Passados 58 anos do discurso “Eu tenho um sonho” e 56 da aprovação da lei que acabou com restrições ao direito ao voto, uma nova onda de obstáculos ao direito ao voto está a ser implementada pelos conservadores. Velhos ativistas do movimento dos direitos civis e novos do Black Lives Matter juntaram-se este sábado em protesto.
Esquerda.net, 29 de Agosto de 2021
A 28 de agosto de 1963, Martin Luther King pronunciou o seu famoso discurso “I have a dream”. Dois anos depois, a Voting Rights Act, lei que garantia o direito de voto das minorias contra as várias barreiras que tinham sido implementadas em alguns estados do Sul, como a necessidade de testes de alfabetização ou de cultura geral, foi aprovada. 58 anos depois, o dia desta intervenção de um dos líderes da luta pelos direitos civis foi a data simbolicamente escolhida para realizar, em dezenas cidades norte-americanas, manifestações contra as medidas que estão a voltar a limitar o acesso ao direito ao voto às minorias.
Só em Washington, calcula-se que tenham sido 20.000 pessoas a avançar com palavras de ordem como “direito de voto para todos” e “o voto é sagrado” contra a ofensiva dos Republicanos para limitar o universo eleitoral em vários estados norte-americanos. Se já nas eleições presidenciais de novembro passado o voter suppression, a supressão de eleitores, era uma preocupação séria, depois disso, só em 2021, segundo o Brennan Center for Justice da Universidade de Nova Iorque, pelo menos 18 estados já aprovaram 30 leis restritivas e há dezenas de outras em vias de avançar. Os pretextos para limitar o voto são vários, a necessidade de ter uma morada própria para se inscrever no recenseamento é um deles, os entraves burocráticos ao voto por correspondência são outro, mas o alvo são sempre as minorias mais desfavorecidas propensas a votar nos Democratas.
O braço de ferro é judicial, estadual mas também ao nível político nacional. A Câmara dos Representantes aprovou esta semana uma lei que visa restaurar a proteção ao voto que do Voting Rights Act mas esta será quase certamente bloqueada no Senado pela minoria conservadora como já o foi outra tentativa em junho.
Em Washington, vários líderes históricos do movimento dos direitos civis fizeram ouvir novamente a sua voz. O reverendo Al Sharpton dirigiu-se diretamente a Joe Biden: “na noite em que venceu disse que a América Negra tinha protegido as suas costas e que ia proteger as costas dos negros americanos. Bem, senhor Presidente, estão a apunhalar-nos nas costas.”
Martin Luther King III, filho do pastor assassinado em 1968, insurgiu-se contra as práticas de obstrução das votações nos órgãos representativos norte-americanos que têm permitido que supressão de eleitores avance: “o nosso país está a retroceder até os dias inescrupulosos do Jim Crow. E alguns dos nossos senadores dizem : ‘Bem, não conseguimos superar o filibuster. Digo-vos hoje: livremo-nos do filibuster. É um monumento à supremacia branca que temos de mandar abaixo”. O filibuster é a mais conhecida tática de obstrução à votação de legislação e consiste em travar a votação ocupando o tempo de intervenção.
A sua irmã, Bernice King, tomou a dianteira da manifestação de Atlanta e foi mais contundente. À Associated Press disse que serão necessários novos níveis de desobediência civil” para vencer estas leis: “vamos ter de ser disruptivos em algumas coisas. Vamos ter de perturbar este país até ao ponto em que as pessoas que ainda não estão envolvidas e na periferia se envolvam da mesma maneira.”