O coração das finanças europeias, a City de Londres, também está sofrendo as consequências da pandemia: e entre os efeitos que poderiam permanecer, mesmo a longo prazo, está o abandono gradual da cultura, até então profundamente enraizada, do trabalho presencial de escritório. Os pioneiros até agora foram a grande empresa consultoria PwC (PricewaterhouseCoopers) e a casa de gestão Schroders, que foram os primeiros a anunciar mudanças permanentes em sua organização de trabalho.
Chiara Merico, Business Insider, 25 de agosto de 2020
A PwC, revela o Guardian, informou que em um futuro próximo a maioria de seus 22.000 funcionários no Reino Unido passará para uma mistura de presença no escritório e trabalho em casa de forma permanente. Na semana de meados de agosto, pouco mais de um quarto dos funcionários da empresa estavam presentes nos vinte escritórios da PwC em todo o país. "O lockdown desferiu o golpe de graça no trabalho presencial, não há dúvida sobre isso", disse o presidente Kevin Ellis. "Muitos líderes entenderam que sua equipe pode ser igualmente produtiva, envolvida e feliz trabalhando em casa." A empresa espera ter seus escritórios com 50% da capacidade até o final de setembro, se as condições permitirem, mas a volta será feita de forma voluntária.
Por sua vez, Schroders, grande fundo gestor de cotações, informou aos funcionários que eles não serão solicitados a voltar ao escritório em tempo integral, mesmo quando a emergência sanitária tiver passado. A empresa anunciou que adotou de modo permanente um modelo de trabalho flexível. “Repensar as regras da flexibilidade se revelará uma arma formidável para a produtividade a longo prazo”, explicou a gerente de RH Emma Holden. Antes da pandemia, os funcionários da casa na gestão podiam trabalhar de modo flexível um dia por semana: agora eles são livres para combinar planos de trabalho personalizados com seus gerentes, sem um número específico de dias para passar no escritório. A pandemia "mudou a sociedade irreversivelmente", disse o CEO Peter Harrison. "O escritório vai se tornar um local para reuniões periódicas entre os funcionários, mas o trabalho diário será nas casas."
Com um lockdown tardio e um alto número de vítimas, a Grã-Bretanha está repartindo devagar: só no começo de agosto o primeiro-ministro Boris Johnson passou a falar em volta ao trabalho, incentivando os funcionários a "negociar com as empresas" para encontrar a melhor maneira de fazer isso. De acordo com uma pesquisa do Morgan Stanley, apenas um terço dos "colarinhos brancos" britânicos voltou ao escritório desde o lockdown, em comparação com três quartos dos colegas europeus.
Em Londres, 69% da força de trabalho ainda está fazendo seus trabalhos remotamente, em comparação com 26% em Paris e 22% em Barcelona. E justamente as empresas da City parecem as mais relutantes em trazer os funcionários de volta em massa para os arranha-céus da Square Mile ou de Canary Wharf: o broker Numis anunciou em maio passado que a semana de trabalho de cinco dias no escritório "simplesmente nunca mais voltaria”, enquanto outras entidades do setor financeiro, como a Standard Life Aberdeen e o NatWest Group (anteriormente conhecida como RBS), solicitaram que a equipe trabalhasse remotamente pelo menos até o final do ano. O HSBC decidiu chamar de volta “não mais que 20%” dos funcionários ao seu escritório em Londres a partir de setembro; em contra tendência Barclays, cuja alta administração está pressionando por um retorno “físico” dos trabalhadores. No início de agosto, o escritório londrino do JPMorgan acomodava apenas 20% da força de trabalho, enquanto o escritório do Goldman Sachs iniciou a retornar desde meados de junho, embora apenas 15% dos funcionários tenham voltado cinco dias por semana. 90% dos funcionários do Morgan Stanley em Londres ainda estão trabalhando em casa, com esquemas de retorno parcial sendo finalizados. E até mesmo uma instituição histórica da City como a seguradora Lloyd's de Londres reabrirá fisicamente no dia 1º de setembro, mas sempre com pessoal reduzido, obedecendo às regras de distanciamento social.
No entanto, não faltam vozes críticas, em primeiro lugar do prefeito de Londres, Sadiq Khan, que, como seu homólogo milanês Giuseppe Sala, destacou como os escritórios vazios na capital criam problemas consideráveis para a economia da cidade, porque quem trabalha em casa não gasta em transporte, em comer fora ou se divertir. “Se todos nós ficássemos em casa, para o centro de Londres seria um problema”, explicou Khan em uma entrevista. “Muitas pequenas atividades baseiam-se justamente no fato que as pessoas vão ao trabalho: bares, cafés, lavandarias, sapateiros e tantos outros”. Até a conhecida rede de sanduíches Pret à Manger anunciou em julho o fechamento de 30 lojas e o corte de mil postos de trabalho, após a queda nas vendas justamente pelo alto percentual de trabalho em casa. O próprio governador do Banco da Inglaterra, Andrew Bailey, no mês passado incentivou as empresas a levarem de volta os funcionários para o escritório para ajudar a economia do Reino Unido que luta para se recuperar. Será o suficiente para reverter uma tendência que já parece solidamente em curso?
Reproduzido de IHU-Unisinos. A tradução é de Luisa Rabolini.