É muito importante para tod@s @s ativistas envolvidos na luta contra Bolsonaro, no caminho para as mobilizações de rua de 19 de junho, discutir os casos do Chile e do Uruguai. A pandemia recrudescerá nas próximas semanas em todo o Brasil e os cuidados devem ser redobrados.
[Depois de ter baixado para um patamar entre 1600 e 1700 mortes por dia, a média móvel de mortes nos últimos 7 dias subiu gradativamente até chegar a 1.997 neste domingo. As tendências de alta são inequívocas e as perspectivas para as próximas semanas são muito negativas, com a chegada do inverno, a redução do isolamento social, a difusão das variantes e a vacinação lenta.
O problema pode, entretanto, se prolongar pelo segundo semestre, em um momento em que a campanha de vacinação no Brasil pode escalar - apesar das sabotagens do governo Bolsonaro - pela maior oferta de vacinas. As situação do Chile e do Uruguai parecem antecipar os problemas que nosso país enfrentará em três ou quatro meses. Enquanto os países centrais do capitalismo - cujas campanhas de vacinão se dão em ritmo acelerado - já planejam suas vidas ao fim da pandemia, o ônus central da crise pandêmica se desloca para a periferia do sistema, que soma uma percentagem cada vez maior dos mortos.
A questão, todavia, não se reduz ao número de mortos. Dois mil mortos é uma carnificina diária, a queda de oito aviões lotados todos os dias, significando um enorme sofrimento para milhares de familias - além das condições indignas dos óbitos, em isolamento, frequentemente depois de longos períodos de entubação e sem a possibilidade do contato com os familiares. Desde o início, a doença atinge desigualmente os mais pobres e as populações negras e aprofundou as desigualdade de gênero e raça. Todavia, temos agora uma mudança do perfil etário dos doentes, cada vez mais jovens (em função da eficácia da vacinação dos mais velhos), que com frequência cada vez maior sofrem as sequelas da "longa covid" e seus efeitos incapacitantes. Isso significa que a redução das mortes não significa necessariamente, nos países de nosso continente, uma redução da devastação que a doença vem produzindo.
O video abaixo de Diego Schelp, discutindo o caso uruguaio, e o artigo de Ítalo Lo Re, sobre a situação do Chile, funcionam como um alerta para o que nos espera no Brasil no segundo semestre.
Também nos previnem para os cuidados que devem marcar os novos atos de rua do dia 19 de junho. Temos que disputar as ruas com o bolsonarismo. Mas temos também que procurar reduzir os riscos do covid para a militância que chamamos para as ruas. As manifestações de 29 de maio mostraram um sem-número de encontros e confraternizações descuidadas, com as quais devemos aprender e que devemos discutir em todas as organizações sociais, particularmente entre os ativistas mais jovens. A organização criativa de colunas e formas de protesto com distanciamento social, o uso de máscaras PFF2 ou N95 (embora elas sejam mais caras...) e faceshields (que evitam que as mãos toquem o rosto) são importantes para reduzir o impacto dos atos na transmissão do vírus. Mas o essencial é consciencia e o auto-cuidado coletivo. [JC]
Por que o Uruguai tem alta de casos e mortes mesmo com vacinação avançada
Diego Schelp, Uol Video, 13 de junho de 2021
Coronavac no Chile: o que se sabe sobre a vacina a partir da experiência no país andino?
País referência em vacinação contra covid-19 enfrenta alta de casos e faz Coronavac ser questionada; estudos apontam diferentes indicadores de eficácia e especialistas reforçam que não é hora de preterir vacinas
Ítalo Lo Re, O Estado de S.Paulo, 11 de junho de 2021
O Chile possuía, até terça-feira, 8, pouco mais de 45% da população imunizada com duas doses de imunizantes contra a covid-19. Com ao menos uma dose, segundo a plataforma Our World in Data, eram 59%. O cenário positivo da vacinação, no entanto, não foi suficiente para que o número de casos deixasse de crescer no país — o que suscitou uma série de questões, sobretudo em relação à eficiência da Coronavac. Das 19.829.017 doses aplicadas no Chile, quase 80% são da vacina desenvolvida pela farmacêutica chinesa Sinovac.
No Brasil, segundo dados do Ministério da Saúde, 56% das doses aplicadas são da Coronavac, produzida no País pelo Instituto Butantan. Como a experiência no país andino pode projetar, em partes, o futuro da vacinação contra covid-19 no Brasil, o Estadão reuniu informações a respeito da vacinação no Chile e buscou explicar, com base em estudos e na opinião de especialistas, o que já se sabe sobre o imunizante da Sinovac. Confira as respostas
A Coronavac está dando resultado no Chile?
Segundo dados do governo chileno, no último mês, a quantidade de pacientes com mais de 70 anos internados em UTIs caiu de 372 para 342. Já nos pacientes entre 60 e 70 anos a queda foi mais acentuada: no dia 7 de abril, eram 783. Na sexta-feira, 667. Na faixa que vai dos 50 aos 59 anos, a queda teve início há 13 dias, com diminuição de pouco mais de 7%.
Em relação às mortes, nos últimos três meses houve queda de 20,84% na população com mais de 90 anos e de 4,35% para aqueles que têm de 80 a 89. Ambas as faixas estão totalmente vacinadas. Ao mesmo tempo, houve um pequeno aumento nos últimos sete dias nas faixas etárias de 60 a 69 anos e de 50 a 59 anos, onde nem todos têm as duas doses, e também entre os que têm menos de 39 anos.
Em entrevista ao Estadão, o infectologista da Universidad de Chile e integrante do comitê de vacinas do Ministério da Ciência e Tecnologia Miguel O’ Ryan explica que já é possível ver um efeito da vacinação. “Primeiro vimos uma diminuição no número de pacientes na UTI com mais de 70 anos, depois entre 60 e 70, e agora já observamos uma redução na internação de pacientes entre 50 e 60 anos”, relata. Para o especialista, ainda não se vê de forma clara, contudo, uma queda entre os que têm entre 40 e 50 anos.
Quando a vacinação em massa começou no país andino?
A vacinação em massa no Chile começou no dia 3 de fevereiro e, desde então, teve a Coronavac como o principal imunizante. Apenas 20% da população foi vacinada com doses da Pfizer/BioNTech, da Oxford/AstraZeneca e da CanSino. Segundo o governo, o imunizante chinês apresentou um nível de proteção de 67% em pacientes sintomáticos, preveniu em até 80% as hospitalizações, em 89% as internações em UTI e em 80% o risco de morte. Esses índices, é bom lembrar, só são atingidos 14 dias após a segunda dose.
Quais são os próximos passos do governo chileno?
A meta do governo chileno é ter 80% da população vacinada até o fim do primeiro semestre. Para O’Ryan, a vacinação no Chile é eficaz e a experiência pela qual o país está passando poderá servir como modelo para vários países. Segundo ele, se não houver um pico de casos e mortes durante o inverno, a partir de agosto ou setembro será possível retomar ainda mais atividades econômicas.
“Apesar de não ter um nível de proteção como o das outras vacinas, a Coronavac é eficiente e, além disso, causa poucos efeitos colaterais”, afirma o infectologista.
Mesmo com o avanço na vacinação, o Chile ainda tem um longo caminho pela frente. O país vem registrando mais de 6 mil novos casos por dia — no final de fevereiro era uma média de 3 mil novas infecções — , tem mais de 3 mil pessoas internadas e menos de 300 vagas em UTIs.
Nesta quinta-feira, 10, as autoridades sanitárias do Chile informaram que a região metropolitana, que abrange a capital, Santiago, e onde habitam mais de 7 milhões de pessoas, voltará à quarentena total no sábado devido ao aumento de casos de covid-19 nos últimos dias e ao alarmante colapso do sistema de saúde.
O que explica o aumento no número de casos de covid-19?
Os especialistas não têm respostas certeiras. Mas dizem que um dos fatores que pode ter contribuído para a alta foi o excesso de confiança na rapidez da vacinação, o que teria causado um relaxamento nas medidas de proteção. A circulação de novas variantes também é apontada como agravante. De acordo com o biólogo e colunista do Estadão Fernando Reinach, possíveis explicações incluem diferenças climáticas, novas cepas e o relaxamento prematuro do distanciamento social.
Quais as diferenças entre o Chile e países que estão com a vacinação avançada, mas com o número de casos em queda?
Para Reinach, o tipo de vacina utilizada é, de fato, uma importante diferença entre o Chile e os países em que o número de casos e mortes está caindo. “Nos EUA estão sendo usadas exclusivamente vacinas de mRNA (Pfizer e Moderna). Na Inglaterra vacinas da Pfizer e da AstraZeneca foram utilizadas em proporções semelhantes. Na Alemanha 80% das doses são Pfizer e Moderna e 20% são AstraZeneca. Em Israel 100% das doses são Pfizer. Essas vacinas têm alta eficácia e efetividade”, explicou em coluna publicada no Estadão no dia 5 de junho.
“Talvez a Coronavac seja capaz de reduzir internações e mortes, mas não consiga impedir completamente a propagação do vírus. Quando os resultados da fase 3 da Coronavac e do estudo em Manaus forem publicados, e os de Serrana forem terminados e avaliados, é possível que essa hipótese seja comprovada ou descartada. O tempo dirá”, conclui.
A Coronovac é aprovada pela OMS?
Em 1º de junho, a Organização Mundial da Saúde (OMS) anunciou a aprovação de uso emergencial da Coronavac. O órgão recomendou a vacina para uso em adultos de 18 anos ou mais, em um esquema de duas doses com espaçamento de duas a quatro semanas.
A experiência de vacinação no Brasil é mesmo similar à do Chile?
Em partes. O Brasil iniciou a vacinação com a Coronavac e logo em seguida começou a usar a vacina da AstraZeneca. Mas, com a compra de 200 milhões de doses da Pfizer, é possível que quando o País chegar a 40% da população vacinada com duas doses, mais de 50% do total de doses ministradas seja da Pfizer e o restante seja dividido entre Coronavac e AstraZeneca.
Portanto, é pouco provável que o País tenha 80% das doses vindas da Sinovac/Butantan como ocorre no Chile. “Nosso futuro talvez esteja mais próximo do que ocorre hoje na Inglaterra do que ocorre no Chile. Isso é uma boa notícia. O triste é que já poderíamos estar com cerca de 40% da população vacinada”, explica Reinach.
O que o experimento realizado em Serrana (SP) nos ensina?
A imunização em massa da população adulta no município de Serrana, interior paulista, comprovou a eficácia da Coronavac, segundo dados divulgados pelo Instituto Butantan. Resultados parciais do estudo divulgados em 31 de maio mostraram redução de 95% no número de óbitos, 86% de internações e 80% em casos sintomáticos de Covid-19. Os dados são preliminares.
Além disso, o número de hospitalizações e mortes na faixa etária superior aos 70 anos foi reduzido a zero após a semana epidemiológica 14 (meio de abril), quando 95% dos adultos de Serrana já estavam vacinados. Em texto publicado no Estadão, o epidemiologista, professor da Faculdade de Medicina da USP Paulo Lotufo explica que o Projeto S, desenvolvido pelo Instituto Butantan na cidade de Serrana, mostrou que, para se controlar uma epidemia, é necessária ação populacional, e não apenas individual.
Afinal, a Coronavac é ou não é eficiente?
Um artigo científico em pré-print (ainda sem revisão por pares) divulgado em 11 de abril aponta que a eficácia da Coronavac contra a covid-19 é maior do que o dado anteriormente divulgado. A chamada eficácia primária, que representa a proteção da vacina contra a doença em qualquer intensidade, passou de 50,38% para 50,7%, chegando a 62,3% com intervalos maiores que 21 dias entre as doses. Contra casos moderados, o imunizante tem eficácia de 83,7%, quando o dado anterior apontava 78%.
Já um outro estudo preliminar divulgado no dia 21 de maio indica que a efetividade da Coronavac cai conforme a idade e varia de 61,8% a 28% a partir dos 70 anos. O trabalho mostra também que o imunizante não confere nenhuma proteção com apenas uma dose. Na média, a efetividade após 14 dias da segunda dose ficou em 42% no grupo de idosos analisado. O índice é inferior ao verificado nos testes clínicos da vacina no Brasil, feitos majoritariamente com voluntários mais jovens.
Por outro lado, a Coronavac foi capaz de reduzir em 97% a mortalidade por covid-19 no Uruguai, segundo estudo preliminar feito pelo Ministério da Saúde daquele país e divulgado no dia 27 de maio. Os dados mostram ainda que o imunizante da Pfizer também teve alta proteção contra as mortes, ainda que em patamar inferior ao da Coronavac: 80%. O governo uruguaio, contudo, solicitou cautela na interpretação dos dados e na comparação com outras vacinas, já que os resultados não foram estratificados segundo faixa etária, presença de comorbidades e risco de exposição ao vírus.
Em resposta a reportagem do Estadão publicada nesta semana, a Prefeitura de São Paulo afirmou que todas as vacinas disponíveis no Brasil foram aprovadas pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e têm eficácia comprovada. "A pasta orienta que não seja feita escolha de um imunizante e nem que a vacinação seja atrasada por isso."
Já a infectologista do Hospital Sírio-Libanês Mirian Dalben afirma que todas as vacinas disponíveis hoje no País são eficazes e seguras. "É muito complicado comparar a eficácia global das vacinas", diz. "O estudo da Pfizer foi feito antes da maioria das variantes surgir, no meio do ano passado, e a da Coronavac, depois." Lançadas após a fase três das pesquisas, todas elas ainda passam por acompanhamento para se medir a eficácia em populações maiores ao longo do tempo, a chamada fase 4.
"Pode ser que depois de um tempo, no futuro, possa se dizer que uma é melhor que a outra para determinada população", afirma a infectologista. "Agora, o importante é tomar qualquer uma das três e não adiar. Não dá para ser sommelier de vacina."