O Presidente russo não aceita qualquer solução que não seja a integração da Ucrânia no império, recuar seria uma derrota com um preço interno incalculável.
Putin não aceita qualquer solução que não seja a integração no império, recuar seria uma derrota com um preço interno incalculável. Lavrov arredondou a ambição, afirmando esta semana que se trata simplesmente de voltar aos equilíbrios da Guerra Fria, como se isso fosse possível com a realidade política dos países do Leste europeu após a queda do Muro. Zelensky parece querer acelerar a inclusão na NATO, embora tenha dado alguns sinais contraditórios sobre a questão, ao sentir a dificuldade. Ele quer defender-se militarmente de Putin e atacar Bruxelas, Berlim e Washington com pressão política, sabendo que o seu tempo é curto. Finalmente, a NATO aposta na sua extensão na fronteira russa, sabendo que o seu tempo é longo. Já ganhou, a simples reparação do trauma afegão já é um triunfo de enorme alcance.
De todos, um perderá em todos os cenários. É Putin. Perderá por duas razões, e não vejo como as possa evitar. A primeira é militar, não conseguiria manter um Exército de ocupação na Ucrânia, com a necessária rotação das tropas e face a uma população unida pelo ódio ao invasor. O império tem pés de barro. A segunda é económica: a Rússia não tem capacidade para sustentar uma economia autárcica (a Europa representa 37% das suas importações e 38% das exportações, não pode viver sem elas), nem a China, cuja economia é 10 vezes maior, substitui este mercado, pois não pode fornecer equipamentos para os aviões, semicondutores e outros bens de capital. A China também não dispõe de um sistema de pagamentos interbancários alternativo ao Swift (o CIPS inclui 80 bancos na área yuan e só em fevereiro integrou o primeiro europeu). O default do Estado russo será inevitável, mas o fecho da sua economia tem um custo social interno que pode pôr o regime em causa.
Ora, essa é a escolha da renovada aliança Washington-Berlim. A curto prazo, a Alemanha precisa do gás e do petróleo russos e, por isso, continua a importá-los, mantendo os principais bancos russos na rede de pagamentos. Dispensará a importação dentro de alguns meses ou anos, aceitando entretanto o custo da inflação, com a falta de produtos essenciais (o níquel para as baterias dos automóveis elétricos, por exemplo). O prémio da destruição da economia russa tem um custo, a recessão na Europa. Assim, graças a Putin, este será o século americano, pelo menos até ao confronto com a China. O mundo tornou-se um lugar mais perigoso, que não evita, antes prefere os caminhos para o inferno.
Artigo publicado no jornal “Expresso” a 11 de março de 2022