Simone Nascimento *
No dia 11 de dezembro, o Movimento Negro Unificado (MNU), entidade mais antiga do movimento negro no país, apresentou para sociedade brasileira a carta “Reparação como política de Estado e endurecimento da lei para punição dos crimes de racismo”.
No documento, o MNU afirma que o boicote ao Carrefour e a exigência de responsabilização penal, civil e econômica após a morte de João Alberto Silveira Freitas, homem negro, nas dependências de uma das lojas da rede, em Porto Alegre (RS), resultou numa queda de cerca de 6% nas ações da empresa nos dias que se seguiram. Isso representou uma perda de 2 bilhões de reais e, só por isso, a rede ofereceu dinheiro para um “pacotão” de ações superficiais de combate ao racismo.
“A repercussão na mídia convencional, nas plataformas, somada às manifestações, fez um pequeno arranhão na gigante desse setor que, risonhamente, em horário nobre, anunciou “investimentos” na ordem de 25 milhões de reais em protocolos antirracistas”, conta o documento.
Diante do debate na sociedade brasileira de como reparar danos causados pelo racismo, o movimento afirma: é necessária uma reparação urgente ao povo negro brasileiro, através do combate inegociável ao racismo, fruto de cinco séculos neste país de origem escravocrata e colonialista. O MNU propõe ainda que a reparação seja construída com metas para enfrentamento das desigualdades raciais, que violam todos os direitos humanos, com as maiores taxas de desemprego, pobreza e absoluta carência de infraestrutura básica e assassinatos. “O Estado brasileiro tem esses dados, aliás, são produzidos pelos próprios institutos oficiais, e revelam a dura realidade de um racismo continuado que desumaniza, oprime, maltrata e mata o povo negro”.
Ao longo dos 42 anos de existência, o MNU tem se empenhado no combate ao racismo apresentando ao Estado Brasileiro propostas para resolver o problema do país. Entre elas, está o Fundo Nacional de Promoção da Igualdade Racial, apresentada pelo deputado Luiz Alberto em 1998 e que, agora, tramita no Congresso como PEC 33/2016, de autoria do senador Paulo Paim, e prevê que o Fundo receba recursos de diversas fontes, inclusive multas de crimes cometidos por empresas como Carrefour, Extra, Assaí, entre outras. Na carta a entidade defende a aprovação imediata do Fundo.
Outra reivindicação é a aprovação do projeto de lei que determina a responsabilidade civil e criminal das empresas por crime de racismo. Esta proposta, que altera a Lei de Racismo, também foi apresentada pelo MNU, por meio do mandato do deputado Luiz Alberto em 1997 e 2001, e está novamente na pauta de votação da Câmara Federal, como o PL 5232/2020, da deputada Fernanda Melchionna (PSOL-RS).
Na carta, o movimento também denuncia que, apesar da legislação determinar a punição, deliberadamente, desde a sua aprovação, a Lei 7.716/99 que tipifica o racismo como crime inafiançável e imprescritível, tem sido desqualificada pelas instituições brasileiras. “A negação dessa lei reforça a ação dos racistas, mantendo a impunidade e, de forma cabal, naturalizando a morte de homens negros e mulheres negras. Para nós é uma questão de segurança pública a aplicação correta da Lei do Racismo, para isso defendemos a instalação de Delegacias especializadas em crimes raciais”, exige o documento.
Para a entidade, só a mobilização nacional e internacional articulada, concomitantemente entre os vários setores do movimento negro brasileiro, pode fortalecer a luta global contra o racismo. Leia a carta na íntegra com todas as propostas do MNU.
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*Simone Nascimento é jornalista, integrante da coordenação estadual do Movimento Negro Unificado em São Paulo e do RUA – Juventude Anticapitalista.