A lógica do business as usual tem uma única, grande vantagem: mascara a falta de sentido (lack of meaning) que às vezes se insinua até mesmo nas vidas mais vertiginosas, nas festas mais brilhantes, nas cidades mais dinâmicas, nos shopping centers mais lotados, no mito do crescimento sem limites. É um vazio de sentido que, graças ao silêncio, ao isolamento e à imobilidade impostos pela pandemia, poderia ter se tornado mais tangível.
Annamaria Testa, Internazionale / IHU-Unisinos, 7 de dezembro de 2020. A tradução é de Luisa Rabolini.
Há apenas alguns meses, quando a crise pandêmica parecia resolvida, pelo menos na aparência, tornou-se natural para muitos de nós entregar-se a um alegre esquecimento. Basicamente: a parte mais dramática da emergência parecia ter acabado. Retornar o mais rápido possível aos hábitos e comportamentos anteriores parecia não apenas desejável, mas até mesmo necessário e legítimo. Os cuidados e os lutos? Coisa do passado. Assim, muitos de nós nos comportamos como se fazer tudo exatamente como antes servisse para apagar o trauma social, econômico e psicológico da pandemia de forma mais rápida e definitiva. E como se em tudo isso houvesse também uma espécie de compensação pelo autocontrole e disciplina exercidos nos momentos mais trágicos e assustadores. É uma reação compreensível, pelo menos em nível individual (aqueles que governam, planejam e tomam providências deveriam, ao contrário, ter uma visão um pouco mais lúcida do futuro). Em um belíssimo artigo, publicado em maio de 2020 e digno de ser relido hoje na íntegra, o pesquisador Vittorio Pelligra traça as características e as razões dessa forma específica de agir. Trata-se, propriamente, de esgotamento do ego (ego depletion).
Armar-se de paciência. É, escreve Pelligra, "um fenômeno que determina estranhos comportamentos e que nos torna, por exemplo, após um esforço de vontade ou autocontrole, menos capazes de exercer nossas capacidades de julgamento e de resolução de problemas; tira a nossa lucidez e prontidão para a tomada de decisões, torna-nos mais vulneráveis às tentações e mais dispostos a comportamentos contraproducentes”. Pelligra acrescenta que, segundo alguns, isso acontece porque o exercício da paciência é cansativo e porque nossa reserva de autocontrole é limitada e depois de um tempo se esgota. Segundo outros, porque, precisamente, queremos compensar o cansaço do autocontrole concedendo-nos, o mais cedo possível, uma dose adicional de prazer. Pelligra conclui sugerindo que, para conter o esgotamento do ego, é preciso fortalecer as estruturas de valor. E “viver ativamente e com um senso de iniciativa, ao invés de passivamente com resignação. A primeira atitude produz sentido e autoestima, a segunda raiva e frustração”. Um projeto a ser cultivado para se aproximar de forma ativa, disposta (e, acrescento, consciente) de um futuro bastante próximo, no qual a fase mais aguda da emergência parecerá novamente distante, poderia ser justamente este: ser capaz de ativar algumas estratégias para não repetir os erros de comportamento que cometemos alguns meses atrás.
Deveríamos, em primeiro lugar, lembrar que crises e tragédias não terminam quando nós decidimos. Isso levará algum tempo. Ainda vai demorar para que a vacina seja distribuída (e se trata de uma operação de altíssima complexidade organizacional). Precisará tempo para que seja vacinado um número suficiente pessoas. Levará mais tempo para pensar em como nos aproximar uns dos outros com segurança. Finalmente, levará tempo para processar o trauma da pandemia se, como é desejável, não escolhermos novamente o atalho da negação, mergulhando de volta na ilusão falaciosa de business as usual. Em segundo lugar, seria oportuno prestar uma atenção precisa e renovada a todas as fraquezas e fragilidades sistêmicas que a pandemia colocou em evidência. Alguns âmbitos são óbvios: saúde e prevenção, em primeiro lugar. Mas também: cuidado dos idosos e tutela dos jovens. As desigualdades. E, além disso: a competência e confiabilidade dos tomadores de decisão. As relações entre estado e entes locais.
E o mais importante de tudo: a capacidade de desenvolver projetos sólidos, pensando a longo prazo. Tendo claro o fato de que, uma vez resolvida a emergência pandêmica, teremos que nos preparar para enfrentar a emergência climática, ainda mais complexa. Essa questão também é impossível de abordar em uma lógica business-as-usual. Em terceiro lugar, seria interessante pensar nos muitos vazios que a covid-19 deixará para trás, ao se transformar de uma pandemia em uma doença endêmica. Da mesma forma que faz, depois da tempestade, um enorme rio lamacento que volta para seu leito, deixando para trás um rastro de desolação. Claro: há em primeiro lugar o vazio deixado por 60 mil mortos (até hoje). Para perceber a enormidade do número, basta lembrar que, na Itália, o número total de vítimas civis durante toda a Segunda Guerra Mundial foi de 153.147. Seremos capazes de encontrar um rito, gestos, sinais adequados?
E depois, por exemplo, que argumentos preencherão o enorme espaço que a pandemia ocupou nas informações globais? Do que falarão os talk shows, as primeiras páginas dos jornais, os verdadeiros ou supostos formadores de opinião nas redes sociais, que durante um ano inteiro, todos os dias, vêm construindo grande parte de seus conteúdos sobre o covid-19, e sobre isso fidelizam sua audiência hoje? Eles serão capazes de encontrar temas igualmente importantes e cruciais para o futuro (haveria)? Ou, acostumados a transmitir emoções fortes e primárias, irão a outro lugar em busca de novas doses de medo, raiva, ansiedade? E nós, que somos público, saberemos escolher bem, ou apenas buscaremos mais alimento para nossas emoções? E o que preencherá o vazio de experiências e relações que garotos e garotas enfrentaram e sofreram em um período crucial de suas vidas? Eles serão capazes de compensar esse vazio, de buscar experiências significativas e relacionamentos autênticos? Saberemos nós, adultos, facilitá-los e talvez (até) inspirá-los? Ou, tomados por nossos problemas, os abandoarmos aos deles?
Finalmente. A lógica do business as usual tem uma única, grande vantagem: mascara a falta de sentido (lack of meaning) que às vezes se insinua até mesmo nas vidas mais vertiginosas, nas festas mais brilhantes, nas cidades mais dinâmicas, nos shopping centers mais lotados, no mito do crescimento sem limites. É um vazio de sentido que, graças ao silêncio, ao isolamento e à imobilidade impostos pela pandemia, poderia ter se tornado mais tangível. Tentar preenchê-lo com um planejamento positivo, mas também com sonhos e visão, poderia ser um grande desafio, tanto individual quanto coletivo.