Beatriz Silva*, mulher negra, jovem, periférica, lésbica e professora. Mais do que isso, Beatriz era considerada a melhor professora do colégio em que ela trabalhava, na região metropolitana do Rio de Janeiro. Quem dizia isso eram alunos e responsáveis que lidavam com sua dedicação e desempenho. “Meu filho só fala de você quando chega em casa”, “Minha neta está triste que vai mudar de turma e não vai ser mais sua aluna”, “Obrigada pela paciência que você tem com meu sobrinho, ele gosta muito de você”, esses são os relatos dos responsáveis de alunos direto para Beatriz, fora os que chegavam para a direção.
Mesmo diante de tanta satisfação na comunidade escolar, e também dos seus superiores, sua sexualidade foi o que determinou sua demissão. Ou melhor, a lesbofobia falou mais alto diante de toda capacidade profissional comprovada. A diretora ao descobrir que Beatriz foi à Parada do Orgulho LGBTQIA+, acompanhada da namorada, a mandou embora sem justificativas. Demitida por amar outra mulher. Por não se esconder num armário. Por não sentir vergonha de ser quem é. No colégio, houve “espanto” entre os funcionários, alunos e responsáveis, não pelo absurdo da situação, não à favor da liberdade da professora Beatriz. E infelizmente, esse é um sentimento muito conhecido por quem passa por essas violências.
Inicio esta coluna contando uma história verdadeira, com a certeza de que muitas mulheres lésbicas já passaram por situação igual ou parecida à de Beatriz. Ainda há inúmeras mulheres que, assim como ela, ainda se veem obrigadas a “esconder” sua sexualidade para acessar o mercado de trabalho ou até mesmo, instituições de ensino. São mulheres condicionadas à privação de suas identidades, numa estratégia de contenção para não perder ainda mais, além do que essa sociedade na maneira em que se organiza, costuma retirar de determinados corpos.
Ainda há inúmeras mulheres lésbicas que evitam trocar afeto publicamente porque sabem que podem ser fetichizadas, insultadas, agredidas, estupradas e mortas. E não é por menos, afinal, estamos falando do país que mais mata a população LGBTQIA+. Por isso, precisamos firmar e reforçar todos os dias a nossa contribuição à luta. Respeitar a vida e manter firme o compromisso de romper com os padrões de gênero e sexualidade impostas.
A data do 29 de agosto é um importante símbolo dessa luta. O Dia Nacional da Visibilidade Lésbica é pelo orgulho e afirmação de que as mulheres que amam outras mulheres existem e resistem! É um levante contra o apagamento e silenciamento histórico das opressões. Ainda há muito no que trabalhar, afinal, ainda faltam acessos, oportunidades e principalmente políticas públicas para garantia de direitos fundamentais. Por isso, precisamos de muitas mulheres livres ocupando tudo, inclusive a política, mantendo os legados dessa luta e os enfrentamentos necessários.
“Que nos próximos debates as machezas nos sorrisos
de canto de boca continuem. Não sairemos das
ruas porque não foi esse projeto que nos
colocou nas ruas, esse é um lugar que nós já estamos.
Gostaria de lembrar que é século 21, o
lugar das mulheres lésbicas existe. ”
- Marielle Franco
*O nome verdadeiro foi ocultado a pedido da jovem que preferiu não ser identificada.