Kennedy Alencar, Thais Oyama e Ricardo Kotscho comentam a notícia veiculada dia 4 de novembro, na Folha de S.Paulo, por Mônica Bergamo: "Uma costura delicada entre lideranças do PT e do PSB tenta viabilizar uma chapa que una Lula como candidato a presidente da República e o ex-governador de São Paulo Geraldo Alckmin como vice”. Lembremos que Ricardo Kotscho foi, de 2003 a 2004, durante o governo Lula, foi Secretário de Imprensa e Divulgação da Presidência da República.
Plano de Lula para ter Alckmin de vice passa por PSD e Pacheco
Kennedy Alencar, UOL, 5 de novembro de 2021
O plano do ex-presidente Lula para ter o ex-governador Geraldo Alckmin como candidato a vice na chapa para 2022 passa por uma tentativa de composição com o PSD. Lula quer ampliar o seu arco de alianças políticas para a centro-direita, indo além das legendas de esquerda.
A chapa Lula-Alckmin tem dificuldades para ser viabilizada. O petista quer. O ainda tucano tem resistência à ideia devido ao passado de divergências entre os dois e seus atuais partidos (PT e PSDB) e também porque sonha com o retorno ao Palácio dos Bandeirantes em 2022.
Lula gostaria de formar uma aliança eleitoral que fosse o embrião de uma futura base de apoio parlamentar. No momento, as conversas para composições formais com o PT correm bem com o PSB, o PC do B e o PSOL (este com um pouco mais de obstáculos).
Houve um momento em que Alckmin cogitou ingressar no PSB, mas hoje a preferência dele é pela filiação ao PSD de Gilberto Kassab, que também tem as suas resistências para uma aliança com o PT.
No momento, Kassab gostaria de apresentar Alckmin para concorrer ao governo paulista e lançou o balão de ensaio da candidatura presidencial do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (MG), que acabou de se filiar ao PSD.
Nos planos de Lula, já transmitidos a Kassab, se Alckmin topar ser vice, ele e o PT apoiariam uma eventual candidatura de Rodrigo Pacheco ao governo de Minas. No meio do mandato, ele não teria nada a perder. Se vier a ser derrotado, Lula se comprometeria a dar suporte a uma reeleição de Pacheco para comandar o Senado.
O apoio à candidatura de Pacheco ao governo mineiro dependeria de uma mudança de rota interna no PSD, que filiou em 2019 o prefeito de Belo Horizonte, Alexandre Kalil. Internamente, a preferência seria de Kalil, mas Pacheco ganhou visibilidade nacional maior e poderia ser um candidato mais competitivo.
Em resumo, Lula sinalizou com expectativas de poder que interessariam a Kassab, que, no passado, já deu o cano em negociações com o PT — a mais importante foi mudar de lado e apoiar o impeachment de Dilma Rousseff em 2016.
Existem resistências a Alckmin, Kassab e PSD na esquerda do PT e no entorno do ex-presidente. A principal seria o nível de confiabilidade para evitar um golpe parlamentar como o sofrido por Dilma. A política de segurança pública de Alckmin também é muito criticada pelo PT e por setores sociais que têm hoje simpatia pela candidatura de Lula.
Em relação a Alckmin, o resultado das prévias presidenciais do PSDB terá peso na decisão sobre o futuro eleitoral. Se o atual governador de São Paulo, João Doria, vencer e for o candidato do partido ao Palácio do Planalto, isso abriria mais espaço para Alckmin se lançar no projeto paulista.
Se Doria perder para o governador Eduardo Leite (RS) e decidir concorrer à reeleição em São Paulo, a estrutura estadual do PSDB e o peso da máquina governamental levariam Alckmin a uma reflexão sobre o risco entre as duas possibilidades: vice de Lula e Palácio dos Bandeirantes.
Lula já sonhou com a possibilidade de ter a empresária Luiza Trajano como vice, filiando-a ao PSB. Ela resiste a entrar na política. Um vice considerado leal e preparado por Lula e os petistas seria o governador do Maranhão, Flávio Dino, que deixou o PC do B para se filiar ao PSB.
Lula sobre Alckmin, que ele quer na vice: "Único tucano que gosta de pobre"
Thais Oyama, UOL, 5 de novembro de 2021
Ontem, a colunista da Folha Mônica Bergamo revelou que lideranças do PT e do PSB tentam viabilizar uma chapa que una Lula como candidato a presidente da República e Geraldo Alckmin como vice..
Fato. Lula e Alckmin, que foram adversários nas eleições presidenciais de 2006 e 2018, negociam agora uma aliança da qual Lula é o maior entusiasta.
O ex-presidente já teve três encontros com o ex-governador de São Paulo, sendo o primeiro deles em julho, na casa do ex-deputado federal e ex-secretário de Alckmin Gabriel Chalita, com a presença do ex-prefeito Fernando Haddad.
Lula, que enfrenta sua maior taxa de rejeição em São Paulo — estado que Alckmin governou por quatro vezes e onde tem um eleitorado cativo — tem dito a interlocutores que "sempre" gostou do ex-governador.
Afirma que seus embates com Alckmin se deram na arena eleitoral, mas nunca no governo, e que a preocupação social é o elo que une os dois. "O Geraldo Alckmin é o único tucano que gosta de pobre", diz a amigos.
Sobre a resistência que a ideia de uma aliança com um tucano encontraria em setores mais radicais de seu partido, Lula disse recentemente a um aliado que "eles" (os radicais) "podem fazer duzentos manifestos contra". Sua preocupação com isso seria "zero".
E Alckmin? Como ele acha que seu eleitorado cativo e conservador reagiria à notícia de que ele estaria disposto a se aliar àquele que há décadas é visto como um inimigo de classe?
Segundo um aliado do tucano, Alckmin acredita que o fato de Jair Bolsonaro estar "do outro lado" justificaria essa "atitude extrema".
Como Lula, o ex-governador de São Paulo vê no presidente uma real ameaça à democracia. Assim, crê ser dever "de todos" evitar que Bolsonaro se reeleja e, com isso, possa, por exemplo, nomear os quatro próximos ministros do Supremo Tribunal Federal.
Lula, diz Alckmin, mesmo com o mensalão e o petrolão no currículo, "nunca representou um risco democrático como representa Bolsonaro".
Nos últimos meses, Alckmin, hoje praticamente um ex-tucano, cogitou filiar-se ao PSD, de Gilberto Kassab, e ao União Brasil, partido que surgirá da fusão entre o DEM e o PSL. Mas, na perspectiva de uma aliança com o PT, o PSB seria hoje a legenda mais conveniente para ele, dada a proximidade existente entre as duas siglas.
O ainda tucano decidiu deixar o PSDB, partido que ajudou a fundar, desde que seu ex-apadrinhado e atual desafeto João Doria, governador de São Paulo, trabalhou para impedir que ele se candidatasse à sua sucessão.
Segundo políticos próximos de Alckmin, reside aí o principal motivo da sua indecisão quanto à aliança com Lula: "O Geraldo gosta de governar São Paulo".
Dar uma guinada em sua biografia e embarcar numa chapa com o PT, além de por fim ao projeto de repetir a dose pela quinta vez, implicaria aumentar significativamente as chances de vitória do vice-governador Rodrigo Garcia, candidato de Doria — por quem Alckmin cultiva ardoroso desejo de vingança.
Uma chapa Lula-Alckmin? Sim, é possível, e esta é uma boa notícia da Folha
Ricardo Kotscho, UOL, 4 de novembro de 2021
Ainda a onze meses da eleição, até que anda bem movimentada a corrida presidencial para 2022.
Todo dia entra na pista um candidato novo. Ciro briga com o PDT e ameaça abandonar a candidatura dele. Bolsonaro parte para cima de Moro e vice-versa.
Mas o principal fato político do dia é o furo dado nesta quinta-feira pela minha amiga Mônica Bergamo, em sua coluna na Folha:
"Uma costura delicada entre lideranças do PT e do PSB tenta viabilizar uma chapa que una Lula como candidato a presidente da República e o ex-governador de São Paulo Geraldo Alckmin como vice".
A fonte não poderia ser mais confiável porque Mônica Bergamo é uma das poucas jornalistas que circula em todas as latitudes da política e é respeitada em todas elas.
Se essa aliança vai dar certo, ainda não dá para saber, mas o simples fato de esta possibilidade estar sendo discutida é uma boa notícia para o país civilizado que sobreviveu à criminalização da política promovida pela Operação Lava Jato.
Pelo menos, o país não votaria no escuro num salvador da pátria, como aconteceu em 2018: Lula já foi presidente da República por dois mandatos e deixou o governo com quase 90% de aprovação, enquanto Geraldo Alckmin governou São Paulo umas três ou quatro vezes.
Virtudes e defeitos dos dois são de amplo conhecimento público, assim como a biografia política de cada um. Ninguém poderá dizer mais tarde que foi enganado.
"Para viabilizar a ideia, algumas dificuldades precisam ser contornadas. Em primeiro lugar, tanto Lula quanto Alckmin ainda precisam ser convencidos plenamente de que a chapa pode funcionar _ não apenas para ganhar as eleições, mas especialmente para governar", escreve a colunista.
E este é o ponto central que poderia mover Lula e Alckmin a se unirem em 2022, pensando no que seria melhor para o país.
Acima do cacife eleitoral de cada um, está a capacidade de ambos de dialogar com as diferentes forças políticas e entidades da sociedade civil, em busca de convergências. O grande desafio não é como ganhar a eleição, mas como governar depois, sem ter que distribuir emendas secretas para ter maioria no Congresso.
Num ambiente político tão conflagrado e beligerante como vivemos ultimamente, com um país em ruínas, que clama por equilíbrio, paz e união, para promover a reconstrução nacional, precisamos de homens públicos que se coloquem acima das picuinhas e dos projetos pessoais, experimentados na lida da vida pública e voltados para promover o bem-estar social. Ambos já estão velhos para alimentar vaidades.
Não é a primeira vez que se tenta algo do gênero.
Às vésperas do Natal de 1993, o petista Lula e os tucanos Tasso Jereissati e Ciro Gomes, que depois migraria para vários outros partidos, chegaram a esboçar uma aliança PT-PSDB para as eleições do ano seguinte.
Foi na Cantina do Mário, no bairro do Ipiranga, em São Paulo, próximo ao escritório de Lula, lembro-me muito bem. A conversa rolou animada em torno de uma chapa Lula-Tasso, mas antes que eles se reunissem de novo, outro tucano, Fernando Henrique Cardoso, já costurava uma aliança com o PFL do cacique baiano Antonio Carlos Magalhães, sob as bênçãos de Roberto Marinho, e a ideia morreu no nascedouro.
Os 16 anos dos governos FHC e Lula, que se sucederam, foram os melhores e mais tranquilos do período pós redemocratização.
Outra lembrança que tenho é o de uma viagem de Lula à China, em seu primeiro mandato, quando foi acompanhado por uma fornida comitiva de empresários e políticos de diferentes partidos.
Entre eles, estava Geraldo Alckmin, então governador de São Paulo, que viajou com a esposa e a filha, chamando a atenção dos jornalistas que não conheciam o bom convívio do petista com o tucano.
Agora, de saída do PSDB, Alckmin poderia ir para o PSB, partido com o qual Lula já pensava em se aliar para 2022, o que seria um passo importante para levar adiante a negociação em torno da chapa, revelada por Mônica Bergamo.
Segundo a colunista, "os petistas que defendem a possibilidade afirmam que, apesar das diferenças com os tucanos na área econômica, Alckmin é o último remanescente do PSDB histórico, de Mário Covas e de Franco Montoro: apegado a valores democráticos e com olhar generoso em relação aos problemas sociais do Brasil".
Aconteça o que acontecer, este é a meu ver o fato novo mais importante da atual campanha eleitoral: a disposição de Lula de caminhar em direção ao centro e a de Alckmin de se aliar a um antigo adversário, com quem já disputou a presidência.
Com tantas novidades velhas, o Brasil anda muito carente de uma nova esperança de futuro para sair desse buraco em que se meteu na onda conservadora da antipolítica de 2018.
Muita gente me ligou hoje para perguntar o que acho dessa ideia. Acho excelente, e dou a maior força. Conheço bem os dois lados e sei do que estou falando.
Por último, para não variar, me lembrei da campanha das Diretas Já, que uniu o país contra a ditadura já nos estertores, quando os personagens citados nesta coluna estavam no mesmo palanque.
Os adversários ainda são os mesmos...
A democracia brasileira agradece. Vida que segue.