Fernando Silva, 27 de outubro de 2020
SÃO PAULO - A pesquisa DataFolha divulgada no último dia 22, trouxe como fato novo o derretimento da candidatura de Celso Russomanno, o que não chega a ser uma novidade em São Paulo. O roteiro é o mesmo das eleições municipais de 2012 e 2016: começa liderando e não consegue sequer ir ao 2º turno. A queda de sete pontos nas intenções de votos é significativa numa eleição de gatilho rápido - ainda mais com pouca mobilização de rua e praticamente sem debates, o que deveria ser, por si só, uma garantia de proteção a Russomanno. É um péssimo sinal para o bolsonarismo, nas eleições com maior número de candidatos da extrema-direita. Se proclamar candidato de Bolsonaro poderá não ser suficiente para salvá-lo.
De outro lado, a candidatura do PSOL, de Guilherme Boulos e Erundina como vice, manteve na pesquisa a tendência de paulatino crescimento, agora com 14%, sendo espetaculares 27% na juventude. Boulos é líder também na espontânea, chegando a um empate técnico com Russomanno, no limite da margem de erro. Com Bruno Covas agora na liderança das pesquisas e também com um crescimento paulatino de Márcio França, esta situação impõe algumas conclusões para a reta final da campanha.
O indicativo mais significativo desta pesquisa é que existe sim a possibilidade de um 2º turno em São Paulo com uma candidatura de esquerda, de oposição a Bolsonaro e ao tucanistão neoliberal paulista - sob a forma de Dória e Bruno Covas. As pesquisas anteriores aparentavam um quadro consolidado onde Covas e Russomanno encaminhavam a ida ao 2º turno. Boulos crescia e seguia em terceiro, mas com considerável distância. A partir do crescimento da campanha e da percepção identificada na pesquisa, a reta final desenha-se com reviravoltas. E o que poderia ser um cenário hipotético - pelo que a média das pesquisas mostravam - tornou-se uma disputa possível.
Russomanno buscou ocupar sem mediações o espaço da popularidade de Bolsonaro, porém, não contava que o prestígio do presidente estaria em tamanha queda nas grandes capitais. Segundo pesquisa do Ibope (JE 01432/2020), Bolsonaro tem 48% de ruim ou péssimo na cidade, 26% regular. Os seus 24% de apoio podem ser o suficiente para levar uma candidatura sua ao segundo turno, mas ocorre que a direita bolsonarista ou a 'nova direita" visceralmente anti-socialista, está fragmentada em São Paulo.
De quebra, Bolsonaro resolveu ter outro surto de negacionismo com a polêmica da vacina, voltando a desprezar a vida num momento em que a pandemia, embora desacelere na cidade, tem já acumulados níveis trágicos de casos e óbitos. A última declaração do presidente genocida, de ‘não entender o porquê da pressa por uma vacina’, mostra novamente sua sanha genocida num país que ainda morrem entre 400 a 500 pessoas por dia, em média, da doença.
Evidentemente este tipo de desgaste pode chegar em Russomano, que até fez uma tentativa de se diferenciar do presidente no episódio da vacina. Talvez tarde demais, pois as recentes bobagens de Russomanno, como a de que "a falta de banho dos moradores da Cracolândia os tornariam mais resistentes ao Coronavírus", casam perfeitamente com o festival de preconceitos e asneiras do presidente. Some-se a isso os 'antecedentes’ do neobolsonarista em relação ao tratamento humilhante a caixa de supermercado, no seu papel de repórter sensacionalista que sempre foi. Além disso, há denúncias de falcatruas com dinheiro público para uso nos seus negócios particulares, o que amplia sua fragilidade política e de ideias e forma o combo que ajuda a explicar o seu recente derretimento eleitoral.
Nos preparar para os ataques, as fake news e os falsos progressistas
A possibilidade real de termos o PSOL no 2º turno vai nos colocar agora sob intenso bombardeio, no reinado das sacanagens. As fake news já começaram nas redes sociais, a manipulação editorial grotesca também. Nem bem Bruno Covas declarou que prefere Russomanno no 2º turno e que não gostaria de enfrentar Boulos, o jornal Folha de S. Paulo transformou R$ 579 reais de uma conta bancária de Boulos numa suspeita leviana de “sonegação de patrimônio”. Jornalismo vergonhoso. Não temos dúvidas de que a aristocracia paulista e seus donos do poder na política, nos negócios e na mídia não querem o PSOL no 2º turno.
De outro lado, Márcio França vai tentar de todas as formas ocupar o espaço de uma alternativa a Russomanno que chegue ao 2º turno, tentando tanto capitalizar parte da perda eleitoral de Russomanno, como manter a memória de ter herdado os votos progressistas no 2º turno das eleições a governador em 2018.
Não devemos aceitar enganações e manipulações: Márcio França é basicamente um tucano, nunca foi anti-bolsonaro e nem é porta-voz das demandas progressistas ou de esquerda. Foi um político que sustentou Alckmin e o tucanato em São Paulo. Não acompanhou a bolsonarização de Dória em 2018, mas nem ali foi um anti-bolsonaro, menos ainda agora, quando na verdade tem buscado diálogo com o presidente para ganhar parte do seu eleitorado na capital paulista. Não é possível querer disputar o voto de esquerda e anti-bolsonaro flertando com p bolsonarismo. Simplesmente Márcio França não é oposição a ninguém que está no poder.
Um vira voto para derrotar a barbárie em São Paulo
Na maior cidade do país, os votos que estamos disputando no presente, para o dia 15 de novembro, são também votos de uma nova ideia de futuro para as cidades, para o país e para a maioria do povo brasileiro. O PSOL assume corretamente essa responsabilidade, em centenas de cidades do país.
Trata-se de intensificar a mobilização nas ruas e nas redes. Nenhuma campanha na cidade de São Paulo está acumulando condições de aglutinação e organização da esperança e da resistência como a do PSOL com a sua chapa majoritária e proporcional. Estamos em diálogo com a juventude, a negritude, os sem-teto, as mulheres; uma candidatura que vai à periferia disputar o voto e uma nova inserção social (que a esquerda há tempos perdeu na capital), e uma nova forma de participação popular nos destinos da cidade.
É possível vencer e chegar ao 2º turno na oposição frontal ao bolsonarismo, ao tucanato e na apresentação de outro projeto de cidade: a da revolução solidária, a da cidade sustentável, igualitária e da esperança.
Fernando Silva é jornalista e membro do Diretório Nacional do PSOL