Homens, idosos, moradores do Sul e apoiadores de Bolsonaro tendem a ter menos confiança nas notícias, mostra levantamento. WhatsApp é usado como fonte por 71%.
Bruno Lupion, Deutsche Welle Brasil, 9 de setembro de 2021
O Instituto Reuters da Universidade de Oxford, dedicado a pesquisas sobre jornalismo, divulgou nesta quinta-feira (09/09) um relatório sobre a confiança das pessoas nas notícias, com dados detalhados sobre quatro países: Brasil, Estados Unidos, Reino Unido e Índia.
O estudo foi realizado por meio de entrevistas com cerca de dois mil respondentes em cada um dos países. No Brasil, a pesquisa de campo foi feita pelo Instituto Datafolha, e calibrada de maneira a representar as características da população em geral.
A pesquisa dividiu os respondentes em três grupos: desconfia em geral das notícias, confia de forma seletiva e confia em geral. Estes foram alguns dos resultados para o Brasil, com alguns exemplos dos outros países pesquisados.
Idade e gênero
Em geral, pessoas com 55 anos ou mais tendem a ter menos confiança nas notícias, mas essa diferença foi mais acentuada no Brasil.
Os brasileiros nessa faixa etária representam 38% do grupo dos que em geral desconfiam e apenas 18% dos que em geral confiam nas notícias.
O oposto é verdadeiro: as pessoas com menos de 35 anos representam 42% do grupo dos que em geral confiam, e apenas 24% dos que em geral desconfiam.
Em geral, homens também tendem a ser menos confiantes nas notícias. No Brasil, ele compõem 59% do grupo dos que em geral desconfiam. Na Índia, esse percentual também foi de 59%, e no Reino Unido, de 53%. Nos Estados Unidos, houve empate entre os gêneros.
Renda e escolaridade
Na Índia, no Reino Unido e nos Estados Unidos, pessoas com renda mais elevada tendem a estar entre os que mais confiam nas notícias. Já no Brasil, ocorre o oposto: é mais provável identificar confiança nas notícias em pessoas de baixa renda.
O Brasil também teve resultados diferentes dos outros países no quesito escolaridade. Na Índia, no Reino Unido e nos Estados Unidos, pessoas sem ensino superior em geral tendem a ser mais desconfiadas das notícias.
Já no Brasil, a diferença entre pessoas com baixa e alta escolaridade em relação à confiança nas notícias não foi significativa.
Geografia
No Brasil, os respondentes menos confiantes nas notícias eram os da Região Sul, marcada por um relativamente alto nível de desenvolvimento e segunda região do país onde Bolsonaro tem sua maior taxa de aprovação, atrás da Região Norte.
No Sul, 32% dos respondentes eram em geral desconfiados das notícias, enquanto 16% estavam entre os que em geral confiavam.
O panorama inverso ocorre no Nordeste, onde 31% dos respondentes em geral confiavam nas notícias e 20% em geral desconfiavam.
Apoiadores de Bolsonaro
Na Índia e no Reino Unido, os respondentes que apoiavam os primeiro-ministros Narendra Modi ou Boris Johnson tendiam a ser mais confiantes nas notícias.
No Brasil, a dinâmica é a oposta: os apoiadores de Bolsonaro tendiam a ter menos confiança nas notícias – similar ao que era verificado nos Estados Unidos quando o presidente americano era Donald Trump.
No grupo dos brasileiros que em geral desconfiam das notícias, 53% avaliavam Bolsonaro positivamente e 38%, negativamente. Já entre os que em geral confiam nas notícias, 28% aprovam Bolsonaro e 38 % desaprovam o presidente.
Confiança em plataformas e redes sociais
Nos quatro países pesquisados, a confiança em geral em notícias encontradas em plataformas de internet, como Google, Facebook e WhatsApp, é menor do que em empresas de mídia.
Quanto ao Facebook, a exceção é a Índia, onde 65% disseram confiar relativamente ou totalmente na plataforma para se informar. No Brasil esse percentual é de 42%, nos Estados Unidos, de 35%, e no Reino Unido, de 29%.
Em relação ao WhatsApp, ele foi considerado uma fonte relativamente ou totalmente confiável de notícias para 28% dos britânicos e 32% dos americanos. No Brasil essa taxa foi de 45% e na Índia, de 57%.
Já o Google foi considerado mais confiável que a maior parte das empresas de mídia nos quatro países pesquisados. No Brasil, a confiança total ou relativa no Google é de 74%, maior do que a de qualquer empresa de mídia. Já o Youtube é considerado uma fonte confiável por 58% dos brasileiros.
Chamou atenção no relatório o alto percentual de pessoas no Brasil que usam aplicativos de mensagem, como o WhatsApp, para consumir notícias: 71% fazem isso. O país só foi superado pela Índia, onde 82% adotam essa prática. No Reino Unido, esse percentual é de 32%, e nos Estados Unidos, de 30%.
Confiança nas empresas de mídia
A pesquisa realizada pelo Instituto Reuters também perguntou aos respondentes a sua opinião sobre diversos veículos de mídia de cada um dos quatro países.
Como as respostas "não sei" e "não conheço" para cada veículo variam, não é possível fazer uma comparação exata entre as empresas, mas este foram alguns dos resultados.
Na televisão, 68% dos brasileiros responderam que confiam totalmente ou parcialmente na Record. O SBT e a Band tiveram o mesmo percentual, de 64%. E a Globo foi considerada confiável por 59%.
Entre os jornais impressos, 58% responderam que confiam parcialmente ou totalmente no Globo, 50% na Folha de S. Paulo e 46% em O Estado de S.Paulo.
Na outra ponta, os veículos pesquisados que tiveram as taxas mais baixas de confiança total ou parcial foram O Antagonista, com 28%, Terça Livre, com 26% e Brasil 247, também com 26%.
Polarização quanto a veículos
Combinando as respostas sobre preferências partidárias e avaliação dos veículos de mídia, a pesquisa também identificou como a visão política do respondente se articula com a confiança nas empresas.
Nos Estados Unidos, há grande polarização sobre diversos veículos. A CNN, por exemplo, tem a confiança total ou parcial de 79% dos democratas e apenas de 29% dos republicanos. No outro extremo, somente 36% dos democratas confiavam total ou parcialmente na Fox News, contra 62% dos republicanos.
Essa análise não pôde ser feita com a mesma precisão no Brasil, onde a minoria das pessoas se identifica com um partido político – 65% dos brasileiros disseram não ter uma legenda preferida. Mesmo assim, foi possível identificar uma polarização em relação aos veículos do Grupo Globo.
Entre os apoiadores do PT, 83% responderam que confiavam total ou parcialmente nas informações veiculadas pelos Grupo Globo. Entre os brasileiros que não têo o PT como partido favorito, esse percentual foi de 54%
O relatório do Instituto Reuters observa que houve uma mudança na percepção dos petistas comparado ao período em que a legenda comandava o governo federal, quando essa parcela dos brasileiros tendia a ser mais crítica à mídia em geral, especialmente ao Grupo Globo. O estudo também aponta que, de forma geral, os petistas tendem a ser mais confiantes nas notícias do que a amostra geral no país.