Darren Loucaides, Wired / Piauí / Outras palavras, 1 de junho de 2022
Em 6 de janeiro de 2021, enquanto uma multidão de apoiadores de Donald Trump começava a se reunir perto da base do Monumento a Washington, Elies Campo passava uma tarde agradável na casa de sua família em Tortosa, na Espanha. O dia 6 de janeiro, ou Dia de Reis, é o ponto alto da temporada de festas no país, um momento em que os parentes se visitam e as crianças ganham presentes. Campo, um engenheiro espanhol de 38 anos que mora no Vale do Silício, na Califórnia, ficara quase totalmente afastado da casa dos parentes desde o começo da pandemia. Agora, cercado por tios, tias e primos, pela primeira vez pôde pegar no colo os novos bebês da família. Sua cabeça não podia estar mais longe dos Estados Unidos.Assinar
Tudo mudou lá pelas oito da noite, quando um amigo norte-americano escreveu para saber se Campo tinha visto as notícias de Washington. Em seguida, veio uma avalanche de mensagens similares sobre a multidão que acabava de invadir o Capitólio, sede do Parlamento dos Estados Unidos. Enquanto via as cenas de violência no celular, ele começou a ser consumido por uma pergunta: Como isso poderia afetar a empresa na qual trabalhava?
Campo trabalhava no Telegram, o aplicativo de mensagens e rede social com uma base global de centenas de milhões de usuários. Agora, olhando outras plataformas de mídias sociais, ele percebeu que figuras da ultradireita estavam postando links para canais públicos no Telegram e incentivando seus seguidores a usar o aplicativo.
Com a cabeça a mil, Campo pediu desculpas aos familiares, foi ao andar de cima e continuou vasculhando as mídias sociais no laptop e no celular. Seis horas depois, tanto o Facebook quanto o Twitter tinham bloqueado os posts de Trump. Campo também via uma quantidade cada vez maior de aliados de Trump que, temendo ser igualmente banidos daquelas plataformas, inundavam o Telegram com mensagens e traziam junto seu público. Déu méu, ele murmurou para si mesmo em catalão – Meu Deus.
No mundo das redes sociais, o Telegram é nitidamente peculiar. Frequentador das listas das dez maiores plataformas do mundo, tem apenas cerca de trinta funcionários, até bem pouco tempo não tinha fonte corrente de receitas e – numa era em que as empresas de tecnologia se deparam com uma pressão cada vez maior para silenciar discursos de ódio e informações falsas – praticamente não faz moderação de conteúdo, a não ser para eliminar pornografia ilegal e incitações à violência. O Telegram tem como dogma, e como discurso de marketing, que a plataforma da empresa deve estar disponível para todos, independentemente de ponto de vista político ou ideologia. “Nós vemos o Telegram como uma ideia”, disse Pavel Durov, o russo que criou o aplicativo. “É a ideia de que todas as pessoas deste planeta têm o direito de ser livres.”
Campo compartilhava dessa crença – mas como chefe do setor de crescimento, negócios e parcerias do Telegram, ele também arcava com o fardo de suas consequências. Em meados da década de 2010, quando a imprensa começou a se referir ao Telegram como o “aplicativo preferido” de jihadistas, Campo foi quem mais se irritou com o Estado Islâmico. Ele diz que muitas vezes fica com a impressão de se comportar como um pai ansioso quando troca mensagens com Durov. “Eu sou o chato”, diz ele. Agora, Campo estava incomodado com a maneira como a imprensa e os parceiros comerciais do Telegram interpretariam a corrida para o aplicativo por parte de norte-americanos simpatizantes dos insurrecionistas.
Por isso, ele escreveu uma longa mensagem para Durov. “Boa noite, Pavel”, ele lembra de ter começado. “Você deu uma olhada no que está acontecendo nos Estados Unidos? Viu que o Trump está sendo bloqueado em outras redes sociais?” Ele alertou que a adesão da ultradireita ao Telegram tinha o potencial de “eclipsar” um fato bem mais lisonjeiro que, por mera coincidência, estava levando à corrida de novos usuários para a plataforma.
Naquela mesma semana, o rival WhatsApp, muito maior do que o Telegram, havia atualizado seus termos de serviço. Informações confusas deram aos usuários a falsa impressão de que eles precisariam passar a compartilhar uma quantidade maior de informações pessoais com o Facebook, empresa proprietária do WhatsApp e alvo de crescente desconfiança. Na realidade, a nova política não exigia que os usuários compartilhassem mais dados do que eles já forneciam havia anos (o número do telefone, o nome de perfil, certos metadados). Mesmo assim, muitos dos 2 bilhões de usuários do WhatsApp ficaram assustados com os novos termos de serviço, e milhões abandonaram o aplicativo – muitos dos quais correram para os braços do Telegram.
Durov, segundo Campo, tranquilizou-o sobre a avalanche dos apoiadores de Trump no aplicativo. “Comparado com o crescimento que a gente está tendo pela mudança dos termos de serviço do WhatsApp, isso é insignificante, e restrito à narrativa norte-americana”, respondeu Durov, segundo a lembrança de Campo. Se fosse necessário, Durov acrescentou, ele poderia publicar algo em seu próprio canal público no Telegram. Ainda com medo, Campo continuou sem dormir até de manhã cedo, olhando para suas telas.
Claro que nos dias seguintes Campo começou a receber perguntas de jornalistas sobre a adoção em massa do Telegram pela ultradireita norte-americana. Ele encaminhou essas perguntas para Durov, recomendando que ele falasse à imprensa. Em 8 de janeiro, Durov, de fato, foi a seu canal público – mas apenas para comemorar o imenso crescimento global do Telegram e para falar mal do Facebook, que, segundo ele, tinha toda uma equipe dedicada a descobrir “por que o Telegram é tão popular”. Em 12 de janeiro, Durov fez um novo post para comemorar que, nas 72 horas anteriores, sua rede havia recebido a adesão de 25 milhões de novos usuários. O Telegram, segundo ele, agora reunia uma população de mais de meio bilhão de pessoas. “Já tivemos outras ondas”, escreveu Durov. “Mas essa é diferente.” Dois dias depois, ele proclamou: “Podemos estar testemunhando a maior migração digital da história da humanidade.”
No entanto, embora espalhasse aos quatro ventos a notícia das estatísticas globais – 38% dos novos usuários vinham da Ásia, 27% da Europa, 21% da América Latina e 8% do Oriente Médio –, Durov não fez qualquer menção ao crescimento na América do Norte. Só em 18 de janeiro ele postou que sua equipe vinha “monitorando de perto a situação” nos Estados Unidos e que os moderadores do Telegram haviam bloqueado centenas de incitações públicas à violência. Mas desdenhou do problema, dizendo que menos de 2% dos usuários do Telegram ficavam nos Estados Unidos.
Para Campo, a leitura desses posts foi estranha. Durov basicamente ignorara seus conselhos e se recusara a discutir com ele qualquer declaração pública. Mais do que isso, embora fosse o chefe da área de crescimento do Telegram, função importantíssima nas empresas de mídias sociais, Campo ficara sabendo de todas aquelas estatísticas por meio do canal público de Durov, como todos os outros assinantes.
Essa era outra coisa altamente anormal no Telegram: Campo jamais podia acessar os dados brutos sobre usuários. “Eu não tenho como acessar nenhum painel virtual com todos os números”, disse-me ele em maio de 2021. Isso era muito diferente do procedimento operacional padrão do lugar em que Campo trabalhava antes: o WhatsApp.
Em 2014, depois que o Facebook comprou o WhatsApp, Campo pediu demissão em protesto contra os algoritmos “viciantes” do gigante da mídia e seu “impacto para a humanidade”. No entanto, no WhatsApp, Campo diz que todo empregado tinha acesso aos números de usuários nos diferentes mercados. No Telegram, caso Campo quisesse estatísticas, precisava explicar a razão para seu chefe. Durov é “muito, muito, muito restritivo”, diz Campo. “Tudo tem que passar por ele.”
Portanto, se o dono dizia que a atividade da ultradireita norte-americana era minúscula, Campo não tinha outra opção a não ser confiar na palavra dele. E, no Telegram, isso estava longe de ser a única coisa que dependia da palavra de Pavel Durov.
Há anos o mundo se inquieta com o domínio aparentemente inexorável do Facebook, agora rebatizado de Meta: sua implacável neutralização dos concorrentes, seja por aquisição ou por eliminação; o modo como subjuga a política, a cultura e todas as facetas da vida íntima às prioridades de um algoritmo concebido para anúncios comerciais; a sucessão crescente de escândalos sobre violação de privacidade; e seu histórico de pedidos dissimulados de desculpas quando é flagrado. Porém, ao longo do último ano, o império de Mark Zuckerberg passou a parecer um pouco menos inatingível. Com mais frequência, legisladores norte-americanos têm agido contra a empresa. Além disso, a poderosa capacidade da Meta de produzir efeitos em rede, que é o motor de sua supremacia, pareceu ter operado em sentido inverso por breves instantes – como quando houve o êxodo em massa de usuários do WhatsApp e, depois, quando ocorreu um apagão no próprio Facebook, em outubro do ano passado. De algum modo, o Telegram, com sua equipe minúscula, tornou-se um dos maiores beneficiários desses tropeços.
Se isso é bom para o mundo é outra questão, obscurecida pela escassa compreensão que se tem sobre o Telegram, inclusive nos Estados Unidos. A imensa maioria dos jornalistas continua a se referir ao Telegram como um “aplicativo de mensagens criptografadas”. Essa descrição irrita os peritos em segurança, que alertam para o fato de que, ao contrário de serviços de mensagem como o Signal ou o WhatsApp, o Telegram não tem criptografia de ponta a ponta na sua configuração padrão. Ou seja, os usuários precisam ativamente acionar os “chats secretos” do aplicativo (algo que poucas pessoas de fato fazem). Além disso, apenas conversas individuais podem ser criptografadas de ponta a ponta, não conversas em grupo.[1] Os especialistas alertam que, para milhões de pessoas que usam o Telegram em países com regimes repressivos, essa confusão pode custar muito caro.
A própria expressão “aplicativo de mensagens” é um pouco enganosa e pode levar muita gente a subestimar o Telegram. Ao longo dos anos, o aplicativo se tornou um híbrido deliberado de um serviço de mensagens e uma plataforma de mídias sociais – rivalizando não apenas com o WhatsApp e o Signal, mas também, e cada vez mais, com o próprio Facebook. Os usuários podem participar de canais públicos ou privados com números ilimitados de seguidores, onde qualquer um pode curtir, compartilhar ou comentar. Eles também podem participar de grupos privados com até 200 mil membros – uma escala que torna pífio o limite de 256 membros do WhatsApp.[2] Porém, ao contrário do que acontece no Facebook, no Telegram não existe publicidade dirigida nem feed movido a algoritmo.
Embora o Telegram tenha diversos canais e grupos dedicados a temas apolíticos, como a cena de tecnologia em Miami ou os filmes de Bollywood, como é chamada a Hollywood da Índia, o aplicativo se mostrou particularmente adequado para o ativismo político. Sua mescla de mensagens privadas e canais públicos torna o Telegram uma ferramenta perfeita de organização: ideal para fazer proselitismo em público e, depois, conspirar em segredo. “Eu chamo isso de dobradinha”, diz Megan Squire, cientista da computação da Universidade Elon, na Carolina do Norte, que estuda o Telegram. “Você pode fazer propaganda e planejamento no mesmo aplicativo.”
O aplicativo tem sido vital para manifestantes pró-democracia, da Belarus a Hong Kong. Contudo, a direita global parece achar o Telegram particularmente conveniente. Na Alemanha, um movimento contra as restrições impostas durante a pandemia de Covid usou o aplicativo para organizar protestos gigantescos na região central de Berlim em 2020, levando a uma invasão da escadaria do Parlamento por uma turba de extremistas, num sinistro prenúncio do 6 de janeiro norte-americano. (O objetivo declarado de alguns dos manifestantes era mostrar a Trump que eles estavam prontos para que ele livrasse a Alemanha de uma conspiração do Estado Profundo alemão.) No Brasil, o presidente ultradireitista Jair Bolsonaro também aderiu ao Telegram, baixado em cerca de metade dos celulares do país.[3] Analistas de desinformação alertam para o perigo que isso representa para as eleições presidenciais no Brasil em 2022, cujos resultados Bolsonaro ameaça contestar.[4]
Nos Estados Unidos, aplicativos norte-americanos, como o Parler e o Gab, também foram inundados por usuários da extrema direita depois de 6 de janeiro, mas perderam o impulso rapidamente. Sofreram hackeamentos catastróficos, e o Parler perdeu a hospedagem na Amazon. Nenhum deles tinha a capacidade de resistência do Telegram. Não demorou para que Donald Trump Jr. começasse a testar o clima do Telegram para o comandante em chefe que estava de saída. “A censura das grandes empresas de tecnologia está ficando cada vez pior, e se esses tiranos baniram meu pai, o presidente dos Estados Unidos, quem eles não vão banir?”, tuitou ele. O movimento ligado a Trump precisava de um lugar que “respeitasse” a liberdade de expressão, disse. “Foi por isso que aderi ao Telegram.”
No mês seguinte, o canal público de Donald Trump Jr. chegou a 1 milhão de membros. Um canal chamado @real_DonaldJTrump – “Reservado para o 45º presidente dos Estados Unidos” que publicava “posts sem censura do gabinete de Donald J. Trump” – também estava ganhando tração. Logo o canal tinha mais de 1 milhão de membros. Aliados populares de Trump seguiram o mesmo caminho, e seus canais cresceram rapidamente, ao mesmo tempo em que grupos dos Proud Boys, dos Boogaloo Boys e do QAnon também proliferaram.[5] De acordo com Megan Squire, que rastreou a atividade da ultradireita na plataforma desde 2019, o número de usuários norte-americanos de extrema direita no Telegram pode facilmente chegar a cerca de 10 milhões, mesmo número que Durov apresenta como sendo a quantidade total de usuários norte-americanos do aplicativo. Squire admite, contudo, que a falta de transparência quanto ao número de usuários da plataforma torna muito difícil saber com certeza.[6]
Em minhas muitas e longas conversas com Campo, ele pareceu extremamente dividido em relação ao Telegram. O executivo ainda sentia uma profunda admiração por Durov, e via as ondas de novos usuários como uma confirmação dos motivos pelos quais saiu do seu antigo emprego no WhatsApp. Mas ele tinha começado a se perguntar sobre a falta de transparência e sobre a cultura insular em torno de seu chefe, um sujeito cujos caprichos podem cada vez mais influenciar o destino da democracia no planeta.
Durov, de 37 anos, se tornou um dos mais poderosos e meticulosamente enigmáticos magnatas do setor de tecnologia no mundo. Depois de anos de declarado nomadismo, ele e o Telegram hoje estão oficialmente sediados nos Emirados Árabes Unidos. Um post recente no Instagram mostra Durov de pernas cruzadas, sem camisa e com o corpo bem definido no topo de um prédio de onde se pode observar a paisagem de Dubai. Quando não está exibindo seu torso impressionante, Durov invariavelmente usa roupas pretas, que a imprensa normalmente descreve como uma homenagem a Neo, do filme Matrix. Ele interage com o público quase que unicamente por meio de seu canal do Telegram, onde faz o papel de rei filósofo e de executivo sobre questões de liberdade de expressão, arquitetura de sistemas e as virtudes de consumir uma dieta baseada exclusivamente em peixes, abster-se de álcool e dormir sozinho. Dentro do Telegram, segundo Campo, o núcleo da empresa, composto basicamente por desenvolvedores russos, enxerga seu líder “quase como uma figura divina”, dirigindo-se ao chefe como “o senhor” e jamais o contradizendo. Nas palavras de Anton Rozenberg, um ex-funcionário: “É uma seita.”
Se for assim, o Telegram é uma seita particularmente fechada. Apesar das recomendações de Campo, Durov não dá entrevistas nem fala em público há anos, e os funcionários também são, em sua maioria, incrivelmente fechados. Procurei mais de quarenta pessoas que têm proximidade com a empresa e consegui falar com nove ex-funcionários e três colaboradores atuais de Durov. Para compreender o impacto do seu aplicativo, que se transforma rapidamente em uma das maiores plataformas do mundo, é preciso compreender algo ainda mais obscuro do que o algoritmo do Facebook: o ambiente interno do Telegram.
Enquanto a história da origem do Facebook envolve uma série de relacionamentos formados nos dormitórios da Universidade Harvard e rompidos ao longo dos anos, a história da origem do Telegram tem a ver com uma série de relacionamentos formados em grande medida num período ainda anterior: em quartos de crianças, olimpíadas escolares de matemática e laboratórios de informática de universidades. E embora muitos desses laços também tenham sido desfeitos e gerado rancores posteriores, um relacionamento sempre permaneceu no centro do Telegram: o de Pavel Durov com seu irmão Nikolai, quatro anos mais velho.
Quando Pavel nasceu, já estava claro que Nikolai era diferente das outras crianças. Aos 3 anos, dizem que ele conseguia ler quase como um adulto. Aos 8, resolvia equações de terceiro grau. Na adolescência, representava a Rússia em olimpíadas internacionais tanto de matemática quanto de informática, e chegou a se tornar bicampeão mundial de programação. Pavel também era impressionante. Começou a programar aos 10 anos, sob a tutela de Nikolai, só que o mais velho dos Durov era “um gênio entre os gênios”, diz Anton Rozenberg, que conheceu Nikolai ainda garoto num clube de matemática.
Nikolai, porém, também era um jovem dolorosamente desajeitado que nunca cresceu. Por anos, continuou dependente da mãe de um modo incomum. Mais tarde, em um texto, Rozenberg escreveria: “Ela controla quase tudo que ele faz. Onde ele come, aonde ele vai, quantos passos deve dar da estação de trem e qual táxi deve pegar.” Pavel era próximo da mãe, mas de um jeito diferente. “Eu era um menino teimoso que vivia batendo de frente com os professores”, escreveu ele em seu canal público do Telegram. “Minha mãe sempre ficou do meu lado – nunca ficou contra os filhos.” Andrei Lopatin, que conheceu os irmãos em torneios do clube de matemática quando tinha 11 anos, lembra de Pavel como um menino “que queria que tudo fosse do jeito que ele desejava”.
Os dois irmãos frequentaram a Universidade Estatal de São Petersburgo, onde o pai era professor de filologia, disciplina acadêmica que abrange o estudo da língua e da literatura. Nikolai estudou matemática. Pavel estudou filologia, escreveu poesia e parecia estar seguindo os passos do pai – até começar a construir sites. Ele criou uma biblioteca online em que os alunos de seu departamento podiam compartilhar anotações e outros materiais de estudo. A coisa se tornou tão popular que alguns estudantes começaram a faltar às aulas e passaram a decorar respostas de provas antigas, de acordo com Ilya Perekopsky, colega de estudos de filologia e amigo de Pavel.
Depois disso, Pavel criou um fórum online, no qual se denominava “o Arquiteto” e instigava debates sobre temas que iam do libertarianismo (ele próprio era um ávido inimigo de “ditaduras socialistas” e um devoto do livre mercado) até a discussão sobre a possibilidade de meninos e meninas serem de fato amigos entre si. “Ele intencionalmente provocava debates sobre tópicos muito diferentes”, diz Perekopsky. Pavel também criou contas com pseudônimos para incitar discussões e atrair usuários. “É um tipo de marketing, certo?”, indaga Perekopsky. O fórum tomou conta da universidade. E Pavel se viu gastando cada vez mais tempo com seus sites.
Os portais universitários de Pavel acabaram chamando a atenção de Vyacheslav Mirilashvili, um ex-colega de escola. Mirilashvili, que se mudara para os Estados Unidos, tinha acabado de ver o Facebook decolar e pensou que algo semelhante poderia funcionar na Rússia. Com o dinheiro que Mirilashvili ganhou trabalhando para seu pai, um israelo-georgiano que se tornou um magnata do ramo imobiliário, ele e Pavel reimaginaram o site universitário como uma ferramenta para encontrar colegas e amigos de infância. Mirilashvili também convocou um amigo russo-israelense chamado Lev Binzumovich Leviev. No outono de 2006, os três se tornaram cofundadores do VKontakte – uma expressão russa que significa “manter contato”. Pavel Durov inicialmente programou o site sozinho. Com um design simples nas cores branco e azul, o VKontakte parecia um dos muitos clones do Facebook que pipocavam mundo afora.
O VK, como a rede social ficou conhecida, decolou rapidamente. Porém, os bugs no site se multiplicaram junto com os novos usuários, mesmo depois de Nikolai Durov começar a ajudar o irmão, assim que voltou de um programa de doutorado na Alemanha. Quando Rozenberg voluntariamente informou aos Durov a existência de um bug, o próprio Pavel agradeceu e o convidou para fazer parte da empresa como administrador de sistemas, respondendo a Nikolai.
Pavel agora estava focado em gestão e design. Ilya Perekopsky, seu amigo do departamento de filologia, também entrou para a empresa como vice-presidente. Completando o time havia Andrei Lopatin, companheiro de muitos anos de Nikolai nas competições de matemática, que entrou para a equipe técnica do VK.
Foi um momento empolgante, diz Rozenberg. “Nos primeiros anos, eu trabalhei sem parar nos feriados, de manhã até tarde da noite.” Embora a equipe operasse basicamente em modo remoto, Rozenberg se lembra de vários encontros na casa dos Durov. Os irmãos ainda moravam com os pais. O apartamento ficava num típico prédio em estilo soviético na região Norte de São Petersburgo, uma área composta de torres altas e praticamente idênticas. Era comum que eles trabalhassem até tarde. Quando Rozenberg ia pegar o último metrô para casa, a mãe dos Durov mandava que Pavel e Nikolai o acompanhassem até a estação. Na lembrança de Rozenberg, esse era o único jeito que ela tinha de tirar os dois da frente das telas.
O VK não demorou a entrar no radar de outras redes sociais ávidas por compras. Em 2009, uma pequena delegação do VK visitou a sede do Facebook, em Palo Alto, na Califórnia. De acordo com Andrew Rogozov, chefe de desenvolvimento do VK, a viagem foi arranjada pela empresa do investidor russo-israelense Yuri Milner, que tinha ações em ambas as empresas. Segundo Rogozov, Pavel Durov não gostou muito de Sheryl Sandberg, diretora de operações do Facebook, nem de Christopher Cox, responsável pela parte de produtos, que pareceram pouco interessados numa conversa mais longa com a equipe do VK.
Mas Durov encontrou uma alma gêmea em Zuckerberg, que o convidou para jantar em sua casa naquela noite. Os dois compreendiam “a natureza obsoleta do Estado”, segundo uma citação atribuída a Durov no livro Code of Pavel Durov (O código de Pavel Durov), de 2012, escrito por Nikolai Kononov, jornalista que trabalhou como editor na versão russa da revista Forbes.
Segundo o relato de Kononov, Durov e Zuckerberg viam as redes sociais como uma superestrutura colocada sobre a humanidade, que permitia que a informação se espalhasse longe do controle centralizador dos governos e dos Estados. Mas Durov achou que Zuckerberg já havia cedido às pressões comerciais e do establishment. “O DNA da empresa é definido por Sheryl Sandberg, uma ex-lobista de Washington”, zombou ele. Para Rogozov, que também participou do jantar e ficou impressionado com a falta de emoções do robótico Zuckerberg, a experiência de estar em “território inimigo” inspirou-os de um modo específico: “Nós podemos concorrer com esses caras, certo? Porque eles têm uma quantidade enorme de recursos e estão perguntando pra gente como nós fazemos as coisas.” Zuckerberg, por exemplo, queria muito saber como o VK carregava tão rápido, apesar de ter uma equipe de menos de vinte pessoas, na comparação com o quadro de funcionários do Facebook, que tinha mil pessoas e continuava em expansão. Também houve perguntas de ambos os lados sobre como abarcar novos mercados. Rogozov comenta com um sorriso irônico que, não muito depois, o Facebook começou a atender o mercado russo, enquanto o VK lançou uma versão internacional em várias línguas.
Em 2010, o VK se mudou para um endereço ilustre numa avenida central de São Petersburgo. A nova sede da empresa ficava na Casa Singer, um marco arquitetônico com fachada art nouveau, entradas encimadas por esculturas gigantes de figuras aladas, uma torre com redoma de cobre e vidro, e candelabros ornamentando os tetos. “Ficamos muito orgulhosos de trabalhar num lugar daqueles”, diz Lopatin. “Mas parecia que a empresa tinha começado a crescer demais.”
Enquanto o VK se tornava de longe a maior rede social da Rússia, seus usuários descaradamente desrespeitavam leis de direitos autorais, publicando e compartilhando filmes e músicas pirateados. Mas Durov posava de indiferente. “A melhor coisa da Rússia naquele momento era o fato de que a esfera da internet era completamente desregulamentada”, disse ele, mais tarde, ao New York Times. “Em certos aspectos, era mais liberal que a dos Estados Unidos.” Pouco tempo depois, porém, operar na Rússia se tornou acima de tudo um problema – um problema que Durov precisou se esforçar para transformar numa vantagem.
Em dezembro de 2011, o partido Rússia Unida, de Vladimir Putin, dominou as eleições parlamentares em meio a muitas alegações de fraude. Protestos imensos eclodiram no frio do inverno, e o líder ativista Alexei Navalny esteve entre as centenas de presos. Certo dia, o administrador de um grupo pró-Navalny no VK, que contava com 80 mil membros, reclamou no Twitter que usuários tinham sido bloqueados ao postar na plataforma. Em resposta, Durov disse que sua equipe tinha resolvido o problema. “Está tudo certo”, informou ele, em uma mensagem privada. “Nos últimos dias, a FSB pediu que bloqueássemos grupos de oposição, incluindo o seu”, disse, referindo-se à sucessora da KGB. “Nós não fazemos esse tipo de coisa por princípio. Não sei como isso pode acabar para nós, mas estamos firmes.” Então, Durov tomou o ousado passo de tornar público seu conflito com os serviços de segurança, publicando no Twitter a carta que a FSB mandara para o VK e, junto, colocou sua “resposta oficial” como principal executivo: uma foto de um cachorro de olhos azuis com um capuz azul e a língua de fora.
Houve quem saudasse Durov como herói, mas uma fonte que trabalhava no VK na época acredita que ele rapidamente se deu conta de que “se a mídia fizesse dele o líder da oposição, ele não ia durar muito”. Tendo sido em grande medida invisível antes de seu confronto com o Kremlin, Durov começou a cultivar uma imagem pública cada vez mais temperamental. Numa carta para um jornal online, afirmou ser apolítico e brincou que, na verdade, não apoiava a democracia. Em maio de 2012, no dia de um grande festival municipal em São Petersburgo, Durov mais uma vez foi parar nas manchetes. Junto com o vice-presidente do VK, Perekopsky, Durov começou a fazer aviõezinhos com notas de 5 mil rublos – mais ou menos 150 dólares, antes da grande desvalorização do rublo após a invasão russa da Ucrânia – e jogá-los pelas janelas da Casa Singer para a multidão que participava do festival lá embaixo. Rozenberg se lembra de ver Durov e Perekopsky rindo enquanto as pessoas do lado de fora se engalfinhavam para apanhar o dinheiro.
Além disso, o relacionamento de Durov com o Kremlin era mais ambíguo do que parecia. Pouco mais de um ano depois dos protestos, o jornal russo Novaya Gazeta[7] publicou uma suposta carta de Durov para Vladislav Surkov, primeiro chefe de gabinete de Putin na época, considerado o responsável por moldar a estratégia de mídia do presidente russo. Durov aparentemente assegurava a Surkov que o VK vinha “ativamente fornecendo informações sobre milhares de usuários de nosso site na forma de endereços de IP, números de telefone celular e outras informações necessárias para sua identificação”. Ele também alertava o Kremlin que bloquear grupos de oposição só os levaria para o Facebook, que estava fora do alcance do governo russo. Embora tenha negado que a carta fosse real, Durov mais tarde reconheceu que ele e Surkov tinham se encontrado várias vezes na sede do VK entre 2009 e 2011.
Então, dias após o furo do Novaya Gazeta, Durov teria se envolvido em um atropelamento e fugido. A vítima era um policial. Durov negou que estivesse dirigindo o carro, mas brincou com o incidente no VK: “Quando você atropela um policial, é importante ir para frente e para trás, até sair tudo que tem lá dentro.” Pouco tempo depois, a polícia russa fez uma operação na sede do VK. “De repente, vinte homens silenciosos aparecem vestindo jaquetas de couro”, postou Nikolai Durov.
No dia seguinte, veio a público que os dois outros cofundadores do VK tinham vendido sua participação na empresa para um fundo de investimentos russo chamado United Capital Partners. Pavel Durov fez tudo isso parecer parte de um ataque coordenado ligado ao Kremlin, e a imprensa ocidental engoliu a história com farinha – pouco importava o fato de que Durov estava em conflito aberto com seus cofundadores havia meses, desde que descobriu que os dois estavam, sigilosamente, negociando a venda de sua participação. Quando Durov deixou de comparecer a uma audiência judicial relacionada ao atropelamento, houve relatos de que ele tinha ido embora da Rússia e estava nos Estados Unidos – especificamente, na sede de uma empresa chamada Digital Fortress, em Buffalo, no estado de Nova York. Corriam boatos de que Durov estava criando uma nova rede social nos Estados Unidos. E então, em 14 de agosto de 2013, um novo aplicativo apareceu na iTunes Store: o Telegram.
O logotipo do Telegram é um avião de papel, lembrando os rublos que voaram sobre a multidão na Casa Singer. A desenvolvedora que assinou o aplicativo é a Digital Fortress, cujo proprietário nominal era David “Axel” Neff, um norte-americano que conheceu Perekopsky durante os primeiros anos dele nos Estados Unidos. E a arquitetura se baseava em um protocolo de dados customizado chamado MTProto, desenvolvido por Nikolai Durov. Andrei Lopatin diz ter começado a ajudar Nikolai na escrita do protocolo em 2012. Agora, com o lançamento oficial do Telegram, Pavel Durov convidou Lopatin para ser o diretor executivo de uma empresa-mãe russa, batizada de Telegraph, “onde trabalhavam todos os desenvolvedores do Telegram”, de acordo com Lopatin. Enquanto isso, Pavel continuava como diretor executivo do VK.
As duas empresas, na verdade, estavam inexoravelmente interligadas. Nikolai deixou seu cargo no VK para se concentrar no Telegram, mas Rozenberg diz que ele nem chegou a mudar de sala na Casa Singer. De acordo com Rozenberg, que assumiu no lugar de Nikolai como novo chefe da parte técnica do VK, alguns funcionários ficaram confusos, sem saber quais espaços pertenciam a qual empresa.
Em suas descrições iniciais do Telegram, Pavel Durov frequentemente citava as revelações de Edward Snowden sobre softwares espiões usados por governos e afirmava que ele e Nikolai tinham criado o aplicativo a partir de preocupações com a vigilância do governo russo. Além dos chats normais, uma função de “chats secretos” usaria criptografia de ponta a ponta e armazenaria mensagens localmente nos dispositivos do usuário. Os servidores de nuvem do aplicativo, onde todas as demais mensagens eram armazenadas, seriam espalhados por várias jurisdições para dificultar que um governo, sozinho, pudesse forçar o Telegram a entregar alguma informação; a propriedade da empresa, do mesmo modo, seria dividida entre várias empresas criadas para esse fim. No entanto, Durov também dizia que o Telegram continuaria sendo um aplicativo sem fins lucrativos para evitar pressões legais e comerciais.
Com o Telegram começando a decolar rapidamente em todos os continentes, a nova acionista majoritária do VK, a United Capital Partners, parecia olhar com ciúmes para o novo aplicativo. A empresa acusou Durov de despesas irregulares e de desenvolver o Telegram usando recursos do VK. Durov, por sua vez, começou a reunir o núcleo de desenvolvedores mais leais a ele, dizendo que a nova proprietária do VK era “uma empresa do Kremlin” e que era inimiga deles. Em janeiro de 2014, Perekopsky deixou seu cargo no VK depois de uma discussão com Durov. (Perekopsky diz que não pode falar sobre o que aconteceu, por motivos legais, mas admite que houve um conflito e que eles “discordaram”.)
O que veio a seguir foi uma longa batalha na Justiça pelo controle do VK e do Telegram. Em uma tentativa de se apossar do Telegram, a United Capital Partners comprou de Neff, o amigo norte-americano de Perekopsky, três das empresas que tinham sido criadas para serem proprietárias do novo aplicativo. Durov disse que Neff o “traiu”. (Neff recusou pedidos de entrevista para comentar o tema.)
Com o controle do Telegram em jogo, Durov tomou uma atitude drástica. Em abril de 2014, ele e sua equipe entraram em uma série de aviões e voaram de São Petersburgo para Amsterdã, Nova York, Buffalo, Washington e Boston para visitar pessoalmente os centros de dados que abrigavam os servidores do Telegram – e para ter certeza de que a United Capital Partners não teria acesso a eles. Lopatin se lembra da viagem como algo frenético, e eles terminaram em cima da hora. Depois que o último voo pousou, Durov soube que finalmente tinha sido demitido do VK.
Mais tarde, Durov passou a dizer que seu adversário não era uma única empresa de investimentos, mas sim um regime inteiro. “Estou fora da Rússia e não tenho planos de voltar”, ele disse ao jornal digital TechCrunch em Dubai. “Infelizmente, o país é incompatível com o negócio da internet no momento.” Ele chegou a obter cidadania da minúscula ilha caribenha de São Cristóvão e Névis. Porém, embora Durov alegasse para a imprensa que o Kremlin o expulsou do VK e da Rússia, múltiplas fontes familiarizadas com a história da saída de Durov do VK disseram que os supostos elos entre a United Capital Partners e o Kremlin eram insignificantes. “A maior parte das grandes e médias corporações é favorável ao Kremlin; nada de novo nisso”, diz Steve Korshakov, programador e empreendedor que entrou para o Telegram em 2013.
Em todo caso, Durov acabou conseguindo o que queria – controle pleno do Telegram – em parte por meio da intercessão de um aliado ainda mais poderoso do Kremlin. Em janeiro de 2014, Durov tinha vendido sua participação no VK para um empresário chamado Ivan Tavrin, que, por sua vez, vendeu essas ações para um gigante da internet chamado Mail.ru Group, que acabou comprando a parte da United Partners Capital por 1,5 bilhão de dólares em 2014. Como parte do negócio, a United Partners Capital concordou em abrir mão de suas pretensões sobre o Telegram. De acordo com Tavrin, a renúncia aconteceu, em grande medida, graças a um dos acionistas controladores do Mail.ru, Alisher Usmanov, um dos mais ricos empresários da Rússia, que, assim como muitos oligarcas do país, tinha laços com o Kremlin.
“Sem a ajuda de Usmanov, Durov não seria dono do Telegram hoje”, diz Tavrin, que insiste em dizer que a saída de Durov do VK teve a ver apenas com negócios, não com política. “Pavel é o rei das relações públicas e do marketing. Provavelmente um dos melhores no mundo. Eu acho que ele queria fazer o papel de bonzinho para o Ocidente.”
Se os integrantes da equipe de Durov no Telegram tinham esperanças de navegar num barco mais estável agora que ele era dono inconteste da empresa, estavam errados. As relações do fundador da empresa com alguns dos funcionários continuaram a se deteriorar. Em outubro de 2014, Andrei Lopatin, que conhecia os Durov desde os 11 anos de idade, foi expulso do cargo de diretor executivo da Telegraph, a empresa-mãe do Telegram. Por algum motivo, Lopatin diz, Durov tinha começado a fazer bullying com ele. “Até hoje eu não entendi o motivo”, diz. E Steve Korshakov, que tinha entrado para o Telegram para desenvolver a versão do aplicativo para Android, se viu numa disputa com Durov depois de menos de um ano na função. Korshakov atribuiu isso ao estilo de liderança do fundador da empresa, explicando que Durov basicamente quer que seus empregados se concentrem em agradá-lo: “Você tem que descobrir do que ele gosta.”
Mundo afora, o mito de criação do Telegram se espalhava numa versão mais afiada e mais pitoresca. Em uma entrevista de dezembro de 2014 ao New York Times, Durov afirmou que a inspiração para o Telegram surgiu quando uma “equipe da Swat” visitou seu apartamento depois que ele enfrentou a FSB em dezembro de 2011. Com homens armados à espreita do lado de fora da casa, ele ligou para seu irmão. “Eu percebi que não tinha um meio de comunicação com ele”, disse Durov ao jornal. “Foi assim que o Telegram começou.”
Em entrevistas, Durov retrataria o Telegram como uma empresa distribuída por vários países, que não ficava sob a jurisdição de nenhuma nação, nem exposta aos aparatos oficiais de segurança – e, acima de tudo, ficava fora do alcance da Rússia de Putin. Ele retratou a si mesmo na entrevista ao New York Times como um “exilado”, uma versão que seria reproduzida em inúmeras reportagens. O jornal o descreveu como um “nômade, que fica poucas semanas em cada país, acompanhado por um pequeno grupo de programadores”. O Instagram de Durov parecia corroborar isso, com fotos de hotéis glamorosos e pontos turísticos dos lugares que visitava – Beverly Hills, Paris, Londres, Roma, Veneza, Bali, Helsinque.
A realidade das operações diárias do Telegram, porém, era consideravelmente mais tediosa: Durov continuava alugando uma parte da Casa Singer. Lopatin, o antigo executivo da Telegraph, diz que o fundador da empresa voltou para a Rússia no segundo semestre de 2014: “Quando saí do Telegram, ele estava na Casa Singer todos os dias úteis. Todos os membros da equipe também estavam na Rússia.” Outros funcionários do VK e do Telegram, na época, confirmam que Pavel Durov estava frequentemente na Casa Singer. Nikolai, que finalmente saíra do apartamento da mãe, trabalhava de um flat ali perto, segundo Anton Rozenberg, que o ajudou a mobiliar a casa nova. Rozenberg, que ficou sem emprego depois de se demitir do VK em solidariedade a Pavel, diz que costumava se encontrar com Nikolai nessa época para ir ao cinema ou jogar jogos de tabuleiro. Lopatin diz que, antes de ser demitido, a equipe viajava para o exterior algumas vezes, todos juntos, mas na maior parte do tempo todos estavam em São Petersburgo.
O mito, se é que se pode chamar assim, sem dúvida ajudou a promover o Telegram internacionalmente. No início de 2016, o aplicativo se aproximava de 100 milhões de usuários. E o núcleo central da equipe do Telegram se empenhava para fazer atualizações constantes, que possibilitariam a adesão de mais usuários de outros aplicativos de mensagem. Esse trabalho por vezes também atraía outros empreendedores da área de tecnologia. Elies Campo entrou para a empresa no início de 2015, depois de conseguir, por meio de um amigo comum, uma reunião com Pavel Durov em Palo Alto. (“Era difícil conseguir falar com ele”, lembra Campo, que chegou a desconfiar que Durov suspeitava que ele era um espião do WhatsApp.) Desde o começo, Campo viu seu novo chefe como um “visionário”: “Acho que, entre todas as pessoas que conheci, ele tem o modo mais sofisticado de conceber um produto.”
Segundo Campo, era “muito empolgante ver como Pavel pensava nos serviços de mensagens e em todas as características que ele queria implantar”. Somente em 2015, a pequena equipe do Telegram criou uma plataforma para que os usuários pudessem criar e publicar seus próprios chatbots; acrescentaram aos grupos de chats as funções de responder, citar e criar hashtags; adicionaram um player de vídeo e um novo editor de fotos; e, pela primeira vez, lançaram canais públicos para quem quisesse transmitir para uma quantidade ilimitada de seguidores. Apenas o Facebook, com sua equipe muito maior, estava acrescentando funções num ritmo semelhante.
Campo se lembra desses tempos como um momento dinâmico. Ele continuou morando em Palo Alto, e acompanhava os desenvolvedores do aplicativo, basicamente russos, em suas excursões ocasionais pelo mundo, inclusive para sua cidade natal, Barcelona. “A equipe toda viajava junto”, diz ele. Para Campo, em outras palavras, o mito era verdade. Ecoando a retórica de seu chefe, ele dizia que o lugar do Telegram “não é um país, ele é um produto global”.
Em 2016, Rozenberg também entrou para o Telegram, com a tarefa de combater spams. Sem os conflitos entre acionistas que foram uma tortura na era do VK, diz Rozenberg, aquele era “um emprego dos sonhos”. Mas, em janeiro de 2017, ele teve uma discussão dramática com seu amigo Nikolai. Rozenberg diz que tinha a ver com uma disputa romântica, e Nikolai queria que ele fosse embora. (Nikolai não respondeu aos pedidos de comentários.)
Rozenberg diz que Pavel manifestou certa compaixão pela situação dele. Mas não iria tomar partido contra o irmão. Em abril, depois de se recusar a pedir demissão, Rozenberg foi demitido por “não comparecimento ao trabalho”. Com isso, mais um antigo colega e amigo dos Durov foi deixado pelo caminho. Mas Rozenberg não ficou quieto. Em setembro de 2017, divulgou um relato de seu tempo com os Durov na plataforma de publicações online Medium, expondo algumas das supostas contradições do Telegram, a começar pelo endereço: por que os funcionários de um exilado russo, que trabalhavam em uma empresa espalhada por vários países, continuavam tendo sua sede na Rússia?
Em resposta, Durov disse à imprensa russa que Rozenberg, na verdade, trabalhara para a Telegraph. E descreveu a Telegraph como uma empresa completamente independente para a qual o Telegram terceirizava o trabalho de moderação. Disse ainda que a equipe do Telegram havia se encontrado pela última vez na Casa Singer no começo de 2015, e insinuou que Rozenberg sofria de “uma doença mental”. No entanto, em sua disputa com a United Capital Partners em 2014, o próprio Durov revelara seus elos com a Telegraph, sediada na Rússia, em documentos que apresentou aos tribunais. Rozenberg também compartilhou comigo mensagens que parecem demonstrar que Durov o considerava seu empregado.
Mais problemática, porém, talvez fosse a alegação de Rozenberg de que seu histórico de conversas pelo Telegram sumiu durante seu conflito com os irmãos Durov. Os chats foram magicamente restabelecidos na manhã seguinte, e Pavel atribuiu tudo a uma pequena falha mecânica. Mas Rozenberg ficou pensando se Nikolai não estava por trás da exclusão das mensagens. Até onde o Telegram era de fato seguro se uma disputa fútil bastava para colocar em risco a informação de um usuário? Diz Rozenberg: “Todos os seus chats, à exceção dos chats secretos, absolutamente todos os grupos, todos os canais, estão armazenados nos servidores do aplicativo. Portanto, o Telegram tem acesso a essas informações.”
À medida que o Telegram se tornava imensamente popular em países com regimes opressivos, como o Irã, peritos em segurança também começaram a questionar a arquitetura de privacidade do aplicativo. “O Telegram vai enfrentar uma pressão cada vez maior ao longo do tempo para colaborar com as exigências do governo iraniano”, tuitou Edward Snowden no fim de 2017, afirmando que o compromisso moral de Pavel Durov de proteger os usuários não era suficiente para enfrentar aquele tipo de pressão. Imitando o discurso do fundador do Telegram, o antigo herói de Durov tuitou: “Confie que não vamos entregar os dados. Confie que nós não lemos suas mensagens. Confie que não vamos fechar seu canal”, escreveu ele, completando em seguida: “Pode ser que @Durov seja um anjo. Torço que seja! Mas já houve anjos que caíram.”
Mais ou menos nessa época, Durov mudou a base oficial do Telegram para Dubai, finalmente cortando os laços de longa data dos irmãos com a Casa Singer e resolvendo algumas das aparentes contradições no relacionamento com a Rússia. Mas era difícil saber se as controvérsias levantadas por Snowden e pelo post de Rozenberg não tinham causado danos ao crescimento do Telegram. O aplicativo agora estava perto de 200 milhões de usuários, que enviavam 70 bilhões de mensagens por dia. O Telegram tinha uma popularidade fenomenal na Ásia, na América Latina e, cada vez mais, na Europa.
O aplicativo continuava sendo gratuito para os usuários, sem anúncios. Mas prestar suporte para 200 milhões de usuários não é barato. Durov tinha saído do VK com 300 milhões de dólares, segundo foi divulgado, mas continuava bancando pessoalmente o aplicativo havia quatro anos. O Telegram precisava encontrar um modo de pagar por seus crescentes custos de servidor. Vender participações na empresa e se arriscar a ter mais batalhas épicas entre acionistas não parecia atraente. Mas Durov não tinha como continuar financiando o Telegram para sempre. E, por isso, começou a bolar um plano novo e ousado.
Em junho de 2017, Ilya Perekopsky estava dirigindo um Mercedes conversível pelas curvas de uma estrada do Sul da França, em férias, quando viu uma mensagem pipocar no celular. Era Pavel Durov. Seu antigo amigo, ex-chefe e ex-adversário estava sugerindo que os dois fizessem uma reunião formal. Nos últimos anos, Perekopsky vinha investindo no mercado de criptomoedas. De tempos em tempos, ele enviava links para Durov: “Eu era uma espécie de evangelizador das criptomoedas”, diz Perekopsky. Agora, ele estava feliz da vida em ler a mensagem: Durov queria se encontrar para discutir a criação de um novo negócio naquela área.
Eles marcaram de se encontrar em Paris, onde, segundo Perekopsky, era comum que Durov passasse algum tempo durante o verão. Desde o primeiro encontro, Perekopsky percebeu que o projeto de Durov não tinha precedentes em termos de escala. “Ele simplesmente acreditava na ideia de criar uma criptomoeda de fato voltada para o mercado de massa que circularia entre as pessoas sem o envolvimento dos bancos”, diz Perekopsky. Ao longo dos meses seguintes, eles se encontraram várias vezes em Paris e Dubai à medida que o plano de Durov se cristalizava. Em outubro de 2017, Durov tinha oficialmente colocado Perekopsky de volta ao time para “ajudar a liderar” o novo projeto.
Havia pouco, Perekopsky levantara 30 milhões de dólares para uma plataforma de troca de criptomoedas chamada Blackmoon. E apresentou Durov para John Hyman, um britânico veterano na área de bancos de investimento. Hyman entrou para o pequeno time que estava tratando da parte de negócios do novo projeto. Passou a ser o conselheiro-chefe da área de investimento do Telegram. Em meados de dezembro, Durov voou para Londres para encontrar os dois e finalizar os detalhes, e Hyman começou a marcar reuniões com potenciais investidores durante a visita. Pouco depois, o plano se tornou público.
Eles pretendiam construir uma nova plataforma de blockchain – a tecnologia que registra as transações em criptomoedas dos usuários – chamada Telegram Open Network, com uma criptomoeda representada pelo token Gram. O cérebro por trás da TON, Nikolai Durov, era descrito no panfleto da nova plataforma como “um guru de sistemas de processamento distribuídos”. O sistema que Nikolai projetara prometia ser mais rápido do que as atuais tecnologias de blockchain. Enquanto os tokens Bitcoin e a Ethereum tinham limite de 7 e 15 transações por segundo, respectivamente, a propaganda da TON prometia milhões de transações por segundo. O plano ambicioso testaria até o limite os desenvolvedores do Telegram.
A ideia era aproveitar a imensa base de usuários do aplicativo e prover a “massa crítica para levar as criptomoedas a serem adotadas em grande escala”. Até então, elas tinham ficado limitadas às pessoas com paciência e conhecimento para criar carteiras digitais e se inscrever em plataformas de troca de criptomoedas. Mas, com carteiras digitais embutidas diretamente no aplicativo do Telegram – como o Facebook Pay, só que para criptomoedas –, a TON pretendia conectar instantaneamente milhões de usuários comuns ao blockchain. Transformaria a criptomoeda em algo comum de uma hora para outra. Em última instância, a TON se tornaria “uma alternativa Visa/Mastercard para a nova economia descentralizada”. Para exibir as credenciais do Telegram em sistemas distribuídos, a propaganda ressaltava as redes de servidores independentes da empresa espalhados por diferentes continentes e jurisdições. Ao final do processo, o objetivo era fazer com que a TON saísse das mãos do Telegram e passasse para as mãos da “comunidade global de código aberto”.
Parecia uma trama utópica que revolucionaria o próprio modo como o dinheiro funcionava. “A ideia era mesmo mudar o mundo”, diz Perekopsky. O plano também resolveria o maior enigma do Telegram: como conseguir dinheiro sem abrir mão do controle. Em vez de vender ações para investidores, Durov ia criar sua própria moeda – ou, na verdade, toda uma nova economia integrada, que giraria em torno do Telegram.
Hyman estava maravilhado com o modo como a equipe do aplicativo funcionava. Ele diz que jamais tinha visto algo parecido. No Morgan Stanley – empresa global de serviços financeiros –, onde Hyman trabalhou em cargos importantes durante dezessete anos, um projeto como esse mobilizaria uma equipe quarenta vezes maior. “E eles não teriam feito melhor”, diz. Os investidores ficaram em êxtase. Eles “gostavam da natureza centralizada do processo”, segundo Hyman. “Era muito eficiente. Nós podíamos avançar mais rápido e tomar decisões de forma mais veloz.” Para Hyman, era um exemplo da paixão que Durov tinha por romper com as burocracias que travavam o fluxo de informações e finanças.
Novas criptomoedas costumam ser lançadas por meio de uma oferta inicial, colocando à venda tokens da moeda, como se fossem ações de uma empresa que está abrindo seu capital. O Telegram captou 1,7 bilhão de dólares – na época, o maior ICO da história[8] – de 175 investidores. Mas sinais de alerta estavam piscando desde o começo. Embora a empresa de início tenha anunciado uma oferta pública, o ICO acabou sendo privado. Não havia muito como saber quem eram os investidores privados, nem de onde o dinheiro tinha vindo. Em resposta a um colega empresário que perguntou sobre a questão, Hyman escreveu: Rússia, Israel e o “fã-clube do Pavel”.
Mas as metas do projeto não estavam sendo atingidas. Durov disse a um amigo e investidor que a equipe de tecnologia do Telegram, que se dividia entre o trabalho no aplicativo e na TON, era pequena demais. É uma forma de subestimar bastante o problema. Na época, o Telegram estava lutando contra uma suspensão na Rússia porque a empresa se recusara a entregar suas chaves de criptografia para os serviços de segurança. Num dramático jogo de gato e rato, a agência russa responsável pela regulação das telecomunicações acabou bloqueando boa parte da internet na Rússia em um caso gigantesco de danos colaterais, mas o Telegram – provavelmente por meio de uma técnica chamada domain fronting, que oculta a fonte do tráfego de internet – conseguiu manter sua plataforma acessível aos russos quase sem interrupção. (Mais tarde, quando o regime de Alexander Lukashenko derrubou a internet no dia das eleições na Belarus, o Telegram usou técnicas “anticensura” semelhantes para permanecer online, e acabou se transformando no principal meio de comunicação durante um período de agitação no país.)
A rede de teste da TON finalmente foi colocada online em janeiro de 2019, com meio ano de atraso. Mas à medida que o lançamento oficial se aproximava – o que significava que os investidores seriam autorizados a vender seus grams – a Comissão de Valores Mobiliários dos Estados Unidos (SEC, na sigla em inglês) fez tudo parar.
A SEC alegou que a revenda de grams equivaleria à distribuição de títulos não registrados. Também criticou a TON por servir como um meio clandestino para levantar fundos. Afirmou, ainda, que a empresa gastara 90% do 1,7 bilhão de dólares que obteve com o ICO, tendo pago despesas do Telegram sem jamais fazer distinção entre o dinheiro gasto no aplicativo e o gasto na TON. E-mails também demonstravam que Hyman estava ciente de que já havia um mercado semiclandestino de revenda de grams antes do lançamento, embora isso fosse proibido pelo acordo assinado pelos investidores.
“Foi um choque”, diz Perekopsky, referindo-se ao processo da SEC. “Foi um dos dias mais decepcionantes da minha vida.” Perekopsky alega que eles estavam em contato com a comissão norte-americana durante todo o processo e que o Telegram tinha contratado “os melhores escritórios de advocacia do mundo” para se certificar de que estava seguindo as normas. Perekopsky também rejeita a ideia de que a TON era meramente um veículo para levantar dinheiro para o Telegram. Ele afirma que havia meios “mais fáceis” de conseguir dinheiro do que construir uma blockchain do zero.
Pavel Cherkashin, russo que morava em São Francisco e investiu na TON, foi um dos muitos que se sentiram traídos. “O que me deixou furioso foi entender que Durov pegou o dinheiro que levantou para a TON e usou para manter o Telegram, que não ia trazer valor nenhum para os investidores”, diz ele. Do ponto de vista de Cherkashin, Durov tinha o conhecimento técnico e a visão de produto para fazer a TON funcionar, mas falhou na hora de construir a infraestrutura necessária para que o negócio fosse bem-sucedido – por não querer abrir mão do controle. Já Perekopsky não vê problemas em usar o dinheiro da TON para pagar as despesas correntes do Telegram. “Falando francamente, a gente nunca escondeu o fato de que o dinheiro seria usado tanto para o Telegram quanto para o blockchain”, diz ele.
De início, segundo Perekopsky, Durov não estava disposto a desistir. “Achávamos que dava para brigar e ganhar na Justiça já que estávamos 100% certos”, lembra Perekopsky. Mas depois que a SEC norte-americana interrogou Durov por dois dias em Dubai, ficou claro que o plano tinha chegado ao fim. “Os Estados Unidos usam seu controle sobre o dólar e sobre o sistema financeiro global para fechar qualquer banco ou conta bancária no mundo”, Durov escreveu mais tarde, acrescentando que “outros países não têm plena soberania sobre o que permitem em seu território”. Ele pôs a culpa pela derrocada da TON em um “mundo excessivamente centralizado”. Não passou nem perto de pedir desculpas.
Hyman acha que os reguladores podem ter ido atrás da TON porque era “realmente um tipo de ameaça disruptiva” às instituições financeiras tradicionais. Na verdade, a SEC estava de olho em ICOs em geral desde 2017, impondo multas a alguns e encerrando as atividades de outros. Porém, nenhum deles tinha atraído tanto investimento quanto a TON, o que daria a milhões de usuários comuns do Telegram acesso fácil a uma criptomoeda. Cherkashin acha que não foi coincidência que o Facebook tenha começado a trabalhar para valer em sua própria criptomoeda e em seu blockchain mais ou menos na mesma época do Telegram. Ele ouviu rumores de que Zuckerberg ficou furioso ao ler pela primeira vez sobre a TON. Ao emitir uma moeda, uma plataforma de mídias sociais romperia com uma das mais importantes funções do Estado-nação. Durov e Zuckerberg teriam percebido isso de maneira muito clara.
Depois do fracasso da TON, Perekopsky permaneceu no Telegram como vice-presidente. Em março de 2021, ele ajudou a conseguir mais de 1 bilhão de dólares com a venda de títulos de cinco anos no Telegram, sendo que parte do dinheiro foi usada para pagar investidores – embora investidores norte-americanos, inclusive Cherkashin, tenham recebido apenas 72%. No início da TON, a propaganda era cheia de idealismo. “O Telegram foi fundado em 2013 por libertários para preservar a liberdade por meio da criptografia”, explicava o texto, mencionando a Wikipédia como “um modelo para os fundadores do Telegram”. A investigação da SEC, no entanto, fez com que a TON parecesse mais com uma sofisticada máquina de fazer dinheiro.
Em julho de 2021, uma investigação jornalística internacional sobre o uso que vários governos vinham fazendo do Pegasus, um software espião produzido pela empresa israelense NSO Group, informou que um dos números de telefone de Durov tinha sido alvo da ferramenta digital de espionagem. A investigação, batizada de Projeto Pegasus, sugeria que provavelmente os clientes eram os governantes dos Emirados Árabes Unidos.
Para peritos em segurança, a notícia serviu como um lembrete de que, ao mudar da Rússia para Dubai em 2017, o Telegram tinha apenas mudado de jurisdição autoritária. Mas Durov não pareceu incomodado. Desde que morava na Rússia, em 2011, ele dizia presumir que seus telefones estavam “comprometidos” e, por isso, tomava as devidas precauções.
De modo geral, Durov não tem demonstrado em relação aos Emirados Árabes Unidos, um regime acusado de inúmeros e sistêmicos abusos contra os direitos humanos, aquele mesmo antagonismo que demonstrara anteriormente em relação à Rússia. Perekopsky me garantiu que, em Dubai, o Telegram jamais havia passado por qualquer tipo de pressão, por mais leve que fosse. Por isso, ele era só elogios aos líderes dos Emirados. “Não parece um governo”, disse. “Parece mais um grupo de empresários dirigindo o país. São muito pragmáticos, muito rápidos para tomar decisões.”
À medida que os confrontos com o Kremlin iam se tornando coisa do passado, a vigilância autoritária, em certo sentido, deixou de ser o inimigo simbólico do Telegram. Em vez disso, Durov cada vez mais retratou sua plataforma como um heroico opositor do Facebook, da Apple e do Google. (Do Facebook, por ser o seu principal concorrente; da Apple e do Google, porque o Telegram precisa seguir as regras deles para permanecer nas lojas de aplicativos.) Num post em seu canal no começo do ano passado, Durov, outrora o flagelo libertário das ditaduras socialistas, alegou que tinha passado a rejeitar a oposição entre capitalismo e socialismo, que agora considerava obsoleta. “Prefiro pensar em termos de ‘centralização versus descentralização’”, escreveu. “Monopólios capitalistas e ditaduras socialistas são igualmente ruins.”
Em sua batalha para derrubar os monopólios capitalistas do Vale do Silício, o Telegram passou a ocupar o imenso espaço aberto pelas Big Techs, como são chamadas as quatro gigantes da tecnologia (Amazon, Apple, Google e Facebook), depois que passaram a adotar políticas de moderação mais estritas. Em todo o mundo, havia relatos diários sobre canais e grupos do Telegram lotados de pessoas contrárias à vacina, de negacionistas da Covid e de provocadores de extrema direita que espalham desinformação e organizam protestos. Tais relatos aumentaram depois que Facebook, Twitter e YouTube começaram a repreender esse tipo de conteúdo no ano passado. “Em meus vinte anos gerindo plataformas de discussão”, escreveu Durov, em 2021, “percebi que teorias da conspiração só ganham força quando seu conteúdo é removido por moderadores.” Em junho do ano passado, o governo alemão processou o Telegram por não cumprir as regras segundo as quais as empresas de mídias sociais devem fiscalizar reclamações e designar um representante para contato no país. À medida que a Alemanha impunha protocolos de saúde mais rigorosos para enfrentar a variante Ômicron, a reação dos negacionistas no país ficou ainda mais extremada.
Desde 6 de janeiro de 2021, enquanto isso, a posição do aplicativo entre os seguidores de Trump continuou a se consolidar. Canais de figuras da ultradireita surgem a toda hora. O advogado de Trump, Lin Wood, transformado em adepto da teoria da conspiração nas eleições norte-americanas, está perto de 1 milhão de seguidores. O ex-administrador da 8chan, Ron Watkins, tem quase meio milhão.[9] Entre os políticos eleitos com o apoio de Trump que abriram canais bem-sucedidos no Telegram estão os congressistas de extrema direita Marjorie Taylor Greene, Madison Cawthorn e Lauren Boebert.
Em agosto de 2021, o Telegram chegou a 1 bilhão de downloads. Durante a desastrosa queda do Facebook em todo o planeta em outubro passado, o aplicativo recebeu 70 milhões de novos “refugiados”, segundo Durov. Porém, à medida que o Telegram chegava mais perto de cumprir a sua meta e atingir os mesmos números do WhatsApp, Elies Campo continuava cismado. “Nós estamos passando a imagem de que somos uma empresa aberta, supostamente favorável à liberdade de expressão e à transparência entre os usuários”, disse ele durante um de nossos encontros em Ciutadella, um parque imponente pontilhado por monumentos no limite da cidade velha de Barcelona. “E por outro lado, somos completamente opacos em relação ao modo como trabalhamos.” Ele se perguntava se a cultura insular, até mesmo desconfiada, do Telegram, não estava prejudicando a empresa.
Quanto mais ele falava, mais eu percebia que essa cultura também havia afastado Campo. Ele lembrava que, no último retiro da empresa antes da pandemia em 2019, Durov alugou uma casa enorme em uma cidadezinha na Finlândia cercada por lagos e florestas de pinheiros. Quando o grupo inteiro se reunia para fazer as refeições, a conversa era em russo. “Sou o único que fala em inglês com Pavel”, diz Campo. “Isso, naturalmente, gera um ponto de atrito.” Ele também percebia que a equipe desconfiava dele por residir no Vale do Silício e ter, supostamente, uma mentalidade norte-americana. Campo conta que, certa vez, enquanto tentava estabelecer relações comerciais entre o Telegram e empresas dos Estados Unidos, Durov se perguntou em voz alta se ele tinha “interesses econômicos” nas empresas e se essa seria a razão pela qual “tinha tanto interesse em trabalhar com elas”.
Ao longo do ano passado, Campo começou a fazer preparativos para sair do Telegram. Ele passou o início do segundo semestre ocupado em seu último grande projeto na empresa, ajudando a desenvolver novas funcionalidades que pretendiam finalmente monetizar o aplicativo. No novo plano, donos de grandes canais vão poder publicar posts patrocinados e oferecer assinaturas pagas, e o Telegram receberá uma parte disso. (O Telegram afirma que jamais vai oferecer anúncios direcionados com base nos dados dos usuários.)
Antes de nosso último telefonema em outubro, Campo fez algo incomum. Até então, vínhamos nos comunicado basicamente via Telegram, tanto para mensagens quanto para chamadas. Dessa vez, porém, ele escreveu: “Add vc em outra plataforma.” Ele tinha me adicionado no Signal. Liguei para ele pelo Signal e perguntei por que ele não queria mais conversar pelo Telegram. Ele respondeu: “Porque como é que a gente vai saber?” Existia alguma chance de o Telegram poder monitorar as comunicações privadas de alguém? “Tecnicamente, é possível”, disse Campo. Ele explicou que fazer isso em larga escala seria difícil, mas a criptografia entre o usuário e o servidor, em tese, poderia ser desativada em uma conta específica. “Não sei se isso está acontecendo ou não.”
Quando eu me preparava para concluir minha reportagem no mês seguinte, consegui falar com outro executivo sênior do Telegram: Ilya Perekopsky. Em novembro, escrevi para ele pela nona vez, sem jamais ter recebido uma resposta substancial. Dessa vez, Perekopsky respondeu em vinte minutos e perguntou se eu estava em Barcelona. Por pura coincidência, ele disse que estava acabando de chegar de Dubai. Dois dias depois nos encontramos em um elegante restaurante à beira-mar ao Sul de Barcelona, perto de onde os pais de Perekopsky têm uma casa. Com seu topete louro e as maçãs do rosto salientes, Perekopsky me lembrou um David Bowie russo vestindo camisa xadrez debaixo de um colete acolchoado.
Enquanto comíamos peixe grelhado, debaixo de um Sol quente atípico para a estação, Perekopsky pediu desculpas por não ter respondido antes. Explicou que, preocupado com a possibilidade de que eu escrevesse um texto contando apenas um lado da história, resolveu mostrar meu e-mail para Durov. “Acho melhor responder pessoalmente”, disse Perekopsky para o chefe, que teria aprovado sem demora o encontro. “Nós realmente não gostamos muito de nos comunicar com o mundo exterior porque achamos que isso vai tirar o nosso foco”, disse. Durov, segundo ele, prefere usar os seus próprios canais, onde suas palavras não podem ser distorcidas ou “censuradas” por um jornalista.
Perekopsky estava ansioso, porém, para falar do que classificava como “censura” do Google e da Apple. Segundo ele, as duas empresas tinham exigido recentemente que o Telegram bloqueasse canais públicos que estavam promovendo narrativas antivacina e desinformação sobre o coronavírus. “O que eu quero dizer é que essa história da Covid é muito engraçada. Isso que eles estão fazendo é 100% censura.” Ele parecia genuinamente surpreso com aquilo. “A gente só acha que as pessoas devem ter a opinião delas, entende? Se elas discordam, elas podem discordar. Elas podem usar o Telegram para expressar suas opiniões. Da nossa parte, nós sempre ficamos neutros.”
Sobre Trump, Perekopsky alegou que a empresa não prestou muita atenção à migração do movimento do ex-presidente para o Telegram.[10] Ele descreveu a entrada de direitistas norte-americanos no aplicativo como algo inusitado e, ao mesmo tempo, divertido. “Foi engraçado ver que eles não encontraram uma plataforma melhor lá mesmo nos Estados Unidos para expressar as opiniões deles”, disse. “Isso provavelmente é só uma prova de que nós somos a única plataforma independente onde não existe censura e onde você pode de fato expressar suas opiniões.” Depois, admitiu que a entrada de norte-americanos foi mais do que algo divertido. “Nós ficamos orgulhosos. Um pouco”, disse. Mencionando uma conversa que teve com Durov naquela semana de janeiro, ele disse ter ouvido o seguinte do fundador do Telegram: “É uma marca de qualidade que mostra que nós somos uma plataforma neutra.”
Com o Sol começando a se pôr e o clima ficando mais fresco, Perekopsky se apressou a esclarecer – como Durov já fez muitas vezes em seu canal público – que a empresa leva incitações à violência muito a sério e age com rapidez e consistência para eliminar conteúdo ilegal. A pesquisadora Megan Squire descobriu que muitos posts da extrema direita incitando violência permaneceram no ar por meses. Conhecido infectologista e um dos principais integrantes da força-tarefa formada pela Casa Branca para responder à pandemia, Anthony Fauci e suas filhas tiveram informações privadas reveladas por um canal de extrema direita no Telegram. O endereço da própria Squire foi publicado em um grupo dos Proud Boys em janeiro e permaneceu no ar por meses, apesar de ela ter denunciado o post repetidamente. Perekopsky disse que o Telegram atualizou seus termos para banir publicação de informações privadas de terceiros no início de 2021 e prometeu que ia se ocupar do caso de Squire. (O endereço dela foi finalmente removido um mês depois de eu mencionar a história.)
Eu queria perguntar sobre a cultura do próprio Telegram. Campo e Rozenberg não tinham sido os únicos a insinuar que havia uma atmosfera de culto à personalidade em torno de Durov. “Ser parte da equipe de fato faz a realidade parecer diferente”, disse-me Andrei Lopatin. “Eu tive muita sorte de conseguir sair.” Mas Perekopsky discordou da ideia de que Durov criou uma cultura de lealdade cega e de obediência, ou de que ninguém jamais discorda dele. O executivo insistiu que havia pouca hierarquia interna na empresa e descreveu a estrutura do Telegram como “horizontal”. Em vez de comandar, Durov prefere convencer todo mundo a “compartilhar da visão dele”, disse Perekopsky. “Ele é muito convincente! Extremamente convincente.”
Hyman – que concordou em conversar comigo depois de eu ter falado com Perekopsky, e que continua a dar conselhos financeiros para o Telegram como consultor – também usou a palavra “horizontal” para descrever o aplicativo. Disse que é “besteira” que exista uma cultura de desconfiança e de lealdade cega a Durov. “É uma empresa muito exigente, darwinista. E imagino que nem todo mundo tenha tido sucesso.” Durov não respondeu a pedidos para ser entrevistado nem para checar alguns dados objetivos. Seu irmão Nikolai e o departamento de comunicações do Telegram também não deram retorno.
Em seu post sobre “centralização versus descentralização”, o próprio Durov sugeriu que o Facebook vinha perdendo terreno para o Telegram porque a pequena equipe de sua plataforma evitou a centralização e a hierarquia excessiva. O que, é claro, leva a outra questão: como exatamente um grupo obscuro de trinta programadores reunidos em torno de um líder carismático em Dubai é menos centralizado do que uma grande empresa? Durov insinuou uma espécie de resposta em seu post. “Os humanos evoluíram de forma a ter melhor desempenho em grupos de menos de 150 pessoas”, escreveu. “Em um ambiente natural, toda pequena comunidade é capaz de produzir um líder excepcional.”
Se Durov é esse líder natural dentro do Telegram, só o tempo dirá se o próprio Telegram continuará a ascender até tornar-se um líder natural entre as plataformas. A nascente estratégia de monetização da empresa é modesta, para dizer o mínimo. Em todo o mundo, a plataforma parece fadada a múltiplos confrontos. Desde o começo de 2022, autoridades da Alemanha e do Brasil ameaçaram banir o Telegram em função do tráfego descontrolado de desinformação.[11] No Brasil, autoridades pensam em bloquear o aplicativo durante o período anterior às eleições presidenciais de outubro.[12] Mas claro, o Telegram já conseguiu burlar bloqueios governamentais antes.
Nenhum desses impasses havia produzido uma verdadeira crise até o momento de meu almoço com Perekopsky, mas era muito fácil ver que tudo isso estava no horizonte. Sentado ali com ele, pensei na conversa que Zuckerberg e Durov supostamente tiveram mais de uma década atrás. Os dois viam suas nascentes redes sociais como estruturas transcendentes que iriam libertar as comunicações do controle estatal: governos e reguladores seriam reduzidos ao nível de incômodos, transformados em figuras obsoletas diante da força libertadora de uma plataforma. Enquanto pensava nisso sob um Sol de inverno que ia desaparecendo e encerrava minha conversa com o vice-presidente do Telegram, senti um arrepio.
Notas
[1] O vazamento das conversas entre o ex-juiz Sergio Moro e os procuradores da Lava Jato, ocorrido em 2019, decorreu de outra falha de segurança do Telegram que não a ausência de criptografia de ponta a ponta em conversas em grupo. Por meio de outro aplicativo, um hacker entrou na caixa postal do celular do procurador Deltan Dallagnol e pôde ouvir o código de acesso exigido para logar no Telegram a partir de qualquer dispositivo, como se fosse o dono da conta. Assim, teve acesso a todos os diálogos do procurador – coletivos e individuais, criptografados ou não. O conteúdo vazado mostrou que Moro combinava estratégias de ação com a força-tarefa da Lava Jato para incriminar o ex-presidente Lula. Por atuar sem a isenção requerida de um magistrado, Moro foi declarado parcial no caso do tríplex do Guarujá pelo Supremo Tribunal Federal.
[2] No dia 14 de abril, o WhatsApp anunciou que passará a oferecer uma nova ferramenta para “formação de comunidades”. A novidade permitirá que diversos grupos (com máximo de 256 membros cada um) sejam agregados num mesmo espaço compartilhado. Isso possibilitará que os administradores dessas “comunidades” enviem mensagens a alguns milhares de pessoas ao mesmo tempo. No Brasil, a nova ferramenta só entrará em vigor depois das eleições de outubro, de modo a reduzir o alcance de desinformação sobre o pleito.
[3] O canal de Jair Bolsonaro no Telegram foi criado em 9 de janeiro de 2021, um dia depois de o Twitter bloquear definitivamente o perfil de Donald Trump. Desde então, Bolsonaro e seus filhos fazem apelos aos seus seguidores em outras redes para que criem contas no Telegram. Em outubro de 2021, o canal do presidente atingiu 1 milhão de seguidores.
[4] No dia 15 de fevereiro, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) firmou uma parceria com oito redes sociais com a finalidade de combater a desinformação durante as eleições. Entre as grandes plataformas, o Telegram foi a única que, num primeiro momento, se recusou a aderir ao acordo. Só veio a assiná-lo no dia 25 de março, depois que uma ordem judicial determinou a suspensão do funcionamento do aplicativo em todo o Brasil (ver nota 12).
[5] São todos grupos de extrema direita criados nos últimos anos. Os Proud Boys são um clube exclusivamente masculino fundado por nacionalistas e supremacistas brancos em 2016. Os Boogaloo Boys começaram a se aglutinar na internet no início da década de 2010 e pregam a deflagração de uma guerra civil – ou “guerra racial”. O QAnon, cujos líderes não são conhecidos, surgiu em 2017. Dado a teorias conspiratórias, acredita que o ex-presidente Donald Trump liderava uma luta contra uma rede mundial de satanistas pedófilos. Todos os três grupos participaram da invasão do Capitólio em janeiro de 2021.
[6] Em 2021, a Panorama Mobile Time/Opinion Box fez um perfil dos usuários do Telegram no Brasil com um recorte por sexo, idade e classe social, mas não por orientação política.
[7] O jornal Novaya Gazeta, fundado em 1993, suspendeu sua circulação no final de março. Com a crescente censura à imprensa praticada pelo regime de Vladimir Putin, sobretudo depois da invasão da Ucrânia, o jornal entendeu que não era mais possível exercer jornalismo isento na Rússia. No ano passado, seu diretor, Dmitry Muratov, dividiu o Prêmio Nobel da Paz com a jornalista filipina Maria Ressa: um reconhecimento da luta de ambos pela liberdade de imprensa em seus países.
[8] ICO é a sigla em inglês de Initial Coin Offering, operação por meio da qual as empresas levantam dinheiro para criar uma nova moeda, um aplicativo ou um serviço. No mundo das criptomoedas, é o equivalente ao IPO, a operação em que empresas levantam dinheiro com venda de ações.
[9] O 8chan, que mudou de nome para 8kun, é um site/fórum digital que abriga extremistas violentos. Mensagens postadas no fórum anunciaram com antecedência ataques a tiros contra inocentes ocorridos nos Estados Unidos e na Nova Zelândia.
[10] Em fevereiro, o ex-presidente Donald Trump lançou a sua própria plataforma, a Truth Social, aberta apenas para usuários dos Estados Unidos e do Canadá. A Truth Social tem enfrentado problemas técnicos e, segundo os dados mais recentes, teve apenas 1,2 milhão de downloads até agora.
[11] No dia 11 de fevereiro, o Telegram cedeu à pressão do governo da Alemanha e bloqueou 64 canais que promoviam discurso de ódio, principalmente antissemita, e espalhavam desinformação sobre a pandemia.
[12] No dia 18 de março, o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), suspendeu o funcionamento do Telegram no Brasil porque a plataforma vinha descumprindo decisões judiciais. Em agosto do ano passado, por exemplo, o STF ordenara que o Telegram retirasse do ar uma mensagem do presidente Jair Bolsonaro com informações falsas sobre a urna eletrônica, mas não obtivera nem resposta da plataforma. A suspensão decretada em março finalmente levou o Telegram a colaborar com a Justiça. No dia 25, a plataforma aderiu ao acordo proposto pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e que já tinha sido assinado por oito redes sociais. Pelo acordo, o Telegram se compromete, a exemplo das demais redes, a combater a difusão de desinformação sobre a eleição, sobre a Justiça Eleitoral e sobre as urnas eletrônicas.