Apuração realizada pela Associação Paulista de Medicina aponta que 89% acreditam em segunda onda no Brasil. Na linha de frente, sentimento predominante é de apreensão. Ansiedade (69,2%), estresse (63,5%) e exaustão física/emocional (49%) são relatados, além de sensação de sobrecarga (50,2%)
A Associação Paulista de Medicina realizou, entre 25 de junho e 2 de julho, a terceira edição de pesquisa sobre os problemas e carências dos médicos no enfrentamento à Covid-19 e eventuais reflexos na assistência aos pacientes infectados.
A amostragem contou com a participação de 1.984 profissionais de todo o País, respondendo espontaneamente a questionário estruturado on-line, via plataforma Survey Monkey. Destes, 60% trabalham em hospitais e/ou unidades de saúde que assistem a pacientes com Covid-19.
Dos que perfilam na linha de frente de combate à pandemia, 76,3% atendem, em média, por dia, até 20 ou mais pacientes com suspeita e/ou confirmação de Covid-19, sendo que a maioria entre eles, 53% têm sob sua responsabilidade até 5 enfermos.
Quatro em cada dez dos médicos pesquisados, mais precisamente 41,6%, já acompanharam pacientes que vieram a falecer com suspeita e/ou confirmação de Covid-19, marca bastante elevada.
Capacitação para assistência
Somente 28% se dizem plenamente capacitados para atender casos de Covid-19, em qualquer que seja a fase do tratamento. 72% admitem não ter conhecimentos aprofundados, a despeito de permanecerem na linha de frente por uma questão humanitária.
Por isso, talvez, 57,2% façam papel de autodidatas e busquem informações científicas diretamente na literatura médica. Aliás, quando o tema é acesso a fontes de capacitação, 46% se atualizam via canais do Ministério da Saúde, 44,3% com as associações médicas e 43,4% citam hospitais privados, em pergunta com múltipla escolha de respostas.
Temor no dia a dia
O crescente número de médicos e outros profissionais da Saúde que engrossam os casos e óbitos confirmados por Covid-19 gera a seguinte reação entre os médicos: 19% registram estar com mais receio de ser infectado agora do que no início da pandemia; 49,7% mantêm o mesmo nível de temor e 31,3% hoje acusam menos medo do que quando começou a pandemia.
Falta de médicos
Já ao serem indagados se eles e os demais profissionais de Saúde estão trabalhando com estrutura física/insumos adequados e segurança, 59% se queixam de que isso não ocorre.
Pensando em futuro, apenas 5,7% consideram improvável o risco de faltar médicos para adequada atenção à saúde ao longo da evolução da pandemia de Covid-19. Os outros 94,3% creem nessa hipótese, em variados níveis.
Carência de diretrizes e insumos
Também há falta de diretrizes e de orientação ou programa para atendimento, conforme 25,1% dos questionados; e de máscaras N95, PFF2 ou equivalente – N99, N100 ou PFF3, para 24%.
Os participantes da pesquisa comunicam ainda falta de aventais, óculos, luvas, álcool gel, entre muitos outros insumos. E o que é crítico: faltam leitos para pacientes que precisam de internação em UTI, segundo 13,4%.
Clima psicológico
No dia a dia do ambiente de trabalho, a percepção dos médicos é a de que diminutos 3,1% estão otimistas, enquanto 63% se mostram apreensivos.
Sintomas comuns à Síndrome de Burnout ou Síndrome do Esgotamento Profissional são corriqueiros nos médicos que assistem a pessoas com Covid-19. Ansiedade (69,2%), estresse (63,5%) e exaustão física/emocional (49%), além de sensação de sobrecarga (50,2%), são os mais citados.
Pandemia de fake news
Notícias falsas (fake news), informações sensacionalistas ou sem comprovação técnica são inimigos que os médicos enfrentam simultaneamente à Covid-19. 69,2% dizem que interferem negativamente, pois levam algumas pessoas a minimizar (ou negar) o problema e, assim, a não observar as recomendações de isolamento social e higiene, ou a não procurar os serviços de saúde. Outros 48,9% falam que, em virtude das fake news, pacientes/familiares pressionam por tratamentos sem comprovação científica.
Violência a profissionais
No quesito violência, 37% confirmam ter presenciado, ao longo da pandemia, episódios de agressões a médicos, outros profissionais ou colaboradores administrativos nas áreas de atendimento (consultórios, ambulatórios, áreas de trânsito dos hospitais, enfermarias, unidades de terapia intensiva). Figuram entre as mais comuns a truculência psicológica (21,5%) e verbais (20,7%). O cyberbullying também tem citação alta (11,5%).
Subnotificação percebida
Quanto à possibilidade de subnotificação nos dados do Ministério da Saúde, 45,4% indicam estar sendo divulgado número menor de novos casos que a realidade, enquanto 21,5% têm a percepção de que o número de óbitos veiculados é inferior ao de fato ocorridos. Em relação à Secretaria Estadual, as razões são de 37% e 18,5%, respectivamente.
Segunda onda
Uma nova onda da Covid-19 atingirá o Brasil? 89% dos médicos creem que sim. 9.4% compreendem que será mais grave ainda; 37,3%, igualmente grave; e 42,3%, menos grave.
Agravamento de outras doenças
59% têm conhecimento do aumento de problemas de saúde (agravos) por outras causas não relacionadas à Covid-19 em pacientes que deixaram de buscar atendimento em hospitais e consultórios por medo de infecção – especialmente AVC, infarto, câncer, problemas cardíacos e descompensação de doenças crônicas e psiquiátricas. O comportamento da população no enfrentamento à pandemia passou pelo crivo dos médicos pesquisados.
Inadequação de políticas de saúde
O levantamento da Associação Paulista de Medicina colheu, por outro lado, a percepção sobre se estão adequadas as medidas aplicadas pelas autoridades de Saúde. Foram elencados isolamento, rastreamento, testes e campanha de conscientização. 56,2% registram que nenhuma delas é objeto de suficiente atenção desses gestores.