Kassab diz que presidente do Senado é candidatíssimo ao Planalto, mas ele próprio afirma que projeto não está definido. Legenda segue com um pé em cada canoa, com possível filiação de Geraldo Alckmin, cotado para vice de candidato petista
Afonso Benitez, El País Brasil, 25 de novembro de 2021
Quando fundou o PSD, dez anos atrás, o então prefeito de São Paulo Gilberto Kassab deixou claro qual seria o seu papel: jamais fecharia as portas para nenhum político. Dizia à época que a nova legenda, dissidente do DEM, não seria nem de esquerda nem de direita. Que seria independente. Não seria um partido engessado. E que apoiaria tanto a então presidenta Dilma Rousseff (PT) quanto o governador paulista da época, Geraldo Alckmin (PSDB).
Nesta quarta-feira, Kassab reforçou sua ambivalência. Na frente das câmeras e nos discursos oficiais durante o Encontro Nacional do PSD, em Brasília, ele diz que a legenda tem o seu “candidatíssimo” à Presidência da República em 2022, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (MG). “Nosso candidato está aqui ao meu lado (...) Ele saberá unir o Brasil, garantir e fortalecer a democracia”, disse em entrevista coletiva. Kassab destaca as qualidades de apaziguador do parlamentar e diz ver nele os melhores atributos para um chefe do Poder Executivo. Quando as luzes se apagam, contudo, o mandachuva do PSD trata como possível uma aliança com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), favorito na disputa até o momento. O apoio do PSD viria com a cessão de Alckmin para compor a chapa como vice de Lula. O ex-governador e ex-presidenciável tucano nem se filiou ao PSD ainda, e seu passe já está à venda.
Antes de deixar sua atual legenda, o PSDB, Alckmin espera o resultado das conturbadas prévias tucanas, que deveriam ter se encerrado no domingo passado, mas foi prolongada por duas panes, uma no aplicativo de votação e outra nos acordos políticos entre os candidatos Eduardo Leite e João Doria, governadores do Rio Grande do Sul e de São Paulo, respectivamente. Alckmin quer ajudar a implodir a candidatura de Doria, seu antigo afilhado político, para só depois decidir se vai mesmo para o PSD, se tenta se viabilizar como vice de Lula ou como candidato ao governo de São Paulo. Todo esse xadrez envolveria Kassab, que coloca na conta também as disputas em outros Estados. A meta do PSD é saltar de dois para cinco governadores em 2022. Além de ampliar sua bancada de deputados e, como vários dos oradores do evento desta quarta-feira disseram, “transformar o PSD no maior partido do Brasil”.
Algumas lideranças estaduais fazem até apostas sobre o tema. Kassab contou que dois pessedistas, o prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes, e o governador do Paraná, Ratinho Júnior, apostaram quem vai eleger mais parlamentares. Paes diz que elegerá dez deputados —em 2018 foram apenas três— enquanto Ratinho afirma que saltará de três para 12 eleitos.
Ascensão meteórica de Pacheco
Rodrigo Pacheco, o aspirante presidencial do PSD, é jovem e teve uma ascensão meteórica na política —em seis anos, cumpriu um mandato de deputado federal, metade como senador e já virou presidente do Senado. “No momento oportuno, tomaremos uma decisão”, disse à imprensa. Momentos antes, no auditório do luxuoso hotel brasiliense que sediou o encontro, porém, falou como o candidato que o partido expõe. Exaltou a importância de se combater crimes ambientais e o racismo, de incentivar a economia e, principalmente, de evitar a polarização política. “Convocado a esta missão de servir o PSD, eu o faço na condição de presidente do Congresso, e, em relação às eleições de 2022, reforço que estarei de corpo, alma, mente e coração a serviço do partido e a serviço do Brasil”.
Ainda alfinetou o presidente Jair Bolsonaro (sem partido), que apoiou sua candidatura para a presidência do Senado, mas que nunca deixou de ser um radical que estimula a divisão da sociedade. “Amor ao Brasil não é só colocar camisa brasileira e sair xingando o STF e o Congresso. Amar o Brasil é respeitar o que é diferente.”
A candidatura de Pacheco foi celebrada não só por Kassab. Outros oradores no evento fizeram o mesmo. Um deles foi o apresentador de rádio e TV José Luiz Datena, que negocia se filiar à legenda para concorrer ao Senado ou ao governo de São Paulo. “Não é pressão nenhuma, neste momento, tomar uma decisão de assumir a candidatura para a presidência da República é porque o Brasil precisa de gente como você. Que você tenha a melhor escolha possível”, disse em mensagem gravada a Pacheco. Também cobraram a candidatura própria os senadores Omar Aziz (AM), que destacou a capilaridade do partido pelo país, e Angelo Coronel (BA), que pediu para a legenda deixar de ser coadjuvante na política nacional.
Apesar da falta de um candidato à presidência, a primeira década de vida do PSD foi marcada pela presença de integrantes do partido em ministérios. Desde que criou seu partido de centro, Kassab já foi ministro de Rousseff e do sucessor dela, Michel Temer (MDB). Indicados pelo partido ocuparam cargos no primeiro e segundo escalões da União, assim como de Estados. E, apesar de os peessedistas não se declararem bolsonaristas, o atual ministro das Comunicações, Fábio Faria, é filiado à legenda. Na Câmara, em 90% das votações o PSD esteve ao lado do Governo. Na gestão Temer, esse apoio era de 92%, enquanto na época de Rousseff chegou aos 72% no segundo mandato e de 71%, no primeiro. Se há algo que não se pode questionar no partido é falta de coerência. Há dez anos, ele está com os pés em todas as canoas.