, e isso é muito importante para enfrentar sentimentos de solidão e sentir que pertencemos a um lugar. Na depressão, temos a tendência de abandonar atividades que nos dão prazer; é muito importante não abandonar, mesmo sem vontade, não deixe de fazer tarefas simples do dia a dia, lembre-se de que o fazer antecede o prazer, então pra ter vontade de fazer as coisas, é necessário começar a fazer, a vontade pode surgir depois.