Cinthia Leone, EcoDebate, 23 de dezembro de 2020
É o que revelam novos dados publicados hoje na ferramenta de monitoramento da Mighty Earth, o Rastreador de Desmatamento de Soja e Gado . Todos os principais supermercados da Grã-Bretanha vendem frango e carne suína alimentados com soja brasileira.
Perguntados sobre suas conexões com a Cargill, os supermercados J. Sainsbury, ASDA, Morrisons e Aldi-UK recusaram-se a confirmar ou negar suas ligações diretas ou indiretas com a comerciante. Entretanto, a Tesco, num gesto de transparência, reconheceu que a Cargill está presente nas cadeias de suprimento de seus fornecedores diretos de frango e publicou um documento delineando a origem da soja utilizada para seus produtos.
Apesar das sucessivas promessas dos principais supermercados da Grã-Bretanha de alcançar o desmatamento zero em sua cadeia de abastecimento até 2020, os varejistas continuam altamente expostos ao desmatamento e ao desmatamento no Brasil, alimentado pela produção de soja.
A Cargill domina o mercado britânico de soja, importando mais de dois terços (70%) dos grãos de soja que entram no Reino Unido diretamente do Brasil. Três quartos (78%) das exportações diretas de soja brasileira para o Reino Unido vêm de regiões ameaçadas do Cerrado, a maior savana tropical do mundo, e da Amazônia, a maior floresta tropical do mundo.
Quase toda (90%) a soja consumida no Reino Unido é utilizada para alimentar animais de criação, como frangos e porcos, que são depois vendidos nos supermercados britânicos.
“Os consumidores britânicos têm falado alto e claro – eles não querem ser cúmplices na destruição das florestas preciosas do Brasil. Entretanto, os supermercados estão falhando em protegê-los do consumo de carne alimentada com soja destruidora da floresta”, afirma Robin Willoughby, diretor da Mighty Earth do Reino Unido. “Estamos instando os CEOs da Tesco PLC, J.Sainsbury’s, ASDA, Morrisons e Aldi UK a tomar medidas imediatas para deter a destruição do Brasil e abandonar a Cargill”.
De fato, juntamente com a divulgação da pesquisa, a Mighty Earth do Reino Unido está lançando uma campanha nacional para que medidas decisivas sejam tomadas em relação à Cargill.
Todos os meses, a Mighty Earth e a organização de pesquisa Aidenvironment usam alertas de desmatamento via satélite de agências governamentais brasileiras, imagens de propriedade, investigações por uma equipe local e envolvimento com as empresas nomeadas para estabelecer os vínculos entre os comerciantes de soja, processadores de carne bovina e a destruição de florestas no Brasil.
O Mighty Earth’s Soy & Cattle Deforestation Tracker (Rastreador de Desmatamento de Soja e Gado) conecta instâncias de desmatamento em larga escala na Amazônia e no Cerrado a comerciantes de soja e frigoríficos e torna esses vínculos públicos pela primeira vez. Ele não captura todo o desmatamento no Brasil, que é muitas vezes maior.
De acordo com a agência espacial brasileira (INPE), o desmatamento da floresta amazônica no país bateu o recorde dos últimos 12 anos. Na semana passada, o governo brasileiro removeu qualquer medida para combater o desmatamento no plano nacional de ação climática (conhecido como NDC) sob o Acordo de Paris, apesar de o desmatamento ser a principal fonte de emissões de gases de efeito estufa no país. Segundo a Mighty Earth, soja e pecuária bovina são as atividades mais relacionadas à degradação florestal no Brasil.
Em anexo está o relatório final do estudo e uma cópia preliminar de um briefing (em português) elaborado pela Migthy Earth que explica como a nova ferramenta de monitoramento por satélite tornará cada vez mais clara a relação entre o desmatamento praticado no Brasil e as cadeias produtivas globais.
Briefing note: THE MIGHTY EARTH SOY AND CATTLE DEFORESTATION TRACKER. Disponível aqui. (Versão português aqui).
Quais as empresas de pior desempenho associado ao desmatamento no Brasil?
O Novo Monitor de Deflorestação Mighty Earth Soja e Gado e Recomendações para Compradores de Supermercado.
Mighty Earth, EcoDebate, 23 de dezembro de 2020
Não obstante uma década de compromissos tomados pelos supermercados e empresas de bens de consumo associados às suas cadeias de abastecimento, o rápido desflorestamento de florestas e vegetação nativa no Brasil continua. [i]
Os números do Instituto Espacial Brasileiro INPE em novembro de 2020 demonstram que, pelo menos, 11 088 km2 de floresta tropical na Amazônia foi eliminada apenas entre agosto de 2019 e julho de 2020, o valor anual mais elevado em mais de uma década. [ii]
A investigação Mighty Earth baseada em imagens de satélite, investigações nas cadeias de abastecimento e dados TRASE, demonstra como os supermercados no Reino Unido, Países Baixos, França e nos Estados Unidos estão associados aos negociantes de pior desempenho quanto à desflorestação, como avaliado pelo novo Monitor Soja e Gado publicado pela Mighty Earth. [iii]
Com base nos dados de março de 2019 a novembro de 2020, o novo Monitor avalia o desempenho dos dez maiores embaladores de carnes e negociantes em soja que operam no Brasil.
Este classifica as empresas com base na extensão, gravidade e resposta quanto ao desmatamento nas suas cadeias de abastecimento.
O Monitor ilustra a desflorestação e desmatamento associados a negociantes desde março de 2019, conforme capturada no sistema de monitorização de Resposta Rápida da Mighty Earth e da Aidenvironment, que detectou mais de 200 000 hectares de conversão. Este é um tamanho consideravelmente maior do que Londres e equivalente ao tamanho de uma megacidade como a Cidade do México, Banguecoque ou Joanesburgo.
Embora não exista uma “lista branca” para fornecedores de soja ou carne de vaca que possa garantir uma cadeia de abastecimento limpa a partir do Brasil [iv], o Monitor mostra que os negociantes em soja Louis Dreyfus Company (LDC), AMAGGI e ALZ Grãos [v] representam os negociantes de melhor desempenho – o que significa que foram associados a menor desflorestação do que os negociantes de soja de pior desempenho, Cargill e Bunge.
É evidente, no entanto, que nenhuma empresa tomou uma ação significativa para resolver casos de desflorestação detectados pelo nosso sistema ou ilustrou uma cadeia de abastecimento livre de desflorestação e conversão.
Esta nova análise revela o embalador de carne JBS, e o fornecedor de soja Cargill como os de pior desempenho no nosso Monitor devido à quantidade de desmatamentos associada às suas operações. A JBS obtém uma classificação de apenas 1/100 pontos devido à grande quantidade de desmatamentos incluindo desmatamentos potencialmente ilegais que estão associados à sua cadeia de abastecimento. A JBS também obtém uma classificação baixa devido à falta de resposta quanto a casos de desmatamento assim que estes foram identificados.
Uma análise mais aprofundada das exportações do Brasil revela que estas empresas de pior desempenho estão associadas a supermercados nos Estados Unidos, Reino Unido, Alemanha, Países Baixos e França. Só no Reino Unido, a Cargill detém uma quota de 70% do mercado de importação de soja brasileira, que entra na cadeia de abastecimento dos supermercados do Reino Unido no formato de ração para animais, através de produtos derivados de frango, porco e produtos lácteos.
Os supermercados, especialmente, desempenham um papel crítico para garantir que os consumidores têm acesso a carne livre de desflorestação.
Especificamente, as equipas de liderança no seio das equipas de supermercados e aprovisionamento devem:
- Garantir que a empresa possui uma política de não-desflorestação e não-conversão forte que abranja tanto a carne de vaca como a soja.
- Inserir cláusulas nos contratos de fornecedores de carne de supermercados para especificar a condição livre de desflorestação.
- Para fornecedores e negociantes que se descubra não estarem em conformidade com a política de não-desflorestação e conversão da empresa, os supermercados devem usar uma abordagem incremental de envolver, reter, suspender e então excluir como recomendado pela Iniciativa-Quadro de Responsabilização, com suspensão imediata de casos de não-conformidade reincidente.
- No sentido de bloquear um progresso significativo dos negociantes de pior desempenho, os supermercados devem transferir a preferência de abastecimento para empresas de melhor desempenho em termos de desflorestação e desmatamento, conforme a avaliação da Mighty Earth.
- Melhorar a rastreabilidade da cadeia de abastecimento de carne para incluir informação ao público quanto às provisões de aprovisionamento, tanto para fornecedores diretos como indiretos.
A procura insaciável por carne na Europa, nos Estados Unidos e em países de rendimentos médios conduziu a uma explosão na procura por produtos de carne de vaca, bem como por soja, que é usada como uma proteína barata para alimentação de porcos, peixes de aquicultura, frango e vacas. Este aumento na procura por carne encorajou as operações agrícolas no Brasil a se expandirem para áreas florestadas e savana tropical, causando uma catástrofe ambiental e humana de desflorestação, desmatamento de vegetação nativa e expansão de terrenos. Como resultado, a produção de carne de vaca e soja são os dois principais impulsionadores da conversão de terrenos na América Latina.
Esta desflorestação e conversão é controlada principalmente por uma mão cheia de empresas que negociam em soja e gado. Estes negociantes em soja e embaladores de carne exercem uma influência desproporcionada sobre a produção nas “mega quintas” que os abastecem e, por sua vez, desempenham um papel crítico na extinção da desflorestação e na promoção de uma utilização do solo mais sustentável no Brasil e em outros países da América Latina.
O Monitor de Desflorestação Soja e Gado monitoriza recentemente estes negociantes e embaladores de carne, publicando relatórios sobre as suas associações com alguns dos maiores casos de conversão de terrenos no Brasil. Todos os meses, a Mighty Earth e o nosso parceiro, a Aidenvironment, publicam relatórios de Resposta Rápida sobre desflorestação e desmatamento de vegetação nativa associados a cadeias de abastecimento dos dez principais negociantes de soja e embaladores de carne que exportam do Brasil.
Utilizando estes dados, o novo Monitor Soja e Gado associa os casos aos negociantes e classifica as empresas com base na escala, gravidade e resposta aos casos.
Embora o monitor não forneça uma imagem da escala total da desflorestação que ocorre no Brasil, sublinha mais de 2 000 quilómetros quadrados (200 000 hectares) de alguns dos piores casos de desflorestação e desmatamento entre março de 2019 e novembro de 2020, e como estes estão associados a alguns dos maiores negociantes que operam no Brasil.
O Monitor pode desempenhar um papel crucial no apoio aos compradores de supermercado e gestores de cadeia de abastecimento para avaliarem os embaladores de carne e negociantes de soja com melhor e pior desempenho. Com dados mais atualizados sobre as maiores incidências de desflorestação, e informação discreta sobre como estão associadas aos seus fornecedores, os supermercados estão melhor equipados para incentivarem os negociantes em soja e embaladores de carne a agir. O Monitor também lhes permite aconselhar os seus fornecedores quanto aos riscos da desflorestação.
Adicionalmente, o Monitor, junto com os relatórios de Resposta Rápida que fornecem dados sobre o mesmo, confirma a investigação científica e os relatórios da imprensa sobre a devastadora desflorestação e desmatamento que ocorrem no Cerrado e na Amazônia. [vi] Não obstante a adoção disseminada de compromissos corporativos para eliminar a desflorestação, a conversão para soja e para os setores da pecuária continuam a progredir.
Durante a última década, os supermercados e as empresas de bens de consumo fizeram vários compromissos para alcançar a desflorestação zero nas suas cadeias de abastecimento. Estes compromissos incluem os realizados na Declaração de Nova Iorque sobre as Florestas 2014, bem como os incluídos no Fórum de Bens de Consumo de 2010. No acordo FBC 2010, 400 empresas apontaram para uma meta de desflorestação zero “líquida” nas suas cadeias de abastecimento até 2020. No entanto, nenhuma dessas empresas alcançou este objetivo.
Como revela o Monitor, a desflorestação e conversão generalizadas continuam, fomentadas pelos negociantes. Agora, com informação melhorada sobre as associações dos negociantes com casos de desmatamento de grandes dimensões, os supermercados e as empresas de bens de consumo que operam sob compromissos de desflorestação zero robustos, não têm desculpa para não aplicar as suas políticas através de envolvimento e ação comercial com os negociantes.
Embora o nosso programa de Resposta Rápida forneça um enfoque sobre áreas selecionadas de conversão de terrenos, só os casos que identificamos (225 000 hectares de desmatamento) são consideravelmente maiores do que a Grande Londres e equivalentes a uma megacidade como a Cidade do México, Banguecoque ou Joanesburgo. [vii]
Das dez empresas avaliadas entre março de 2019 e novembro de 2020, a Cargill, a JBS e a Bunge, estão associadas à maior quantidade de desflorestação e desmatamento nas suas cadeias de abastecimento. Durante este período, a Cargill e a Bunge estão associadas a mais de 61 260 e 38 976 hectares de desflorestação respetivamente. Em comparação, a Louis Dreyfus, um dos negociantes com melhor desempenho, foi associado a 3 881 hectares.
O Monitor inclui uma classificação global em 100 para cada empresa, indicando o desempenho geral da empresa no nosso programa de resposta rápida.
Esta classificação é calculada ponderando o desempenho da empresa em seis categorias:
- total de casos Resposta Rápida associados
- desmatamento de vegetação nativa total
- possível desmatamento ilegal total
- resposta aos relatórios de Resposta Rápida
- resolução de casos associados
- transparência
Os dados e pontuações globais serão atualizados regularmente.
Dadas as associações encontradas entre os negociantes em soja e embaladores de carnes e os principais supermercados, a Mighty Earth solicitou aos cinco maiores supermercados no Reino Unido, nos Países Baixos, Alemanha, França e nos Estados Unidos para confirmarem ou negarem as associações com os negociantes identificados neste relatório. As associações podiam existir através de abastecimento direto (ou seja, eles compram destas empresas diretamente) ou de abastecimento indireto (os seus fornecedores compram destas empresas).
No entanto, não obstante os nossos esforços, nenhuma das empresas forneceu informação sobre as suas associações, e muitas nem sequer responderam. Nenhum dos supermercados destacados no presente relatório possui informação disponível publicamente rastreando os seus fornecedores até ao nível da exploração agrícola, o que seria um passo importante para melhorar a informação na cadeia de abastecimento da carne.
A transparência nas cadeias de abastecimento, informações sobre de onde, e de quem se abastecem os supermercados, é um passo crucial para combater a desflorestação e o desmatamento.
A transparência também reforça a responsabilização estabelecendo quem é responsável e que passos podem ser tomados para manter as florestas, e outra vegetação natural, intactas. Apesar da necessidade de transparência para alcançar os objetivos de sustentabilidade, ao falharem em responder aos nossos pedidos e confirmarem ou negarem as associações com os negociantes, isto ilustra uma falha das empresas em operarem de forma transparente.
Esta falta de informação aponta quer para uma ausência de informação na cadeia de abastecimento em produtos de carne de vaca e soja de alto risco, ou que tal informação existe, mas as empresas não estão dispostas a partilhar ou divulgá-la.
Em resposta à exposição a produtos de supermercados destruidores das florestas como o frango, a carne de porco e o leite, os oito maiores retalhistas em França: Carrefour, Casino, Auchan, Lidl, Metro, Système U, Mousquetaires e Leclerc, anunciaram em novembro medidas para deixarem de utilizar soja associada à desflorestação (consultar caixa).
Os oito maiores supermercados em França: Carrefour, Casino, Auchan, Lidl, Metro, Système U, Mousquetaires e Leclerc, comprometeram-se em incluir cláusulas de não-desflorestação/não-conversão para produtos relacionados com soja nos seus contratos com fornecedores a partir de janeiro de 2021. Esta iniciativa pode atuar como modelo para que retalhistas em outros países possam seguir e melhorar.
Especificamente, os supermercados estão a exigir que os seus fornecedores deixem de comprar soja produzida em terrenos desmatados depois de 2020 no Cerrado, a principal região no Brasil sujeita a desflorestação para produção de soja.
Enquanto o setor retalhista francês está a tomar a responsabilidade de liderar neste compromisso a nível da indústria quanto a cadeias de abastecimento livres de soja de desflorestação, outros intervenientes chave da indústria, cujas cadeias de abastecimento incluem soja, tais como a LDC, Bigard, Groupe Avril, Elior, Sodexo, Burger King, Quick, Danone, Lactalis, Sodiaal, Bel e Cooperl, ainda não se comprometeram. Só um impulso coletivo por todas as patentes da cadeia de abastecimento da soja francesa enviaria um sinal absolutamente claro aos negociantes de soja para agirem de forma responsável e sustentável.
Apesar da falta de transparência quanto às suas provisões de abastecimento, a investigação Mighty Earth apresenta as associações entre os supermercados no Reino Unido, os Países Baixos, França e os Estados Unidos, aos piores negociantes quanto a desflorestação identificados no nosso monitor. [viii]
A investigação foca-se nas cadeias de abastecimento de soja na Europa e nas cadeias de abastecimento de carne de vaca nos Estados Unidos, devido aos níveis relativos de exposição do mercado.
O Brasil é um exportador significativo de soja para o Reino Unido, os Países Baixos, a Alemanha e a França, com o país a exportar cerca de 7.1 milhões de toneladas de soja só para estes países em 2018. Esta soja é, então, moída e refinada e vendida a empresas de produção de carne, para rações para frangos, vacas e porcos. Os supermercados, subsequentemente, vendem frango, porco, leite e queijo aos consumidores em produtos de “marca própria” ou de empresas de carnes bem conhecidas tais como a Moy Park (no Reino Unido), Le Gaulois e Maitre Coq (em França) ou Vion (nos Países Baixos).
A análise dos dados TRASE da Mighty Earth demonstram que 78% das exportações diretas de soja do Brasil para o Reino Unido têm origem nos biomas do Cerrado e Amazônia, onde os riscos de desflorestação são mais elevados. As exportações diretas de soja do Cerrado e da Amazônia também representam mais de 50% dos volumes totais de soja do Brasil para a França, os Países Baixos e a Alemanha.
O Brasil exportou cerca de 180 000 toneladas de carne de vaca para a União Europeia e quase 80 000 toneladas para os Estados Unidos, de acordo com os números mais recentes disponíveis (2017) através de empresas como a JBS, Marfrig e Minerva. Esta carne de vaca é depois vendida por supermercados como carne de vaca brasileira “de luxo” ou produtos de carne de vaca processada tais como carne enlatada Hereford (Reino Unido), ou AH Excellent South American beef (Países Baixos).
A exposição dos supermercados dos Estados Unidos ao risco da desflorestação também deverá aumentar abruptamente depois do governo dos EUA ter suspendido as restrições sobre as importações de carne de vaca fresca ou congelada do Brasil em março de 2020. [ix]
Os supermercados europeus estão criticamente expostos a dois dos negociantes de pior desempenho no monitor Mighty Earth, a Cargill e a Bunge, que foram associadas a 61 260 e 38 976 hectares de desflorestação respetivamente apenas entre março de 2019 e novembro de 2020 nos nossos relatórios de Resposta Rápida.
A Cargill detém uma quota de 70% das exportações de soja do Brasil para o Reino Unido e tem detido uma posição de dominância do mercado há algum tempo, devido à sua instalação de moagem localizada em Seaforth, Liverpool. Esta depois vende a soja no formato de farinha de soja para ração para animais a empresas de produção de carne, que, por sua vez, vendem a supermercados. Como resultado, os maiores supermercados do Reino Unido, Tesco PLC, J.Sainsbury’s, ASDA, Morrisons e Aldi UK estão altamente expostos à desflorestação da Cargill já que a sua soja entra na cadeia de abastecimento através quer de frango, porco e produtos lácteo de “marca própria”, como através de empresas de carne bem conhecidas tais como a Moy Park.
Igualmente, a Cargill e a Bunge enviaram mais de 660 000 toneladas de soja para os portos holandeses de Roterdão e Amesterdão em 2018. A análise da Mighty Earth mostra que os supermercados holandeses: Albert Heijn, Jumbo, Lidl e ALDI, entre outros, estão expostos a soja brasileira da Cargill, Bunge e outros negociantes na sua cadeia de abastecimento. A nossa análise dos dados TRASE mostra que 61% das exportações diretas de soja do Brasil para os Países Baixos teve origem nos biomas do Cerrado e da Amazônia, onde os riscos de desflorestação são mais elevados.
A Cargill e a Bunge também enviaram mais de metade de toda a soja importada do Brasil para a França em 2018.
Os supermercados dos Estados Unidos têm exposição à desflorestação às exportações de carne do Brasil através da JBS – o negociante com pior desempenho no monitor da Mighty Earth.
Os dados disponíveis mais recentes mostram que a JBS, Link Snacks Inc., Minerva, e Marfrig são os maiores exportadores do Brasil para os EUA desde 2018. A nossa investigação mostra que a Walmart, Costco, Kroger, Ahold Delhaize USA e Publix, todos vendem produtos JBS, quer importados diretamente ou abastecidos indiretamente da JBS USA.
Os supermercados têm um papel crucial a desempenhar para limpar a cadeia de abastecimento de carne e para impulsionar melhorias ao nível da indústria de negociantes que operam no Brasil.
Os supermercados são os maiores compradores de carne de vaca, frango, peixe de aquicultura, porco e produtos lácteos na Europa. Eles têm a responsabilidade de garantir que a sua cadeia de abastecimento está livre de desflorestação.
Os supermercados devem definir compromissos de política fortes e disponíveis publicamente sobre carne de vaca e soja livre de desflorestação e livre de conversão; estabelecer mecanismos de responsabilização para garantir que tais políticas são alcançadas; envolver os fornecedores e negociantes para garantir melhorias no desempenho e, caso isto falhe, implementar medidas comerciais, incluindo sanções ou suspensões, a aplicar a fornecedores não-conformes.
A Iniciativa-Quadro de Responsabilização representa um recurso autoritário para os gestores de cadeia de abastecimento de supermercados compreenderem e mitigarem riscos na sua cadeia de abastecimento, bem como, para fornecer uma lista de potenciais medidas comerciais. [x]
Especificamente, em relação ao novo Monitor da Mighty Earth, as equipas de liderança de supermercados e compradores devem:
- Garantir que a empresa possui uma política de não-desflorestação e não-conversão forte que abranja tanto carne de vaca como soja. 79% das empresas avaliadas pelo Forest 500 não tinham qualquer compromisso sobre desflorestação quanto a carne de vaca, e 73% não tinham qualquer compromisso quanto a soja em 2019.[xi] Um primeiro passo crítico, consiste em garantir que essa política está implementada, com uma forte responsabilização ativa de modo a garantir a aplicação.
- Inserir cláusulas nos contratos de fornecedores de carne de supermercados para especificar a condição livre de desflorestação. Estas cláusulas devem aplicar-se a todas as áreas de abastecimento, em vez de apenas à Amazônia.
- Quanto aos fornecedores e negociantes que se descubra não estarem conformes com a política de não-desflorestação e conversão: os supermercados devem usar uma abordagem incremental de envolver, reter, suspender e depois excluir como recomendado pela Iniciativa-Quadro de Responsabilização Os relatórios de Resposta Rápida da Mighty Earth e o Monitor são ferramentas úteis para avaliar os riscos ou não-conformidade em curso. Especificamente, o envolvimento deve encorajar os negociantes em soja e os embaladores de carne a agir para resolver casos de conversão detetados pelo monitor.
- Salvo no caso de uma melhoria significativa nas classificações dos negociantes de pior desempenho no monitor Mighty Earth, os gestores de abastecimento de supermercado devem considerar mudar as preferências de abastecimento de grupo dos seus fornecedores para longe dos negociantes com fraco desempenho (presentemente a JBS, Cargill e Bunge), para negociantes de melhor desempenho (presentemente Louis Dreyfus Company, Archer Daniels Midland, AMAGGI no nosso monitor) até que sejam implementados melhoramentos.
- Melhorar a rastreabilidade da cadeia de abastecimento de carne para inclui rastreabilidade completa até ao nível da exploração agrícola, tanto para carne de vaca como para a soja que é utilizada para alimentar frangos, porcos, peixe de aquicultura e vacas. Os supermercados devem rastrear os fornecedores a montante até que possam averiguar a conformidade, exigindo que os negociantes e fornecedores forneçam limiares públicos, ao nível da propriedade tanto de fornecedores diretos como indiretos. Esta informação deve ser colocada no domínio público para melhorar a transparência. Eles devem também garantir que todas as queixas contra os negociantes quanto a violações dos seus compromissos contra a desflorestação são divulgadas publicamente.
O trabalho da Mighty Earth é suportado pela Waxman Strategies. O trabalho da Waxman Strategies quanto a conservação das florestas é financiado em parte pela Federação Europeia dos Transportes e Ambiente, o Centro de Política Internacional e a AidEnvironment. A Waxman é obrigada, nos termos da Lei N.º 22 dos EUA, parágrafo 614, a divulgar que este material é distribuído em nome da organização supramencionada, trabalhando sob subvenção da Agência Norueguesa para Cooperação para o Desenvolvimento. Está arquivada informação adicional junto do Departamento da Justiça, Washington, D.C.
[i] Consultar a Declaração do Fórum de Bens de Consumo sobre Desflorestação (2010) e Declaração das Nações Unidas sobre Florestas (2014).
[ii] The Guardian (UK), “Amazon deforestation surges to 12-year high under Bolsonaro”, The Guardian (UK), Segunda-feira, 30 de novembro.
[iii] Importa notar que os dados TRASE utilizam os dados comerciais disponíveis mais recentes para exportações de soja e carne de vaca do Brasil. Estes são dados de 2018 para a soja e 2017 para a carne de vaca. No entanto, os dados comerciais e entrevistas com peritos de mercado indicam um nível de “rigidez” nas quotas de mercado de exportações e importações devido à infraestrutura fixa no Brasil e principais países importadores. Isto significa que, enquanto os volumes globais podem mudar de negociantes nas suas exportações a partir do Brasil, as quotas de mercado relativas provavelmente não se alterarão de forma significativa. Isto permite a criação de pressupostos quanto a dados de mercado para além de 2018 e até aos dias de hoje.
[iv] Nenhuma empresa teve uma classificação superior a 66/100 na nossa avaliação.
[v] Importa notar que a ALZ constitui uma “joint venture” entre a AMAGGI e a Louis Dreyfus Company.
[vi] Ao longo da última década, os cientistas estimam que cerca de 38 600 km2 de solo foram desmatados na Amazônia, o que é mais do que toda a área de solo de um país como os Países Baixos. Royal Statistical Society (2019), ‘International Statistic of the Decade’, 23.12.19. Para obter os dados de desmatamento no Cerrado, consultar WWF, “Cerrado Loses an Area the Size of London every 3 months”, 11 de dezembro de 2019.
[vii] Dados utilizando Demographia World Urban Areas (2015). 2 250 quilómetros quadrados desmatados. Banguecoque 2 590 km2, Cidade do México 2 072 km2, Joanesburgo, 2 590 km2, Londres 1 738 km2.
[viii] Consultar nota final iii quanto à rigidez dos dados de mercado relativamente à quota de mercado.
[ix] TRASE Insights, ‘Lifting of Import Ban Increases Deforestation Risk’, 2 de julho de 2020. Disponível aqui.
[x] Pode encontrar mais pormenores sobre penalizações comerciais apropriadas para a não-conformidade de fornecedores aqui.
[xi] Forest 500, isto inclui, mas não está limitado a supermercados. Consultar aqui.