Já se passam três dias desde a terça 3 de novembro, dia oficial das eleições presidencias e proporcionais nos Estados Unidos. Pela situação atual da contagem dos votos nos estados-chave de Nevada, Georgia e Pensilvânia, tudo indica que o resultado no Colégio Eleitoral naquela que é a mais antiga e talvez a mais distorcida das democracias liberais no mundo, vai no sentido de uma derrota de Donald Trump.
Joe Biden, ex-vice de Obama e figurão da burocracia do mau e velho Partido Democrata estadonidense, é flor capitalista e imperialista venenosa, daquelas que não se cheira. Não se trata de comemorar sua eleição. Mas de comemorar a derrota do falastrão e mentiroso empresário do turismo e da construção Donal Trump e seu projeto bonapartista (em relação ao sistema político de seu país), autocrático (centrado na sua figura), nacional-imperialista, antiglobalista e reacionário nos costumes – cuja eleição, em 2016, deu fôlego aos personagens mais grotescos e monstruosos paridos em vários rincões do planeta: do genocida Duterte, das Filipinas, ao capacho Bolsonaro, no Brasil, passando por Orbán, na Hungria, Duda, na Polônia, e Modi, na Índia.
Perdeu, playboy Trump! Agora os negros, as mulheres, os e as trabalhadoras/es dos EUA poderão se dedicar a arrancar novas conquistas ou impedir retrocessos seus direitos, contra o governo Biden. Como formularam os setores mais sensatos da esquerda ianque, “derrotar Trump para bater em Biden” (Defeat Trump to hit Biden).
Nós, da esquerda e da oposição e no Brasil só temos o que comemorar. Essa derrota de Trump enfraquece e isola Bolsonaro, abala a chamada “ala ideológica” do governo brasileiro – sustentada nos filhos do presidente –, acaba com a festa retrógrada medieval de Ernesto Araújo no Itamaraty e Damares (que perdem seu principal parceiro nas gracinhas anti-direitos das mulheres e LGBTQIs nos organismos internacionais), interrompe a passagem da “boiada” de Ricardo Salles no Ministério do Meio Ambiente.
Trata-se de uma importante vitória parcial contra a ultradireita neoliberal internacional consolidada nos últimos quatro anos em torno de uma Casa Branca que esperneou contra a ascensão chinesa, por meio da negação da cooperação internacional, do combate contra os princípios da ONU e da OMC, da reafirmação no grito de uma decadente hegemonia norte-americana. Nada do anterior a Trump era exatamente antissistêmico, mas significava um capitalismo com algum verniz cosmopolita e civilizatório na relação entre os estados no sistema internacional.
Biden dará continuidade à batalha pela manutenção da preponderância global dos EUA, em questionamento irreversível, porque baseado na superioridade econômica e tecnológica crescente do dragão oriental (é a economia, estúpido!) A China neoliberal vai continuar nos calcanhares da capacidade industrial e tecnológica da velha América. Nós continuaremos vivendo num mundo de incertezas geopolíticas, enfrentamentos, instabilidade, pelo menos por mais dois anos sob a batuta e um clone tropical de Trump.
Mas, de repente, nós aqui, na América do Sul, graças ao povo negro e às mulheres dos Estados Unidos, podemos passar uma noite ou um fim de semana em festa. Obrigada, juventude negra das periferias de Filadéfia e de Atlanta! Obrigada, moradores das periferia de Las Vegas! Obrigada, mulherada estadunidense. Vocês não têm ideia de quanto o seu voto muda também as coisas por aqui. Temos uma dívida histórica com os lutadores do Black Lives Matter. Só a rebelião negra e juvenil dos últimos meses garantiu essa vitória.
Agora, aqui entre nós, trata-se de fortalecer as votações e chances da esquerda (e em particular do PSOL) nas eleições do dia 15. Vamos votar na esquerda consequente e encher as nossas câmaras de mulheres, mulheres negras, lgbts e ativistas. Para logo depois transformarmos nosso resultados em organização e luta contra Bolsonaro e o neoliberalismo! Tim-tim!