Cada vez mais, os trabalhadores das plataformas digitais estão a conseguir fazer frente à exploração e desregulação laboral na Europa. Esta é a conclusão do estudo da autoria de Anne Dufresne e Cédric Leterme, com o patrocínio do grupo parlamentar da Esquerda no Parlamento Europeu.
Esquerda.net, 5 de fevereiro de 2021
As plataformas digitais não poupam esforços para manterem os distribuidores sob falso trabalho independente, recusando-lhes o mais elementares direitos, como horário de trabalho, direito a férias ou o pagamento da segurança social, ao mesmo tempo que exercem um controlo total sobre o seu trabalho através do recurso a algoritmos avançados. Mas dos 59 processos apresentados em oito países da União Europeia por trabalhadores precários destas plataformas, 35 determinaram o reconhecimento do seu estatuto como trabalhadores efetivos de empresas tais como a Uber ou a Deliveroo, entre outras.
Entre 2016 e 2017 houve cerca de 40 greves pela Europa, no sector dos serviços de entrega de refeições com bicicletas, em resposta aos cortes nas taxas de serviços. Muitos desses protestos foram coordenados transnacionalmente.
Este estudo da autoria de Anne Dufresne e Cédric Leterme parte do contexto e dos desafios deste tipo de trabalho em concreto, que se baseia em três elementos chave: a incerteza legal e a insegurança, uma extrema degradação das condições de trabalho e a submissão a novas formas de dependência digital e de exploração. Tudo isto aliado a uma irresponsabilidade social não só em relação aos trabalhadores mas também às comunidades, e à concentração de poder que resulta da exploração e acumulação massiva de dados, que contribui para transformar estas plataformas em monopólios sectoriais de inteligência digital. Isto garante-lhes um crescente poder económico e político, nomeadamente face aos próprios estados.
Os autores analisam a situação atual na Europa e descrevem várias das estratégias que foram usadas em concreto para combater o modelo social imposto aos trabalhadores das plataformas e a este novo modelo de negócio. E demonstra como apesar de todas as dificuldades reais de organização, estes trabalhadores estão a conseguir construir um "novo laboratório de protesto social" através da combinação de duas estratégias: as ações coletivas e as ações judiciais, que considera eminentemente complementares. São as mobilizações que estão a ter lugar a diferentes níveis (local, nacional, europeu e internacional) que ajudam a sustentar as lutas jurídicas e políticas favoráveis aos trabalhadores relativamente ao seu estatuto.
Como explicam os autores, “hoje em dia, é de facto a luta que está a ganhar ritmo e a construção de um poderoso ator colectivo que abrirá a oportunidade para uma vitória dos trabalhadores relativamente ao seu estatuto. E, inversamente, é pela soma das vitórias nos diferentes processos judiciais que se cria jurisprudência favorável, que se estendem a outras possíveis futuras vitórias políticas, que a ação coletiva pode ser reforçada”.
O estudo termina contudo com uma questão em aberto. Segundo os autores, apenas se discute que tipo de economia digital ou de plataformas queremos, partindo sempre do pressuposto que a transição digital é inevitável e desejável, mas nunca se coloca a questão que deveria ser a primeira a ser considerada: “o que queremos e o que podemos permitir-nos em termos de digitalização e de plataformização da economia?”.