Dante Mariano
Na madrugada de hoje, 14, às 2h27, o Tribunal Regional Federal da 6ª Região, de Ponte Nova, em Minas Gerais, absolveu as empresas ecocidas Samarco, Vale, VogBR e BHP Billiton pelo rompimento da barragem de Mariana, no distrito de Bento Rodrigues, em Mariana-MG.
Essa é a resposta que a justiça brasileira dá para as mais de 600 pessoas desabrigadas, para 1,2 milhão de pessoas que ficaram sem acesso à água potável, para os 19 mortos e seus familiares, e para as comunidades indígenas afetadas, após 9 anos do maior crime socioambiental do Brasil.
É absurda e inaceitável a tese da Justiça de que não foi possível determinar qual conduta específica, de cada acusado, teria gerado a queda da barragem. Entre os acusados estão as quatro mineradoras e 22 pessoas, incluindo dirigentes das empresas e o engenheiro que atestou o laudo falso de estabilidade da barragem. A outra ação sob acusação de homicídios e lesões corporais também foi arquivada pela Justiça. O Ministério Público vai recorrer da decisão.
É preciso que a indignação da população em 2015, quando ocorreu o rompimento da barragem, seja a mesma hoje. A injustiça não pode prevalecer. A população, movimentos sociais, ativistas, partidos, organismos internacionais e o Governo Federal, por meio dos Ministérios do Meio Ambiente e dos Povos Indígenas, devem pressionar por justiça.
O Estado, que sedia o G20 no Rio de Janeiro e se organiza para receber a COP30 na região Amazônica, não pode ser omisso nem conivente com a impunidade dessas mineradoras ecocidas.
Para não esquecer
No final da tarde de 5 de novembro de 2015, o rompimento da barragem de Mariana despejou mais de 40 milhões de metros cúbicos de rejeitos de minério de ferro na natureza, soterrando vidas, sonhos e o futuro de uma comunidade inteira.
Durante os últimos 9 anos, a situação dessas comunidades só piorou.
Dados oficiais apontam para a deterioração da saúde mental da população, com um aumento de 160% no consumo de medicamentos para depressão, ansiedade e insônia, além de uma série de doenças de pele e respiratórias, decorrentes da contaminação por metais pesados, especialmente entre mulheres e crianças que, à época, eram apenas bebês. Comunidades tradicionais inteiras continuam sofrendo as consequências desse crime.
Pesquisadores apontam que, até hoje, animais, mesmo em localidades mais distantes, continuam se recontaminando em sua cadeia alimentar. A magnitude total do impacto talvez nunca seja mensurada: destruição da saúde das populações, dos ecossistemas locais e adjacentes, destruição da economia local, ruptura do modo de vida das comunidades, sua cultura, sua subsistência, suas relações ancestrais com o rio, que não se sabe se um dia voltará a se restabelecer.
Com a impunidade prevalecendo, nos perguntamos: até quando o capital valerá mais que as vidas?
Desde o rompimento da barragem, os maiores executivos da BHP e da Vale, operadores da Samarco, ganharam aproximadamente US$ 516 milhões (R$ 2,9 bilhões) das mineradoras. Os frutos desse modelo desenvolvimentista são os lucros exorbitantes para poucos e a destruição do ambiente, dos modos de vida e das relações ancestrais de muitos.
Continuemos na luta
A lama agora também está contaminada de desesperança. Mas precisamos barrar o avanço da mineração em nossos territórios e construir, coletivamente, um projeto anticapitalista de desenvolvimento econômico, que aponte para uma estratégia ecossocialista de produção e de modo de vida.
Nossa tarefa prioritária é enfrentar o modelo econômico desenvolvimentista, impedir o avanço do complexo industrial do agronegócio, promover uma transição energética justa, barrar a perfuração de poços de petróleo, especialmente na região Amazônica, lutar pela reforma agrária, pela soberania alimentar e pela demarcação de todos os territórios indígenas e quilombolas.
Justiça para os atingidos pela mineração!
Dante Mariano, biólogo e insurgente ecossocialista. Constrói o Setorial Socioambiental da Insurgência.