Este texto foi escrito no mesmo momento em que a Câmara dos Deputados votava o Estado de Calamidade Pública em todo o território nacional; momento em que o país registrava a quarta morte pela Covid-19; vários estados e prefeituras de megacidades decretavam fechamento de comércio, serviços e de escolas. Tudo isso pouco depois de uma entrevista coletiva patética de Bolsonaro e ministros, mal-usando as máscaras indicadas apenas para contaminados e profissionais da saúde – o que jogou gasolina na fogueira de panelaços antigoverno que se espalham pelo país.
O fato é que, em meio do turbilhão de acontecimentos ameaçadores desse março inédito, a crise política brasileira deu um salto de qualidade. A instalação no Brasil da pandemia do novo coronavírus, combinada com a incapacidade do governo ultraliberal em tirar o país de anos de estagnação econômica, apimentada pelas recentes trapalhadas do núcleo olavista-bolsonarista (leia-se neofascista) para lidar com uma tragédia sanitária anunciada, demonstram a validade da tese da superposição de crises, tanto no terreno global como no nacional – a superpoposição atual é sanitária, ambiental, econômica e social.
O Brasil, como o mundo, vive uma crise civilizatória. Bolsonaro a provoca, acelera, incentiva. Bolsonaro é uma ameaça não só à democracia e aos direitos sociais do povo, como também à saúde pública. O Brasil precisa se livrar de Bolsonaro.
A anormalidade torna-se regra
Quem previa um mês já bastante “anormal” se preparava para uma jornada de manifestações contra o governo – depois que Bolsonaro se jogou pessoalmente na convocação dos atos de 15 e que seus acólitos insistem em se manifestar no 31. Chegamos a participar de fortes mobilizações de mulheres no 8 de março, que prometiam desaguar em atos-homenagem e de luta pelos dois anos da morte de Marielle, no dia 14, e em uma paralisação nacional no dia 18. Do lado da extrema direita, as esvaziadas manifestações do domingo 15 foram muito mais radicais que as de 2014-2015, recheadas de apelos ao fechamento do Congresso e do STF e outras medidas golpistas.
Mas tudo foi atropelado com a chegada da pandemia – que ameaça a vida dos mais idosos, dos menos saudáveis, e dos mais pobres. A Covid-19 pôs em evidência a disfuncionalidade desse governo, mesmo do ponto de vista da governabilidade burguesa.
A Covid-19 derruba bolsas em todo o mundo, põe megalópoles e metrópoles globais em quarentena, isola socialmente milhões de pessoas, para não colapsar os sistemas nacionais de saúde sucateados por décadas de políticas neoliberais. Exige planos radicais em defesa da vida. Enquanto isso, o presidente brasileiro continua relativizando a gravidade da ameaça e sua equipe econômica, apoiada por parte da mídia, defende como solução ainda mais “reformas” fragilizadoras do Estado.
Bolsonaro se isola
Incapaz, desde antes da crise sanitária, de dar resposta à estagnação econômica e se demonstrando absolutamente irresponsável diante da pandemia, Bolsonaro passou a ser questionado mesmo por setores econômicos e políticos que o elegeram e o sustentaram. Em Brasília, setores do Legislativo, Judiciário e Forças Armadas se debatem no dilema sobre como substituí-lo. O ponto de inflexão foi, com certeza, a inacreditável participação pessoal do PR em atos em seu apoio, com direito a apertos de mão e selfies tête-à-tête, no dia 15.
Um corajoso imigrante haitiano disse na cara do presidente, na frente do Palácio do Planalto: “Você não é mais presidente. Bolsonaro, acabou”. A viralização do vídeo é um símbolo comovente da situação em que vivemos. Em mais um sinal de isolamento do PR, pesquisas apontam que, pela primeira vez em meses, os bolsonaristas perdem o debate nas redes sociais, enquanto se multiplicam os panelaços anti-governo em várias cidades. Indícios interessantes de que parcelas da classe média que o elegeram começam a virar contra ele.
Em resposta, Bolsonaro segue com a estratégia de provocações via redes, na tentativa de concretizar seu projeto autoritário e golpista. Circula em grupos de Whatsapp um chamado para um ato no dia 31 de março. As milícias virtuais do neofascismo estão a todo vapor. A irresponsável aposta no caos, em momento de ameaça à vida de milhões, continua sendo o “modo Bolsonaro” de governar.
No entanto, a chave começou a virar. A ideia de nos livrarmos desse governo está neste momento em vias de se tornar maioria. É preciso mais do que nunca, do lado dos movimentos sociais e da sociedade, gritar Fora, Bolsonaro. Como disse o amigo haitiano, já deu, você acabou.
A saída tem que ser de esquerda e democrática
Desalojar Bolsonaro após os acontecimentos dos últimos dias é uma medida de saúde pública. Além de um projeto abertamente golpista, Bolsonaro conspira para agravar a pandemia ao desprezá-la e, tal como seu superministro Paulo Guedes, preocupar-se mais com os lucros das corporações do que com a vida d@s brasileir@s.
Rigorosamente não há mais condições políticas, morais e constitucionais (porque cometeu crime de responsabilidade) de mantê-lo no governo. A questão é como resolver o dilema de “quem o substitui”, num momento em que é impossível medir a relação de forças nas ruas. Há um evidente perigo: setores da direita que romperam com Bolsonaro e passam a defender o impeachment têm como alternativa a posse de Mourão, portanto, segundo sua ótica, de um governo mais estável, mais unitário entre os dominantes no sentido da agenda liberal, igualmente duro na repressão e que indicaria um fortalecimento da presença das Forças Armadas no Executivo. A esquerda não pode se confundir com essa saída.
Dificilmente haverá condições, durante a epidemia, de fazer transitar e votar um impeachment, pois, ao que tudo indica, o Congresso deverá por consensos e votações virtuais.
O impeachment precisa ser uma construção que unifique a esquerda, a oposição, entidades democráticas, movimentos sociais para que, quando apresentado, seja a expressão da esquerda, ligado à adoção de uma plataforma anti-neoliberal e democrática, que exclua a “hipótese Mourão”. É preciso exigir a antecipação de eleições presidenciais. Tudo isso sem prejuízo de estimular panelaços e movimentos por redes sociais, como o #acaboubolsonaro. É preciso pressionar por baixo para que Bolsonaro saia. Este é o desejo cada vez mais amplo dos trabalhadores e do povo brasileiros.
Este texto foi escrito no mesmo momento em que a Câmara dos Deputados votava o Estado de Calamidade Pública em todo o território nacional; momento em que o país registrava a quarta morte pela Covid-19; vários estados e prefeituras de megacidades decretavam fechamento de comércio, serviços e de escolas. Tudo isso pouco depois de uma entrevista coletiva patética de Bolsonaro e ministros, mal-usando as máscaras indicadas apenas para contaminados e profissionais da saúde – o que jogou gasolina na fogueira de panelaços antigoverno que se espalham pelo país.
O fato é que, em meio do turbilhão de acontecimentos ameaçadores desse março inédito, a crise política brasileira deu um salto de qualidade. A instalação no Brasil da pandemia do novo coronavírus, combinada com a incapacidade do governo ultraliberal em tirar o país de anos de estagnação econômica, apimentada pelas recentes trapalhadas do núcleo olavista-bolsonarista (leia-se neofascista) para lidar com uma tragédia sanitária anunciada, demonstram a validade da tese da superposição de crises, tanto no terreno global como no nacional – a superpoposição atual é sanitária, ambiental, econômica e social.
O Brasil, como o mundo, vive uma crise civilizatória. Bolsonaro a provoca, acelera, incentiva. Bolsonaro é uma ameaça não só à democracia e aos direitos sociais do povo, como também à saúde pública. O Brasil precisa se livrar de Bolsonaro.
A anormalidade torna-se regra
Quem previa um mês já bastante “anormal” se preparava para uma jornada de manifestações contra o governo – depois que Bolsonaro se jogou pessoalmente na convocação dos atos de 15 e que seus acólitos insistem em se manifestar no 31. Chegamos a participar de fortes mobilizações de mulheres no 8 de março, que prometiam desaguar em atos-homenagem e de luta pelos dois anos da morte de Marielle, no dia 14, e em uma paralisação nacional no dia 18. Do lado da extrema direita, as esvaziadas manifestações do domingo 15 foram muito mais radicais que as de 2014-2015, recheadas de apelos ao fechamento do Congresso e do STF e outras medidas golpistas.
Mas tudo foi atropelado com a chegada da pandemia – que ameaça a vida dos mais idosos, dos menos saudáveis, e dos mais pobres. A Covid-19 pôs em evidência a disfuncionalidade desse governo, mesmo do ponto de vista da governabilidade burguesa.
A Covid-19 derruba bolsas em todo o mundo, põe megalópoles e metrópoles globais em quarentena, isola socialmente milhões de pessoas, para não colapsar os sistemas nacionais de saúde sucateados por décadas de políticas neoliberais. Exige planos radicais em defesa da vida. Enquanto isso, o presidente brasileiro continua relativizando a gravidade da ameaça e sua equipe econômica, apoiada por parte da mídia, defende como solução ainda mais “reformas” fragilizadoras do Estado.
Bolsonaro se isola
Incapaz, desde antes da crise sanitária, de dar resposta à estagnação econômica e se demonstrando absolutamente irresponsável diante da pandemia, Bolsonaro passou a ser questionado mesmo por setores econômicos e políticos que o elegeram e o sustentaram. Em Brasília, setores do Legislativo, Judiciário e Forças Armadas se debatem no dilema sobre como substituí-lo. O ponto de inflexão foi, com certeza, a inacreditável participação pessoal do PR em atos em seu apoio, com direito a apertos de mão e selfies tête-à-tête, no dia 15.
Um corajoso imigrante haitiano disse na cara do presidente, na frente do Palácio do Planalto: “Você não é mais presidente. Bolsonaro, acabou”. A viralização do vídeo é um símbolo comovente da situação em que vivemos. Em mais um sinal de isolamento do PR, pesquisas apontam que, pela primeira vez em meses, os bolsonaristas perdem o debate nas redes sociais, enquanto se multiplicam os panelaços anti-governo em várias cidades. Indícios interessantes de que parcelas da classe média que o elegeram começam a virar contra ele.
Em resposta, Bolsonaro segue com a estratégia de provocações via redes, na tentativa de concretizar seu projeto autoritário e golpista. Circula em grupos de Whatsapp um chamado para um ato no dia 31 de março. As milícias virtuais do neofascismo estão a todo vapor. A irresponsável aposta no caos, em momento de ameaça à vida de milhões, continua sendo o “modo Bolsonaro” de governar.
No entanto, a chave começou a virar. A ideia de nos livrarmos desse governo está neste momento em vias de se tornar maioria. É preciso mais do que nunca, do lado dos movimentos sociais e da sociedade, gritar Fora, Bolsonaro. Como disse o amigo haitiano, já deu, você acabou.
A saída tem que ser de esquerda e democrática
Desalojar Bolsonaro após os acontecimentos dos últimos dias é uma medida de saúde pública. Além de um projeto abertamente golpista, Bolsonaro conspira para agravar a pandemia ao desprezá-la e, tal como seu superministro Paulo Guedes, preocupar-se mais com os lucros das corporações do que com a vida d@s brasileir@s.
Rigorosamente não há mais condições políticas, morais e constitucionais (porque cometeu crime de responsabilidade) de mantê-lo no governo. A questão é como resolver o dilema de “quem o substitui”, num momento em que é impossível medir a relação de forças nas ruas. Há um evidente perigo: setores da direita que romperam com Bolsonaro e passam a defender o impeachment têm como alternativa a posse de Mourão, portanto, segundo sua ótica, de um governo mais estável, mais unitário entre os dominantes no sentido da agenda liberal, igualmente duro na repressão e que indicaria um fortalecimento da presença das Forças Armadas no Executivo. A esquerda não pode se confundir com essa saída.
Dificilmente haverá condições, durante a epidemia, de fazer transitar e votar um impeachment, pois, ao que tudo indica, o Congresso deverá por consensos e votações virtuais.
O impeachment precisa ser uma construção que unifique a esquerda, a oposição, entidades democráticas, movimentos sociais para que, quando apresentado, seja a expressão da esquerda, ligado à adoção de uma plataforma anti-neoliberal e democrática, que exclua a “hipótese Mourão”. É preciso exigir a antecipação de eleições presidenciais. Tudo isso sem prejuízo de estimular panelaços e movimentos por redes sociais, como o #acaboubolsonaro. É preciso pressionar por baixo para que Bolsonaro saia. Este é o desejo cada vez mais amplo dos trabalhadores e do povo brasileiros.