65 milhões ficarão sem Auxílio Emergencial; 10 milhões, sem seguro-desemprego. Quebradeira de empresas multiplicará desocupação e pobreza. Contra a pasmaceira do governo, é preciso plano de reconstrução do país, já!
Clemente Ganz Lúcio, Outras Palavras, 22 de dezembro de 2020
O mundo parou para enfrentar os efeitos letais do novo coronavírus. O isolamento e o distanciamento social, necessários para bloquear a propagação do vírus e o agravamento da crise sanitária, travou a atividade produtiva com os mais severos impactos para o mundo do trabalho ao longo de 2020. Os gravíssimos problemas exigiram medidas de emergência e políticas públicas nas áreas da saúde e da proteção de renda e empregos.
O mundo do trabalho sofreu impactos jamais vistos nessa extensão, quantidade e intensidade. No Brasil, em poucas semanas, mais de 20 milhões de pessoas foram para a inatividade decorrente da necessidade de isolamento social. Outros 8,5 milhões foram para o trabalho em home office, cerca de 5 milhões continuaram no desalento e mais de 13 milhões ficaram em desemprego aberto. Por outro lado, milhões continuaram trabalhando com altíssimo risco tanto no serviço de saúde como nas atividades essenciais. Muitos morreram trabalhando para nos salvar!
No Brasil a dinâmica de enfrentamento foi, e continua sendo, contraditória. De um lado, o (des)governo Bolsonaro fez de tudo para descoordenar o enfrentamento que realizaram os governos subnacionais. Além disso, minimizou a crise sanitária, desestimulou o uso de máscaras e de distanciamento social e agora, como se não bastasse, difunde campanha contra a vacinação, ignomínias de uma longa lista de atitudes que coloca o país na vergonhosa segunda posição em termos de número de morto, grande parte evitáveis.
De outro lado, é quase inimaginável que se tenha conseguido mobilizar a proteção social proposta pelas Centrais Sindicais, movimentos sociais, parlamentares, governadores e prefeitos, recepcionadas pelo Congresso Nacional sensível ao problema, aprovando um orçamento especial que proporcionou criar um Abono Emergencial de R$ 600,00 e que protegeu mais de 65 milhões de pessoas; um auxílio salarial que protegeu quase 10 milhões de trabalhadores, além recursos para que as micro, pequenas, médias e grande empresas resistissem. Um custo que deve superar o equivalente a 8% do PIB. Contraditório porque, lembremos, essas medidas contaram com o posicionamento contrário do governo federal, que só as implementou por decisão do Congresso ou do Poder Judiciário.
A queda econômica estimada de 4% a 5% só não será maior devido aos efeitos positivos sobre a demanda propiciados pelas medidas de proteção da renda. O terceiro trimestre revelou uma boa retomada da atividade economia, com exceção do setor de serviços que continua abaixo da posição de fevereiro. O problema é que os dados do quarto trimestre indicam a desaceleração da intensidade do crescimento. Parece que o país voltará aos medíocres índices anuais de 1% de crescimento do PIB.
No quadro atual do mundo do trabalho, o fim dos auxílios emergencial e salarial pressionará milhões de trabalhadores protegidos a procurar de um posto de trabalho. A busca infrutífera por um posto de trabalho predomina e as taxas de desemprego crescem nos últimos meses e continuarão a crescer no primeiro semestre de 2021. De outro lado, muitos daqueles que retornarão do home office ou da suspensão do contrato de trabalho encontrarão a empresa fechada, falida ou reduzindo a atividade. Muitos serão demitidos, o que também pressionará o desemprego, porque a geração de postos de trabalho seguirá inferior a uma demanda jamais vista.
A saída dessa crise sanitária exigirá ações muito além de vacinação universal e medidas de proteção à saúde. A atuação intencional de descoordenação do (des)governo federal só agravará ainda mais um quadro sanitário e econômico muito complicado.
A superação da crise econômica deveria ser orientada por um projeto nacional de desenvolvimento, que o país não tem; que mobilizasse a recuperação da capacidade ampliada de investimento público em infraestrutura econômica e social, com instrumentos adequados e inovadores para aportes de longo prazo e articulados com investimento privado. Os desafios sociais e ambientais deveriam ser vetores mobilizadores de uma resposta econômica condizente com a superação das desigualdades e da pobreza, comprometida com as metas de reversão da emergência ambiental.
De imediato, as medidas econômicas deveriam estar voltadas para a geração de empregos para todos, animando a retomada das atividades produtivas com segurança sanitária, integrando todos os governos subnacionais para a criação de empregos de interesse público e social, recuperando o sistema público de emprego, trabalho e renda para promover intermediação de mão de obra e formação profissional, oferecer microcrédito produtivo, entre outros. Manter a proteção de renda com a prorrogação do auxílio emergencial e ampliação do seguro-desemprego é parte do que é essencial ser feito agora.
Tudo é urgente e deveria ser abordado de maneira estratégica para alçar o país para uma dinâmica virtuosa de crescimento econômico e desenvolvimento social e ambiental. Escolhas políticas que um diálogo social comprometido com o interesse geral da nação deveria produzir em 2021.